[weglot_switcher]

Espanhóis da Talgo querem vender comboios à CP

O grupo espanhol abre a corrida para fornecer novo material circulante à CP, após quase dez anos de interrupção de compra de comboios pela operadora ferroviária nacional devido à crise financeira.
11 Janeiro 2018, 07h20

O grupo espanhol Talgo, fabricante de comboios e outro equipamento ferroviário, assume o seu interesse em participar no concurso que a CP vai lançar em breve para aquisição de material circulante para renovar a frota da transportadora ferroviária nacional.

Num encontro que decorreu na passada terça-feira com vários jornalistas portugueses, João Constantino Meireles, responsável pelo desenvolvimento de novos negócios da Talgo para Portugal e para a América Latina, revelou que “temos tido contactos vários, estreitos e permanentes desde há vários meses com a CP sobre esta matéria”.

“Como não conhecemos quaisquer pormenores sobre o caderno de encargos, temo-nos baseado no caderno de encargos publicado em 2008, no último concurso lançado para compra de material circulante para a CP, concurso que depois foi anulado em 2009”, assumiu José Manuel Constantino nesse encontro, que incluiu a visita a uma das fábricas que a Talgo gere em Espanha, neste caso em Madrid.

A anulação desse contrato da compra de comboios pela CP resultou da crise financeira em que Portugal entrou nessa altura.

No respetivo caderno de encargos, a CP compreendia a aquisição de mais de 70 comboios, em bitensão e a ‘diesel’, num valor de investimento na altura avaliado em cerca de 370 milhões de euros de valor-base.

Os comboios que a CP pretendia adquirir iriam destinar-se a modernizar o serviço regional, a linha de Cascais, os suburbanos do Porto e a linha de suburbanos do Sado.

Neste pacote, estavam previstas opções suplementares para a compra de comboios para os serviços suburbanos de Lisboa e para o segmento de longo curso da CP.

Nessa ocasião, aquando do último concurso, falhado, para aquisição de material circulante para a CP, participaram na corrida os grupos Siemens (Alemanha), Alstom (França), Bombardier (Canadá) e CAF (também de Espanha).

Nesse mesmo concurso, a Talgo não participou, nem sequer levantou o respetivo caderno de encargos.

Neste momento, o posicionamento da Talgo é completamente oposto, levando mesmo a Talgo a abrir a corrida para este concurso.

O ministro do Planeamento e das Infraestruturas, Pedro Marques, disse, em novembro do ano passado, que o caderno de encargos referente ao concurso para compra de comboios para a CP deve ser publicado até ao final do primeiro trimestre deste ano.

Questionado sobre qual a disponibilidade da Talgo em incorporar produção nacional dos comboios em Portugal, José Manuel Constantino, assegurou que “a ideia é fabricar localmente, pelo menos em parte”.

“Para isso, já temos contatos com fornecedores locais, para repetir por experiência que foi criada há uns anos entre a Siemens e a EMEF [empresa participada da CP dedicada à manutenção ferroviária]. Estamos preparados para fazer a montagem final e os ensaios dos comboios em Portugal”, adiantou João Constantino Meireles.

Segundo este responsável da Talgo, “na maior parte dos contratos atuais, esta componente da montagem final e dos ensaios pesa cerca de 20% do valor final do contrato”.

“Esse assunto já foi por nós muito pensado e estudado. Agora, é necessário que haja condições criadas para isso pelo futuro caderno de encargos”, garante este reponsável, o único português a trabalhar na Talgo.

Segundo João Constantino Meireles, a grande preocupação atual nos operadores ferroviários internacionais é a maior rentabilização possível dos comboios.

“Por isso, é que no último concurso ganho por nós, a Renfe [equivalente à CP em Espanha] pediu-nos comboios com configuração 3 + 2 (filas de assentos), com capacidade para mais de 500 passageiros por comboio (de 200 metros)”, explica este responsável da Talgo.

A Talgo assume-se como um fabricante de comboios com características específicas em relação à concorrência: comboios construídos em alumínio, mais leves e confortáveis e menores gastos de energia; com menor centro de gravidade e rodas independentes, posicionadas entre as carruagens, sem ser debaixo, o que, alegadamente, reduz o risco de descarrilamentos; com o comboio totalmente ao nível da plataforma, permitindo uma viagem mais confortável aos passageiros, menores tempos de paragens nas estações e menores tempos de evacuação em caso de acidentes; e uma construção articulada para o conjunto da composição, em estilo de ‘serpente’ e uma pendulação que vai de encontro ao raio da curva da linha de caminho-de-ferro.

“Outra das vantagens da Talgo é que desde 1968 desenvolveu a solução do intercambiador entre as bitolas UIC [europeia] e ibérica. A Talgo tem um sistema preparado, com testes feitos, para o intercambiador de bitola, que também servirá para o segmento de mercadorias. Com este intercambiador, acabaram-se as fronteiras ferroviárias; assim, em Portugal, já não somos uma ilha ferroviária, até porque Espanha continua a investir na bitola ibérica”, defende João Constantino Meireles.

O Talgo 250, considerado um todo-o-terreno, porque funciona com dois sistemas de tensão elétrica (bitensão), e ‘diesel’ (bimodo, elétrico e a combustível), também está apto a funcionar nas duas bitolas (ibérica e UIC), é um dos produtos que o grupo espanhol pensa propor à CP, face às necessidades da transportadora ferroviária nacional.

A Talgo registou no ano passado uma faturação à volta de 600 milhões de euros. Desse montante, cerca de 50% foram obtidos com serviços de manutenção.

O grupo Talgo, liderado pela família Oriol, pelos netos do fundador, tem fornecido comboios e outros equipamentos ferroviários para países como Espanha, Cazaquistão, Uzbequistão, Estados Unidos e, mais recentemente, para a Arábia Saudita, no famoso projeto da linha de alta velocidade ferroviária entre Meca e Medina, onde os Talgo 350 já estão a fazer testes de velocidade no deserto.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.