O manifesto pouco interesse que sucessivos governos e inúmeras empresas têm demonstrado pelos trabalhadores que estudam, se qualificam e possuem experiência relevante, foi confrontado com o início de uma explosão social que os mais avisados anteviam.
Os motivos para esta reação social estão identificados há muito tempo. Para citar apenas algumas das razões mais relevantes, é o caso das políticas de redistribuição de rendimentos orientadas apenas para a base da pirâmide de remunerações.
Os ganhos para acionistas em crescendo em detrimento do fator trabalho. As carreiras inexistentes, a partir de níveis intermédios. A degradação do poder de compra dos trabalhadores que não possuem mobilidade familiar ou profissional para emigrar. Enfim, poderia continuar a enumerar um rol das causas para a explosão social.
De tudo isto resulta que, em termos de proporção da população, Portugal se encontra no topo mundial dos países cujos cidadãos mais emigram, com todas as consequências que daqui decorrem, nomeadamente em termos de envelhecimento da população, ou da perda de recursos humanos qualificados.
Refiro estas questões a propósito da greve dos professores, onde a ausência de carreiras dignas e remunerações justas levou à degradação das condições para o diálogo e para a manutenção da paz social. De realçar que aqueles professores que desfilaram pelas ruas são de todos os quadrantes políticos. Até mesmo filiados em sindicatos que estão num mutismo surreal, autista e subserviente em relação a outros interesses que não os dos professores.
Como é óbvio, existem especificidades próprias na carreira docente. Isto dito, no essencial, estamos perante questões transversais que afetam todos os trabalhadores portugueses com qualificação superior e experiência profissional. A saber, a desvalorização, populista, que governos e empresas fazem do conhecimento científico, técnico e experiência que acumularam ao longo da vida.
Talvez o Governo, já agora, pudesse aprender alguma coisa com os governos das regiões autónomas, que em devido tempo valorizaram devidamente os professores.
A desagregação da coesão política e social já se tinha revelado na representação política parlamentar e autárquica. Chegou agora às classes profissionais, com a radicalização daqueles que ensinam os nossos filhos e com a ascensão de estruturas de representação que vocalizam, comandam, corporizam e engrossam uma visão radical da sociedade.
A persistir-se na mesma abordagem, a radicalização a que assistimos entre os professores vai acontecer com outras classes profissionais. Preparem-se. Não vai ser bonito.