“A cada dia que passa sem se alcançar a paz, os impactos na economia crescem de forma exponencial”. A frase, certeira, é de Miguel Maya e foi proferida pelo Presidente da Comissão Executiva do MillenniumBcp no decurso da apresentação que teve lugar na conferência organizada pela Ordem dos Economistas na Fundação Gulbenkian e dedicada ao tema do crescimento económico.

Segundo o receio fundamentado expresso por Miguel Maya, são por demais evidentes os impactos da subida dos preços da energia na competitividade e mesmo na viabilidade de inúmeras empresas portuguesas, sendo por isso fundamental desenhar “apoios pontuais do Estado que protejam o tecido empresarial desta situação conjuntural que consubstancia uma falha de mercado”. Situação essa que, para o banqueiro, joga com o tema da divida pública sendo que estaríamos certamente melhor e mais resilientes se Portugal tivesse capacidade financeira e contas públicas equilibradas e saudáveis, para suportar choques como que habitualmente vivemos. “É imperativo reduzir com intensidade a dívida pública em percentagem do PIB. Estamos muito vulneráveis a eventos externos e dependentes de terceiros”, afirmou em jeito de aviso.

Como referiu o presidente da CIP no decurso da mesma conferência, essa redução indispensável da dívida pública terá que andar a par e passo com as reformas de fundo inadiáveis. Como alertou António Saraiva, é necessária vontade política para corrigir os problemas que já foram identificados em áreas como a justiça e a fiscalidade, diminuir a burocracia asfixiante imposta às pessoas e às empresas e apostar na eficiência e na qualidade da Administração Pública. Como os leitores habituais destas minhas crónicas se recordarão, isso mesmo aliás tenho vindo a defender aqui, na sequência da minha convicção de que este ciclo agora vivido se apresenta como provavelmente a última janela de oportunidade para o país, no que toca à possibilidade de reformas que só pecam por tardias.

A estas preocupações manifestadas somam-se ainda os avisos deixados pelo Presidente Executivo do Novo Banco e a Presidente do Conselho das Finanças Públicas. Segundo António Ramalho, num cenário de disrupção energética é provável que entremos em recessão em 2023, com reduções de crescimento já em 2022 e perante o risco de ‘italianização’ da nossa periferia, o que implicaria sermos vistos como uma entidade de spread de crédito. Por seu lado, Nazaré da Costa Cabral destacou que uma subida abrupta das taxas de juros constitui um risco sério para as finanças públicas portuguesas.

Em suma, e perante a certeza de que os efeitos da guerra na Ucrânia serão profundamente negativos, existem ações que devem ser obrigatoriamente tomadas relativamente a: medidas de curto prazo para apoio aos sectores económicos e segmentos populacionais mais afetados e desprotegidos; decisão rápida quanto a eventuais modificações na alocação das verbas do PRR, de acordo com a alteração na lógica dos investimentos tendo em conta os possíveis cenários; alterações no Orçamento do Estado tendo em conta a antecipação de um cenário recessivo e, evidentemente, a implementação de um plano de reformas de carácter estrutural.

Neste campo, Governo e Oposição têm aqui um desafio a vencer e que só será ganho conseguindo-se uma plataforma suprapartidária de entendimento comum. Os tempos assim o exigem.

 

 

FOTO: GERARDO SANTOS

“O Fenómeno Marcelino da Mata: O Herói, o Vilão e a História” é o novo livro de Nuno Gonçalo Poças, autor também do recente “Presos por um Fio – Portugal e as FP-25 de Abril”. Desta vez, o autor e comentador aborda a história do famoso e polémico comando nascido na Guiné. Uma leitura recomendável para todos os que se interessam pela nossa História recente, com destaque para a Guerra Colonial.