Referimo-nos a Federica Mogherini, a Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança. Começam a dissipar-se as dúvidas dos observadores mais otimistas relativamente ao fim do Tratado sobre a eliminação de misseis de curto e médio alcance (INF) assinado pela União Soviética e os Estados Unidos da América (EUA), em 1987. É pertinente interrogar-nos quem ganha e quem perde com o seu fim. Os países europeus serão certamente grandes perdedores. Que não subsistam quaisquer dúvidas sobre isso.

Não é ficção o perigo da Europa voltar aos anos oitenta, ao tempo dos SS-20 e dos Pershing, agora numa versão mais letal. Não se trata de algo distante, que possa ocorrer lá para as calendas gregas. No seguimento do abandono norte-americano do Tratado, Putin suspendeu a participação russa, esperando que alguma coisa entretanto aconteça que possa reverter a sua posição. A suspensão é acima de tudo um gesto político.

Segundo Yury Baluyevsky, antigo Chefe de Estado-Maior das Forças Armadas russas (2004-2007), se a Rússia se retirar do Tratado suspendendo definitivamente as suas obrigações, seis meses é o tempo para podermos ter mísseis colocados nas fronteiras da Rússia apontados aos países europeus, muito em particular àqueles que possuem armas nucleares próprias ou alberguem armas nucleares norte americanas no seu território (Bélgica, Holanda, Itália e Alemanha), para não falar da Roménia, Polónia e República Checa.

O Tratado só abrange mísseis que atingem o território europeu, sejam eles lançados pela Rússia ou por qualquer país da UE. O seu alcance não lhes permite atingir o território norte-americano. A proliferação deste armamento na Europa é uma ameaça real à sua segurança. É obrigatório incluí-lo na agenda política como uma preocupação de primeira grandeza. Por isso, aproveitamos este fórum para lançar dois apelos à Alta Representante. Sendo o território europeu o principal afetado por uma confrontação nuclear, porque não tomar a UE a iniciativa e mediar uma solução que permita resolver o presente impasse entre a Rússia e os EUA, em vez de se refugiar no conforto de discursos politicamente corretos e de conteúdo oco?

Tanto no passado como no presente, são vários os assuntos em que os interesses dos EUA e da Europa, pelo menos de alguns Estados-membros, não coincidem. Nem sempre o que é bom para os EUA é bom para a Europa, e vice-versa. O fim do INF é claramente um caso em que as divergências devem ser assumidas. Uma posição de anuência e fraqueza não ajuda a Europa a ser respeitada.

Obviamente que não se pretende questionar a bondade da manutenção do elo transatlântico, contudo isso não pode significar o alinhamento total e completo dos interesses da Europa com os dos EUA em todas as áreas e circunstâncias, incluindo a segurança e defesa, nem a permanente subordinação dos interesses da primeira aos interesses dos segundos.

Existindo um interesse comum à esmagadora maioria dos Estados-membros, faz todo o sentido que a UE introduza o desarmamento nuclear na sua agenda e lidere uma iniciativa diplomática nesse sentido, que vá para além das discussões sobre o INF. A Alta Representante podia persuadir os Estados-membros a seguirem o exemplo da Áustria e da Irlanda. O primeiro assinou e ratificou e o segundo assinou e em breve ratificará o tratado das Nações Unidas sobre a proibição de armas nucleares aberto à assinatura em 20 de setembro de 2017. Não faltam na Europa mecanismos que permitam a sua inspeção, verificação e controlo, haja vontade política para tal.