Afinal ganhar eleições é fácil. No caso de Boris Johnson (BoJo), porque foi Corbyn que as perdeu ao apresentar um manifesto eleitoral ao nível do de Michael Foot em 1983 e que Kaufman, parlamentar trabalhista, classificou na altura como a mais longa carta de suicídio da História.

Como corolário BoJo elegeu deputados nos bastiões tradicionais dos trabalhistas, no centro e norte de Inglaterra. Pode dizer-se de Corbyn que é um político de esquerda. Mas outra coisa que se pode dizer é o que Harold Wilson disse de Tony Benn: que ele “immatured with age”. Depois deste fracasso, a imprensa de direita não vai repetir o que disse de Benn, que é o homem mais perigoso da Grã-Bretanha.

Com a esmagadora vitória que conseguiu BoJo tem as mãos livres: dos Trabalhistas, até porque Corbyn não está a facilitar a sucessão; dos liberais democratas, um partido em soul-searching; e dos conservadores hard brexiters.

Mas tem que solidificar o eleitorado trabalhista da Inglaterra profunda que votou nele por não se rever em Corbyn, sem pôr de lado os conservadores, particularmente os perdidos nestas eleições, e tem que dar algo a norte da Muralha de Adriano, a quem nega um novo referendo pela independência. A sua estratégia para contentar a todos é vender mais banha da cobra: um plano a dez anos para desencadear uma “nova idade de ouro” e reequilibrar geográfico-economicamente a Grã-Bretanha.

Esta estratégia é consistente com o “Ressurgence of Regions” de Jones, paper louvado por Cummings, assessor especial de BoJo e obreiro da vitória no Referendo – “louvado” porque defende o efeito Mateus, de São Mateus. Curiosamente, foi escrito quando Jones recuperava de uma cirurgia, o que parece ter paralelo com a economia britânica. Esta semana anunciou ir apresentar este ano um massiv plan para lidar com a crise da assistência aos idosos, a implementar até 2025.

Outra medida que anunciou foi aumentar o salário mínimo 6,2%, na prática repor a perda de poder de compra desde – coincidência – o referendo de 2016. O salário mínimo no Reino Unido passa assim para 10,23 euros/hora, acima do smic francês, 10,15 euros/hora. Entretanto, diz que o veganismo é um crime contra os apreciadores de queijo.

Planos a dez anos e planos massivos de implementação até à legislatura seguinte é empurrar os problemas para a frente. Mas alguma coisa vai ter que fazer a curto prazo, a começar no Orçamento que Javid apresentará em março. Vai reescrever as regras do green book do Tesouro, e que incluem os critérios para investimento, afastando-as da análise custo-benefício que privilegia Londres e o sul de Inglaterra.

Mas financiar tudo aquilo que ele vem anunciando é, para já, um milagre da fé. Não basta S. Mateus, precisamos de S. Tomé. Ou em vez de março os britânicos terão orçamento a 1 de abril.