Imagine que vive num país onde a sua relação com o Estado pode ser integralmente realizada online.

Imagine que em cada interação com organismos públicos não tem de repetir a escrita da morada, do número fiscal, do número da segurança social, ou outro dado que já facultou no organismo proprietário dessa informação.

Imagine que quando vai ao médico não precisa de sair com nenhum papel para ir à farmácia levantar a receita e só entra na farmácia dizendo o seu número de utente de saúde.

Imagine que pode estar em casa, ou até na praia, em dia de eleições e votar a partir do seu telemóvel.

Imagine que em todos os organismos públicos aceitam documentos assinados digitalmente e com o mesmo peso que a assinatura feita a caneta no papel.

Quando falamos de um Estado Digital, avesso à burocracia, com segurança de dados, que garantisse que os dados pessoais são geridos pela própria pessoa ou que os dados de negócio são geridos unicamente pelos organismos públicos responsáveis por essa informação, estamos a falar de um Estado eficiente, com impacto direto no crescimento e desenvolvimento económico de médio e longo prazo no país.

Se pensa que o que acabou de ler é pura imaginação, fique a saber que já é uma realidade efetiva e comprovada na Estónia – um país que, embora mais pequeno que Portugal, comprovou que é de facto possível criar um Estado dinâmico e inimigo da burocracia.

Este conjunto de desafios, não sendo fácil tecnologicamente, necessita apenas de uma estratégia digital de médio e longo prazo para o país. Fala-se bastante de Acordos de Regime na Justiça, na Saúde, na Educação, entre outros, mas ainda não ouvimos falar em Acordos de Regime para o Digital. Os Sistemas de Informação são hoje uma atividade “core” das empresas (quem não o vir assim, pode estar condenado a prazo), mas também deve ser para a Administração Pública.

A definição de uma estratégia digital nada tem a ver com tecnologia, mas com os princípios orientadores que pretendemos e os modelos de governação do tema.

Garantir os princípios de dispor de plataformas de comunicação de dados com níveis de segurança máximos e invioláveis à sua manipulação, são hoje possíveis, pelo que não há razões para não o fazer. Garantir que o poder da informação individual é exclusivo do seu dono (cidadão ou empresa) é também hoje assegurado com várias técnicas de gestão de dados, plenamente consensualizadas no mundo digital.

Tal como quando se constrói uma casa, estamos em primeiro lugar a falar da arquitetura do que se pretende e da forma funcional do objetivo. Só depois vem a engenharia tecnológica! Em Portugal, muito se tem procurado fazer (e fez-se sem dúvida), mas para além de ser “uma gota no oceano”, tem tido um defeito crucial que importa corrigir, enquanto é tempo.

Por outras palavras, tem-se perdido demasiado tempo a discutir egos individuais ou de organismos e colocado menos foco no objetivo transversal de ter um único Estado Digital e ao serviço do cliente cidadão ou empresa.

Importa definir uma visão de “Burocracia Zero, Tempo de Resposta Zero”, suportado numa arquitetura de dados (quem é dono do quê) e de fluxos de comunicação única (processos) para esse Estado Digital. Teremos um Estado transparente que acredite em nós e nós a acreditar nele.

Qual o primeiro passo? Tal como qualquer projeto tecnológico, que necessita de uma justificação de negócio para ocorrer, neste caso, o projeto Estado Digital necessita de vontade política (o sponsorship essencial). Foquemo-nos em ter uma estratégia, para além dos projetos avulsos, importantes certamente, mas sem a linha comum para a visão final.