O Governo anunciou há cerca de duas semanas que vai vigiar os discursos de ódio na Internet. Como o discurso de ódio já está penalizado no art.º 240 do Código Penal não se percebeu qual a verdadeira intenção do Governo. Vigiar como? Através dos órgãos policiais? Criando uma Comissão de Vigilância?

Não. Através da contratação de cinco (porquê cinco?) projectos científicos com diferentes Universidades, explicou o Gabinete da Ministra da Presidência. A ideia é caracterizar o discurso de ódio. Não vão aqueles que depois o vão vigiar confundirem ódio com amor. Receio bem que tudo isto seja uma encenação para desvalorizar o conteúdo essencial da liberdade de expressão.

O país onde o tema do discurso de ódio (hate speech) tem sido mais discutido são os EUA. E é nele que encontramos as soluções mais razoáveis. Em primeiro lugar, o discurso de ódio não necessita de estar sujeito a leis ou regulamentos. Em segundo lugar, a discussão acerca do âmbito e alcance da liberdade de expressão assenta na Constituição (primeiro Aditamento de 1791). Nesse sentido, o papel do Supremo Tribunal tem sido consistente e decisivo desde 1942 ao sustentar que o “’hate speech’ está protegido pela liberdade de expressão constitucionalmente tutelada”.

O último dos acórdãos sobre o tema, de que tenho conhecimento, data de 2017 (Matal vs. Tam). Nele, por unanimidade, os nove juízes sustentaram que “o discurso que procura diminuir os outros com base na raça, etnia, género, religião ou idade é odioso mas a ideia de “discurso livre” assenta justamente na proteção da liberdade de expressão dos pensamentos que odiamos”.