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Emissão de dívida em moeda chinesa avança até junho

Portugal prepara-se para colocar 377 milhões de euros em Obrigações em renminbi para alargar a base de investidores. A data exata irá depender das condições de mercado, do apetite dos investidores e das necessidades de financiamento do país.
3 Novembro 2018, 13h00

A primeira emissão de dívida portuguesa em moeda chinesa deverá acontecer até ao final do primeiro semestre de 2019. O objetivo é diversificar a base de investidores que financiam a República e o Jornal Económico apurou que o montante das operações poderá chegar aos 377 milhões de euros no conjunto do ano.

“É um mercado que está a crescer muito, com uma dimensão já neste momento é muito significativa. Portanto estar nesse mercado e ser o primeiro país da área do euro a emitir nesse mercado é algo que nos orgulha, até pelas ligações históricas de Portugal ao Extremo Oriente”, explicou Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto e das Finanças, em entrevista ao Jornal Económico.

A emissão deste tipo de títulos, conhecidos como panda bonds, foi anunciada pelo Governo em setembro de 2017 e já tem autorização do banco central da China, mas até agora ainda não aconteceu. Mourinho Félix afirmou que a Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública – IGCP está ainda a trabalhar na emissão, “mas deverá ser no primeiro semestre do próximo ano com uma probabilidade elevada”.

O secretário de Estado não especificou qual o montante indicativo para a operação, ou se será realizado em uma ou várias colocações, mas está inscrito na proposta do Orçamento do_Estado para 2019 que o Tesouro pretende emitir 377 milhões de euros em dívida denominada em moeda que não euro. Apesar de Portugal ter Obrigações em dólares, o Jornal Económico sabe que todo esse montante está planeado para títulos na divisa chinesa, que deverão totalizar os três mil milhões de renminbi, à taxa de câmbio atual.

A data exata para a emissão irá depender das condições do mercado. “Temos que avaliar no momento da primeira emissão qual é o apetite dos investidores e também quais são as nossas necessidades de financiamento”, disse Mourinho Félix.

Regime fiscal desenhado para atrair investidores

O objetivo é sobretudo diversificar e alargar a base de investidores, de acordo com o secretário de Estado. Por isso, o Tesouro irá olhar para as condições no mercado nesse momento e para as necessidades de financiamento. Portugal tem beneficiado de condições externas favoráveis, bem como da maior confiança de agências de rating e investidores para emitir dívida a taxas de juro cada vez mais baixas. Depois da primeira emissão, e caso seja bem sucedida, o Tesouro irá avaliar depois se irá realizar emissões seguintes que dêem liquidez e que permitam aos investidores gerir essa dívida nas suas carteiras com lucro, mas também com benefício para a República Portuguesa. “Penso que por essa via também, temos todas as condições para ter aí um papel que seja muito bom para Portugal do ponto de vista do alargamento da base de investidores”, sublinhou.

Para aumentar a atratividade das panda bonds, o Governo propôs ao Parlamento benefícios fiscais para investidores estrangeiros que comprem dívida pública portuguesa emitida em moeda chinesa. A medida implica a isenção de pagamento de IRS ou de IRC dos juros decorrentes de contratos de empréstimo celebrados pelo IGCP em nome e em representação da República Portuguesa, sob a forma de obrigações colocadas em mercado primário.

A isenção é aplicada a títulos subscritos ou detidos por não residentes sem estabelecimento estável em território português ao qual o empréstimo seja imputado. A exceção são residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das Finanças.

De fora ficam também as transações em mercado secundário. Sempre que os valores mobiliários abrangidos pela isenção sejam adquiridos em mercado secundário por sujeitos passivos residentes ou não residentes com estabelecimento estável no território português ao qual seja imputada a respetiva titularidade, os rendimentos auferidos devem ser incluídos na declaração de IRS ou IRC.

Governo previne turbulência no  mercado

Apesar das condições crescentemente favoráveis (desde 2016) que têm beneficiado a dívida portuguesa, as últimas colocações de dívida já têm resultado em juros ligeiramente mais elevados. Ainda na semana passada, o IGCP pagou um juro de 1,939% para emitir 782 milhões de euros em Obrigações do Tesouro a 10 anos, o que representa uma subida face à última colocação de dívida benchmark.

Não só os custos de financiamento do país subiram como não foi alcançado o montante máximo indicativo do leilão, que se situava nos mil milhões de euros. A principal razão foi a incerteza generalizada a todo o mercado de dívida da zona euro devido ao conflito entre Itália e a Comissão Europeia em relação ao défice do país.

A curto prazo, a tendência é a mesma. Esta quarta-feira, o Tesouro colocou 1.250 milhões de euros em Bilhetes do Tesouro (BT) com juros médios negativos. No entanto, as taxas subiram tanto a três meses como a 11 meses em relação aos anteriores leilões comparáveis.

A colocação de panda bonds, que deverão ter uma maturidade próxima de cinco anos, poderá ser uma forma de Portugal contrariar a pressão em momentos de incerteza. “É um programa inicial e a ideia é ter também esse mercado. Em situações em que seja desejável diversificar para outros mercados é algo que é útil em situações de turbulência, ter mais um mercado disponível. Passamos a ter dívida portuguesa emitida em dólares, em euros e em moeda chinesa”, explicou Mourinho Félix.

Por outro lado, o principal desafio é expor a dívida portuguesa ao risco cambial do renminbi, numa altura especialmente crítica. A guerra comercial tem aumentado a volatilidade em relação à moeda chinesa, que já acumula uma desvalorização de 7% face ao dólar desde o início do ano. A queda não se deverá acentuar de forma significativa dado que o banco central da China já sinalizou que poderá intervir e apertar o controlo de capitais para limitar os efeitos da efeito comercial.

O Tesouro está também a acompanhar e acautelar a volatilidade cambial, através de cobertura de risco. “Ao emitir em moeda estrangeira, tal como quando emitimos em dólares, há a cobertura do risco cambial, portanto não há aqui uma especulação de em relação à taxa de câmbio”, garantiu o secretário de Estado.

Primeiro país da zona euro a emitir panda bonds

Portugal tornou-se um dos países preferidos para o investimento estrangeiro ao longo da crise, período durante o qual empresas chinesas adquiriram uma série de participações em firmas portuguesas, especialmente nos setores energético e bancário. Mais recentemente, em maio, a China Three Gorges lançou uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) dos 76,7% do capital da EDP, por nove mil milhões de euros. No campo da dívida, a operação será, no entanto pioneira.

Os bancos contratados para realizar a operação de colocação são a Caixa Geral de Depósitos, o Banco da China e a HSBC, segundo informações dadas pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, quando anunciou que o país tinha recebido luz verde dos reguladores chineses. Portugal irá, assim, juntar-se a um número muito limitado de países que já emitiu dívida em moeda chinesa, incluindo a Hungria, Polónia e Coreia do Sul.

A colocação de panda bonds poderá beneficiar de condições mais favoráveis do que o inicialmente previsto pelo Governo já que a China anunciou em julho que está a preparar medidas de simplificação para os ativos em renminbi com vista a encorajar a participação estrangeiro no mercado de dívida do país.

O montante atual de dívida estrangeira emitida em divisa chinesa é de apenas 160 mil milhões de renmibis, o que equivale a cerca de 20,1 mil milhões de euros e compara com um mercado de dívida no país que ascende a 9,6 biliões de euros. O interesse pelas panda bonds tem sido limitado, em parte, pelas regras pouco claras das qualificações dos emitentes e do destino dos retornos. O vice-governador do Banco da China, Pan Gongsheng, explicou à agência Reuters que as novas diretrizes visam exatamente simplificar a emissão, a retirada de ganhos e o regime fiscal.

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