O início de 2022 será, inevitavelmente, marcado pela transformação no relato financeiro, devido à entrada em vigor do formato eletrónico único de reporte, vulgo ESEF, aplicável às empresas com valores mobiliários admitidos à negociação em mercados regulamentados da União Europeia e para os exercícios findos em (ou após) 31 de dezembro de 2021.

Esta nova obrigação em matéria de reporte passa a constituir a versão oficial, sendo, portanto, essencial para o cumprimento das obrigações de divulgação de informação financeira ao abrigo do artigo 4º da Diretiva de Transparência.
De acordo com o Regulamento ESEF1, os relatórios anuais terão de ser preparados em formato XHTML. As entidades que apresentem as demonstrações financeiras consolidadas em conformidade com as IFRS deverão ainda proceder à marcação das mesmas com recurso à tecnologia iXBRL, aplicando a taxonomia extensível core do ESEF desenvolvida pela European Securities and Markets Authority (ESMA). Em 2023, será ainda necessário efetuar a marcação das notas às referidas demonstrações financeiras.

Estamos assim perante um novo paradigma no reporte de informação financeira e é, por isso, fundamental consciencializar as empresas de que esta transição não significa apenas converter o relatório anual para um formato diferente.

Requer processos de preparação e submissão da informação diferenciados e adaptados às novas exigências. Como tal, introduz novos desafios para as Empresas, desde logo com a necessidade de familiarização com este reporte e requisitos associados, bem como com a taxonomia a aplicar. Implica uma capacitação de recursos e seleção de ferramentas que permitam uma integração adequada no processo de fecho e consolidação de contas, de modo a garantir a produção de relatórios em conformidade com o Regulamento ESEF. Perspetiva-se ainda que o ESEF possa vir a ser futuramente aplicado a divulgações de informação financeira com menor periodicidade. Independentemente da sua evolução neste domínio, é já uma certeza que este novo paradigma será alavancado para o reporte não financeiro.

Em abril de 2021, a Comissão Europeia publicou uma proposta relativa à Diretiva sobre o Reporte de Sustentabilidade Corporativo (CSDR, na sigla em ingês), na qual o Grupo consultivo em matéria de Reporte financeiro foi mandatado para desenvolver os European Sustainability Reporting Standards, estando previsto que a primeira versão das normas seja endossada em outubro de 2022 e a primeira aplicação tenha início em 2024, com referência ao exercício de 2023.

Neste sentido, embora existam lições já assimiladas que poderão ser alavancadas graças à experiência do ESEF, antecipa-se um conjunto de desafios adicionais. Primeiro: nas normas de relato, que são os alicerces do reporte, verifica-se um gap significativo relativamente à maturidade em contexto financeiro versus não financeiro. Segundo: observam-se algumas lacunas relacionadas com sistemas que integrem e normalizem a informação e que permitam desenvolver um ambiente de gestão e controlo robusto sobre a mesma. Isto deve-se, em parte, a uma dispersão considerável nas fontes dos dados subjacentes ao reporte não financeiro. Outro aspeto relevante a considerar prende-se com o âmbito de aplicação deste reporte. Em Portugal, o número de empresas abrangidas pelo ESEF encontra-se na ordem das dezenas, enquanto que no reporte não financeiro, atendendo ao critério de elegibilidade previsto na CSDR, contabilizam-se mais de mil empresas.

Em suma, o novo paradigma de reporte introduzido pelo ESEF constitui uma iniciativa de larga escala que visa facilitar a acessibilidade, análise e comparabilidade dos relatórios, contribuindo para uma maior harmonização e transparência da informação reportada. Aporta potencial de expansão e promete ser um marco na transformação digital do relato. Assim, o momento é oportuno para as organizações repensarem os seus modelos operativos, necessariamente mais assentes em tecnologia, de forma a conseguirem dar resposta a um contexto de transformação, crescente exigência e escrutínio.