Por uma malfadada ironia do destino, dois Vasconcelos com uma influência decisiva no desenvolvimento do empreendedorismo e da inovação em Portugal partiram precocemente, quando ainda tinham tanto para oferecer ao nosso ecossistema, à nossa economia, ao nosso país – a todos nós. Falo de Diogo e João Vasconcelos.

O primeiro faleceu em 2011, com 43 anos, enquanto o segundo deixou-nos no final de março, também com a mesma idade. Ambos foram vice-presidentes da ANJE, criaram e geriram empresas, exerceram importantes cargos públicos e foram líderes inspiradores. Mas, mais do que isso, apresentavam características comuns e excecionais: determinação férrea, capacidade de mobilização, inteligência fulminante, pulsão criadora e espírito visionário.

Tive o privilégio de conviver e trabalhar com João Vasconcelos, pelo conheço bem a força avassaladora que emprestava a tudo em que se envolvia. Via primeiro que os outros e, firme nas suas convicções, não descansava enquanto não fazia acontecer as ideias e projetos que borbulhavam na sua cabeça. Era um fazedor indomável, um empreendedor nato, mas não um individualista. Sabia motivar as pessoas à sua volta e retirar o melhor delas. Para mobilizar os outros, fazia uso do seu entusiasmo contagiante, da sua reconhecida bondade e do seu trato afável, tantas vezes temperado com sentido de humor.

Foi assim na ANJE, na Startup Lisboa, na Secretaria de Estado da Indústria e nos projetos empresariais em que esteve envolvido desde os 18 anos. Animado por um profundo sentido de dever público, João Vasconcelos investiu muito do seu saber e da sua energia na promoção do empreendedorismo, sendo um dos principais responsáveis pela recente evolução do nosso ecossistema e pela expansão entre nós da cultura startup. Mas teve também sensibilidade para os novos desafios das PME, criando condições para o reforço da competitividade a partir da inovação e da tecnologia. Foi, aliás, um dos mentores em Portugal da Indústria 4.0, compreendendo a urgência da transformação digital do setor secundário.

A lição a reter da breve mas intensa vida de João Vasconcelos é, no fundo, a indispensabilidade da capacidade transformadora do ser humano. Numa era marcadamente tecnológica, de crescente automatização das atividades e de formas de comunicação e relacionamento cada vez mais impessoais, a dinâmica criadora de João Vasconcelos e sobretudo a sua força mobilizadora demonstram como o fator humano é determinante nas empresas como na vida em geral. São precisos líderes inspiradores para fazer emergir as ideias e convocar os talentos necessários ao desenvolvimento das sociedades.

Isto significa que a criatividade, a emoção, a intuição, a ética ou a resiliência são fundamentais nas pequenas e grandes decisões, nos pequenos e grandes empreendimentos em que a vida é fértil. Algo que não está ao alcance do mais sofisticado dos algoritmos.