Tenho 42 anos, sou mulher e não tenho filhos. No próximo domingo, não fossem os beijos que darei à minha mãe, seria um pária na celebração do dia da mãe. Eu, sem filhas/os para me presentearem, fico de fora. Assim, qual é o meu dia? Qual pode ser? Sugiro o dia das não-mães.
Ora, sobre a condição de mulher-mãe – porque não é o meu lugar de fala – pouco saberei acrescentar às experiências que testemunho diariamente. É sobre a condição de mulher não-mãe que posso escrever. Aquela que, por motivos vários que só a ela devem dizer respeito, não tem descendentes, não tem “as crianças” para ir buscar à escola, para ver na aula de ballet ou na de basquetebol, para partilhar histórias ou brincar enquanto termino de fazer o jantar.
Faço parte de uma comunidade de mulheres que não procriaram, que não deram continuidade à espécie ou que não responderam ao chamamento social, familiar e, quiçá, divino da maternidade. Somos as mulheres não-mães e merecemos um dia que nos seja dedicado. Mas já lá vamos.
Antes, somos não-mães – por opção ou não – mas não menos completas. Somos não-mães, mas ajustadas, cientes e resolvidas. Somos não-mães, mas “mães” de tantas pessoas que em nós encontram apoio, segurança, confiança e conforto. Somos não-mães e queremos um dia nosso. Queremos celebrar-nos. Sem comércio, mas com o simbolismo de ser mulher e não ser mãe.
Este texto – escrito por uma mulher que tentou ser mãe e não conseguiu – poderá ferir suscetibilidades pois desloca a mulher do papel histórico, social, familiar e relacional mais comummente a si ligado.
Contudo, há três aspetos que devem ser sublinhados. Primeiro: nenhuma mulher é mais ou menos mulher por ser ou não ser mãe. Ela é-o independentemente da sua descendência. Segundo: a nenhuma mulher deve ser atribuído qualquer juízo de valor – tácita ou explicitamente – por decidir não ser mãe. A ela cabe e deve continuar a caber a decisão sobre o seu corpo e sobre a maternidade. Terceiro: celebrar não ser mãe deve ser um ato tão natural e respeitado como celebrar sê-lo.
Às mulheres são-lhes colocadas tantas metas dentro dos incontáveis objetivos que ser mãe – uma, duas e outras vezes mais – não deve ser uma delas. Apenas se ela assim o entender.
Por fim, aos textos publicitários que, em atalho de foice, referem que “ser mãe é a melhor experiência do mundo” respondemos que as experiências são individuais, subjetivas e intransmissíveis, pelo que a generalização inscrita na frase citada é tão oca quanto a afirmação que sugere que a completude de uma mulher depende da sua capacidade de engravidar e de parir.
Eu nunca pari e nem por isso me sinto menos mulher. Sou uma não-mãe e exijo que o meu dia seja comemorado tal como o dia da mãe o é.