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Donald Trump: muitas promessas, poucas cumpridas nos primeiros 100 dias de governo

Ao todo foram 60 as promessas de Donald Trump, mas nem todas foram adiante.
29 Abril 2017, 10h00

Ao todo foram 60 as promessas de Donald Trump, mas nem todas foram adiante. Nos 100 primeiros dias de mandato, a imigração dominou a atenção das ordens executivas, com fortes críticas sobre a ilegalidade e carácter discriminatório das medidas. Outro dos temas que dominou a agenda foram as medidas económicas, ou não tivesse Trump prometido, Make America Great Again. Os avanços foram poucos e registaram-se sobretudo na revogação de medidas da anterior administração.

Recuo na batalha do México

Se nos primeiros dias após a tomada de posse todas as baterias estavam apontadas para o polémico “lindo muro” na fronteira entre os Estados Unidos e o México, numa saga sem fim à vista sobre quem iria arcar com os custos da construção, a poucos dias da marca dos 100 dias Trump viu-se obrigado a um recuo estratégico para evitar o chumbo do Orçamento para 2017 e deixar cair o projecto-lei.

A oposição democrata já tinha ameaçado bloquear o Orçamento, caso Trump incluísse os custos para a construção do muro, que a administração previa serem cerca de 1,37 mil milhões de euros este ano. Pressionado pelo Congresso e sem ter, no imediato, como contornar a questão, o “presidente de todos os americanos” refreou o empenho em executar este “cavalo de batalha”.

Mas aproveitando a rede social preferida, publicou no Twitter que não desistiu da construção de uma das principais promessas da campanha eleitoral e de uma das primeiras ordens executivas assinadas, que acredita poder travar os milhares de imigrantes mexicanos que entram terra do Uncle Sam de forma ilegal, assim como diminuir o tráfico de droga. Cem dias depois e sem a “construção a toda a velocidade” do tão almejado salvador da pátria americana, continua a questão sem resposta: como é que o Estado vai financiar este mega-projeto?

Veto a imigrantes não sai do papel
A questão da segurança e defesa do território norte-americano foi e continua a ser um dos dossiers mais polémicos da agenda de Donald Trump e mereceu o primeiro chumbo dos tribunais às ordens executivas do presidente.
Determinado a controlar e monitorizar melhor o terrorismo nos Estados Unidos, Trump anunciou, a 27 de janeiro, um decreto anti-imigração, que proibia a entrada no país de refugiados e cidadãos provenientes de sete países muçulmanos – Iraque, Irão, Líbia, Somália, Sudão, Síria e Iémen.

A medida polémica abriu uma crise no seio do Partido Republicano e não passou no escrutínio judicial, com o chumbo do juiz de Seattle, James Robart. Considerando tratar-se de uma medida “legal e apropriada”, Trump recorreu da decisão do tribunal “com urgência”. Mas mais uma vez não teve muita sorte.

Não se dando por vencido, Trump decidiu, um mês e meio depois, apresentar um novo decreto, desta vez com novos procedimentos de seleção dos países a quem poderiam ser atribuídos os vistos legais permanentes, designados de “green cards”. De fora da lista de países banidos ficou o Iraque, graças ao apoio prestado aos Estados Unidos no combate ao grupo terrorista autoproclamado Estado Islâmico.

Mas, de volta aos tribunais, a nova versão do decreto voltou a ser chumbada e foi suspensa por tempo indefinido. Entretanto o Texas, a Flórida e outros doze estados norte-americanos já se mostraram favoráveis à aplicação do decreto. Resta saber agora se a medida terá pernas para andar ou se ficará apenas pelo papel.

Reversão do Obamacare impedida pelo próprio partido
Trump prometeu que revogar e substituir o ObamaCare seria a primeira medida a ser cumprida, mas este programa transformou-se numa derrota política durante os100 dias. Se pensar que o xadrez político das séries norte-americanas sobre o Congresso é exagerado, a medida ter sido barrada pela facção conservadora do próprio partido de Trump, que na prática ajudou a parar o projecto de lei republicano de avançar, mostra que a realidade às vezes supera a ficção.
Após a derrota, Trump afirmou que “aprendeu muito sobre a lealdade e o processo de arrecadação de votos”. Não assumiu a derrota e resignou-se simplesmente a dizer que “a melhor coisa que podemos fazer, politicamente falando, é deixar o Obamacare explodir”.

Numa entrevista à AFP, o líder reiterou que “tem grandes relacionamentos com o Congresso”, acrescentando que “estamos a ir muito bem e que temos uma grande base para coisas futuras”. No final do dia, ainda assim, a relação é frágil.

Trump e Putin: tão amigos que  eles eram
Forte critico da política externa da administração Obama, Trump iniciou o mandato com um menor foco na política externa, direccionado para a política doméstica. E neste campo todos os sinais eram de alerta: Trump sem filtros, a criticar parceiros internacionais e líderes de Estados.

Não acredita em projectos de integração e a União Europeia é um dos alvos preferidos, embora seja um dos principais parceiros comerciais dos EUA. O crescimento de soluções populistas na Europa, como o Brexit e a Frente Nacional, levaram o carimbo de apoio.
Continua fortemente crítico do orçamento da NATO, reforçando a necessidade de maior contributo dos aliados. No entanto, durante estes cem dias ainda não conseguiu avançar nesta questão.

Após as polémicas sobre as alegadas interferências russas na campanha presidencial de Novembro e quando pairava no ar a possibilidade de uma aproximação entre Moscovo e Washington, o cenário inverteu-se.
No primeiro discurso enquanto presidente, Trump sublinhou que “se Putin gosta de Trump isso é uma mais-valia” realçando que os EUA têm “uma relação difícil com a Rússia”, questionando ainda que “alguém acredita que Hillary ia ser mais dura com Putin que eu? Give me a break (tenham paciência)”.

Durante a administração Obama, o distanciamento entre os dois países agudizou-se, principalmente após a anexação da Crimeia pela Rússia. Os primeiros sinais da administração Trump pareciam deixar alguma abertura a uma reaproximação, no entanto, o conflito sírio transformou a relação.

A tensão tem sido crescente e na reunião entre o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, ficou visível que as reações entre Washington e Moscovo atravessam uma fase de afastamento.
Trump, feroz crítico da estratégia Obama, acabou por alterar a postura que defendeu que iria ter e atacou uma base militar aérea de al-Shayrat, perto da cidade síria de Homs, como represália pelo ataque químico ocorrido na Síria, que atribuem ao regime e que provocou a morte de 86 civis. Trump justificou o ataque com ser do “interesse da segurança nacional dos EUA prevenir e dissuadir o uso de armas químicas letais”.

Os dois países estão de lados opostos no conflito, com os EUA a deixar claro que não existe futuro político para Assad, enquanto Moscovo insiste que não que não existe provas de armas químicas por tropas sírias e continua a apoiar o regime.
Ainda que a administração norte-americana tenha insistido, após o ataque, que o mesmo não significou alterações na estratégia para a Síria, já lhe rendeu críticas de apoiantes de movimentos como o Alt Right, extrema-direita.
Até então o republicano sempre defendeu que o combate seria contra o Estado Islâmico e nunca contra a Síria.

China é o novo BFF (Best Friend Forever)
Amor com amor se paga. Que o diga a China que depois de ter assinado uma aliança estratégica com os Estados Unidos na luta contra o desenvolvimento do programa nuclear norte-coreano viu as relações com os norte-americanos florescer.
Antes disso, Trump havia acusado a China de desvalorizar artificialmente a moeda para aumentar a competitividade com as empresas americanas e o regime chinês viu-se relegado a ódio de estimação do republicano. Trump ousou ainda tocar na ferida e usar a “província rebelde” de Taiwan para provocar Pequim, ignorando a máxima de “uma China unida”.

Mas tudo o vento – ou melhor a nova aliança – levou. O encontro de dois dias do presidente chinês, Xi Jinping, com o presidente Trump, num ambiente informal e afastado dos holofotes da Casa Branca, na casa do presidente dos EUA de Mar-a-Lago, na Flórida, pôs fim à troca acesa de acusações verbais e, diria Trump, foi suficiente para ambos terem “desenvolvido uma amizade”.

Desta “amizade” entre os dois líderes das maiores economias do planeta, resultou um novo acordo comercial (com vantagens especialmente para os EUA) e a promessa de melhores parcerias caso a China, que é um importante aliado diplomático e económico do regime de Pyongyang, colabore com os EUA numa ação conjunta para fazer frente à ameaça nuclear norte-coreana, que é agora a preocupação principal da Administração Trump.

Tensão crescente com a Coreia do Norte
O desejo do líder norte-coreano, Kim Jong-un, de desenvolver o programa de armamento nuclear do país e criar um míssil intercontinental, com a finalidade de atingir o rival norte-americano, fez disparar os alarmes da Casa Branca.
Aos sucessivos avisos e sanções dos Estados Unidos, seguiram-se novas ameaças de Kim Jong-un e um recrudescimento das demonstrações de força da Coreia do Norte, com novos ensaios nucleares no Mar do Japão.

Para responder às “provocações” da Coreia do Norte, a Administração Trump desviou há cerca de duas semanas o porta-aviões, USS Carl Vinson, – que seguia rumo à Austrália – para a península coreana, com a finalidade de dissuadir Pyongyang de continuar com o desenvolvimento de armamento.

A resposta de Kim Jong-un não tardou a chegar: “O mundo verá como os porta-aviões de Washington são reduzidos a pedaços de aço e naufragam, e como um país chamado Estados Unidos é varrido da face da Terra”.
As declarações do líder norte-coreano serviram apenas para deitar água na fervura. A negociar uma operação cirúrgica feita a quatro pinças (Estados Unidos, Japão, Coreia do Sul e China), os norte-americanos, que perderam a “paciência estratégica”, preparam-se para conversações ao mais alto nível para pôr fim aos impulsos militares do presidente Kim. To be continued…

“Factos alternativos” chocam com a imprensa
O confronto de Trump com a imprensa bem que podia ser uma ‘fake news’ não fosse o caso de se tratar de um caso sério de mau casamento.
A desavença verificou-se desde logo na primeira semana do multimilionário à frente da Casa Branca, com os jornais a revelarem os números das audiências da tomada de posse, que Trump considerou terem subtraído em larga escala os “números reais”.

Mas a relação crispada já vinha de muito antes. Durante a corrida às presidenciais, Trump alegou estar a ser prejudicado por uma campanha mediática contra si e classificou os jornalistas como as “pessoas mais desonestas do planeta”.
A relação tumultuosa viria também a inaugurar um novo conceito na política norte-americana: os “factos alternativos”. Alegando uma cobertura enviesada dos acontecimentos por parte dos media, a conselheira de Trump, Kellyanne Conway, viria a reportar os números de audiência à tomada de posse divulgados por Sean Spicer, diretor de comunicações da Casa Branca, não como falsidades mas como “factos alternativos”.
Conhecido por dizer e desdizer o que disse em questão de minutos, à conta do novo conceito criado pela sua Administração, as últimas sondagens mostram que apenas 4% dos norte-americanos considera Trump como uma pessoa honesta. Daria Trump um bom jornalista? Fica a hipótese.

100 dias de protestos
A vitória do candidato republicano não foi bem recebida por todos os eleitores norte-americanos. Enquanto Trump discursava na escadaria do Capitólio, em Washington, milhares de pessoas protestavam pelas ruas das grandes cidades contra a vitória do novo presidente, que conseguiu menos votos do que a rival democrata Hillary Clinton, mas que ainda assim foi nomeado pelo Colégio Eleitoral.

Depois de a multidão ter sido dispersada das ruas pelas autoridades policiais, foi a vez dos boicotes aos produtos da marca Trump e das petições a pedir a destituição de Donald Trump.

Várias celebridades anunciaram que iriam emigrar para outro país caso a vitória do republicano se viesse a consumar e a Autonomous Space Agency Network (uma espécie de NASA para amadores) realizou a “primeira manifestação espacial”.
Também no Congresso, como seria de esperar, Donald Trump tem vindo a enfrentar bloqueios às suas medidas, quer da parte do Partido Democrata como de dentro do seu próprio partido.
As últimas sondagens feitas pelo The Washington Post revelam que 43% dos norte-americanos desaprovam fortemente o trabalho realizado pelo presidente durante os seus primeiros meses à frente do cargo.

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