A substituição do ministro das finanças britânico Kwasi Kwarteng, menos de 40 dias depois de ter tomado de posse, ilustrou de forma clara o poder disciplinador dos mercados. Num contexto de situação económica débil e de força política discutível, os mercados foram claros ao rejeitar o “miniorçamento” que Liz Truss e Kwarteng montaram com o objetivo de marcar uma posição enquanto novos governantes.
A situação caótica no mercado obrigacionista só não resultou no colapso de fundos de pensões e numa crise financeira que potencialmente poderia alastrar a nível global devido às sucessivas intervenções do Banco de Inglaterra. Truss procurou sobreviver: afastou o ministro das finanças, nomeou um histórico do partido Conservador e recuou nas medidas que iriam diferenciar a sua governação.
A génese destes recuos e da demissão de Truss não esteve num processo político ou parlamentar. Foram os mercados a forçar a mudança. Muitos consideram inaceitáveis estas pressões do mercado, justificando com o cariz não democrático e por isso ilegítimo do processo. No entanto, essa perspetiva ignora que os interesses dos stakeholders de um Estado – e já é mais ou menos consensual que todas as partes interessadas devem ser tidas em conta nos processos de decisão – não se defendem apenas pela atividade político-partidária convencional.
Uma democracia não se esgota nas instituições formais ou na mera representatividade de decisores. Mercados eficientes e livres contribuem de forma inequívoca para a manutenção da democracia e são promotores de prosperidade. Fazem, portanto, parte do sistema de check and balances que é essencial aos regimes democráticos e que, no limite, protegem as pessoas. E, neste caso em particular, nem se pode falar de intervenção externa porque que os intervenientes nesta crise são todos britânicos.