Das primeiras lições que se aprende em economia é que os investidores podem recorrer a capitais próprios ou a capitais alheios ou a um mix dos dois, sendo esta normalmente a estratégia mais avisada, sobretudo porque não é fácil encontrar situações em que empresas disponham da totalidade dos capitais que pretendem alocar a um determinado projeto.

Também nos ensinam que é uma boa estratégia recorrer a capitais alheios, nomeadamente junto de instituições financeiras, sempre que o preço que estas nos exigem pelo dinheiro (o juro) é inferior ao que esperamos obter através da remuneração do capital investido (o lucro).

Apresentando um exemplo simplista, se pretendermos um empréstimo de 100 mil euros e um banco estiver disponível para nos ceder esse capital a uma taxa de juro de 2% ao ano, ou seja, se pagarmos dois mil euros de juros ao ano, esta será uma boa solução caso o projeto em que iremos investir esse capital tenha uma rentabilidade superior a 2%, libertando para o investidor tudo aquilo que ultrapassar os 2% (assim, se a rentabilidade do projeto for de 5%, o investidor receberá, depois de pagos os encargos com juros, três mil euros ao ano). Claro está que teremos sempre que levar em consideração o prazo de amortização do empréstimo, sob pena de, ainda que financeiramente o negócio faça sentido, não conseguirmos ter tesouraria para suportar a amortização da dívida.

Vem esta breve introdução à ciência económica a propósito das afirmações esta semana proferidas pelo primeiro-ministro, António Costa, de que Portugal não vai utilizar os empréstimos disponíveis do plano de resposta à pandemia da União Europeia, “enquanto a situação financeira do país não o permitir”, limitando-se a acolher os 15,3 mil milhões de euros recebidos a fundo perdido, numa lógica de que “a cavalo dado, não se olha o dente”.

O Plano de Recuperação e Resiliência mobiliza subvenções e empréstimos, sendo que Portugal aceita os primeiros, mas recusa, pelo menos para já, os segundos, no valor de  15,7 mil milhões de euros, com o argumento de que já temos uma dívida pública muito elevada e temos de sair desta crise mais modernos e mais verdes, mas também mais sólidos do ponto de vista financeiro.

Dirão os mais cautelosos e menos informados que o primeiro-ministro faz bem em não sobrecarregar ainda mais as já depauperadas finanças públicas nacionais, que teriam, mais cedo ou mais tarde, que pagar o empréstimo posto à disposição de Portugal, para além de terem que cumprir com o serviço da dívida.

Afirmarão os mais conhecedores destas matérias que o que a posição do primeiro-ministro traduz é o reconhecimento da incapacidade do país em gerar riqueza, em apostar em investimento reprodutivo, capaz de assegurar uma rentabilidade superior ao da baixa taxa de juro que nos é pedida pela União Europeia.

Não desconhecemos a imensidão da dívida pública portuguesa, sendo mesmo duvidoso que a mesma seja sustentável. O problema não é, no entanto, contrair mais dívida, mas, sim, saber se a rentabilidade que se retiraria da utilização destas verbas que a União Europeia coloca à nossa disposição é ou não superior ao juro que nos é exigido pelo empréstimo que nos é facultado e a que nós, acriticamente, dizemos que não.

Na prática, o que António Costa nos disse foi que se nos derem, aceitamos, pois nada teremos que pagar de volta, já se nos emprestarem, recusamos, pois não somos capazes de investir de forma reprodutiva, gerando riqueza. Não deixa de ser triste que o responsável máximo do executivo nacional afirme perentoriamente que o Estado português não é capaz de utilizar e gerir capitais, reproduzindo-os. Mas, afinal, o primeiro-ministro é capaz de ter razão: o Estado tem-se revelado ao longo dos anos um excelente gastador, mas um péssimo gestor.