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Este país não é para velhos?

Pensões extra pagarão IRS, gerando um impacto desfavorável nos pensionistas que aufiram pensões próximas do salário mínimo nacional, a menos que sejam introduzidas medidas em sede de IRS como o aumento da dedução específica.
30 Setembro 2022, 00h45

Muito se tem discorrido sobre as medidas excecionais de apoio às famílias para mitigação dos efeitos da inflação, em particular no que se refere à criação de um complemento excecional a pensionistas em 2022 para compensação do aumento conjuntural de preços, bem como os impactos futuros da menor atualização prevista para as pensões em 2023 face à que resultaria da atual regra de atualização das pensões prevista na Lei 53º-B/2006, de 29 de dezembro.

Relativamente ao complemento excecional a pensionistas, este ascenderá a 50 % do valor total auferido em outubro de 2022 a título de pensões, com exceção dos casos em que as pensões sejam superiores a 5.318,4 euros. Estes montantes serão objeto de retenção na fonte autónoma no mês de Outubro, não sendo, para efeitos de cálculo do IRS a reter, adicionados às pensões dos meses em que são pagos ou colocados à disposição. Contudo, serão tributados em termos finais, o que poderá gerar um impacto desfavorável em particular nos pensionistas que aufiram pensões próximas do salário mínimo nacional, a menos que sejam introduzidas medidas em sede de IRS que compensem o referido acréscimo de tributação.

A título exemplificativo, um pensionista que aufira uma pensão de 705 euros mensais,solteiro, sem dependentes irá receber no mês de outubro de 2022 um complemento excecional de 352,5 euros (50% de 705 euros), já que estas pensões não são sujeitas a retenção mensal), pelo que o valor anual líquido das pensões passará de 9.870 para 10.222,5 euros. Contudo, atendendo à regra do mínimo de existência, o aumento do valor líquido das pensões será totalmente absorvido pelo imposto incidente sobre o montante dos 10.222,5 euros, pelo que na prática o pensionista não verá o seu rendimento disponível aumentado.

O Governo já indicou que, tal como indicado na Lei do Orçamento do Estado para 2022, se encontra a avaliar a introdução de alterações ao mecanismo do mínimo de existência, por forma a corrigir estes elementos de regressividade que desincentivam o aumento de rendimento dos contribuintes, em particular dos que auferem rendimentos próximos do salário mínimo nacional, o que poderá contribuir para mitigar o efeito acima indicado, dependendo da atualização que vier a ser introduzida. Esta alteração não terá impacto apenas para os pensionistas, mas em princípio abrangerá também trabalhadores dependentes e os denominados “recibos verdes”, pelo que poderá ter um impacto orçamental significativo, contudo é muito importante para compensar o efeito desfavorável acima indicado.

Por outro lado, não obstante o Governo indicar que esta medida se trata de um complemento excecional a pensionistas, na prática a mesma traduz-se num adiantamento de parte do valor que seria devido em 2023 caso se aplicasse no próximo ano a fórmula de atualização de pensões atualmente em vigor. Com efeito, de acordo com a fórmula legal de atualização das pensões atualmente em vigor, em 2023 o Governo estima que as pensões deveriam sofrer atualizações entre 7,1% e 8%, enquanto que, de acordo com as medidas agora preconizadas pelo Governo, essas atualizações variarão entre 3,53% e 4,43%.

Ainda que esta redução tenha sido estimada de modo a que a soma da compensação excecional de 2022 com a atualização das pensões agora preconizada para 2023 seja igual à atualização que resultaria da aplicação da fórmula legal em 2023, a verdade é que esta medida tem impacto na atualização das pensões em 2024 e seguintes, pois a compensação excecional não servirá de base à atualização de pensões futuras. Uma forma de atenuar este impacto desfavorável para os anos de 2024 e seguintes poderia passar por aumentar a dedução específica das pensões dos atuais 4.104 para um valor superior (de notar que já houve anos transactos nos quais a dedução específica das pensões era superior à aplicável aos trabalhadores dependentes). Outra alternativa passaria por compensar a menor atualização em 2023 com um acréscimo de 2024 e seguintes – uma medida similar à introduzida na Lei nº 53-B/2006, que precomizava que para compensar o adiamento da actualização de pensões, em Janeiro de 2008, a actualização decorrente da aplicação das regras legais seria acrescida de um aumento extraordinário face ao aumento normal da pensão.

A manter-se a inflação em 2023 em níveis superiores a 4,43%, a atualização proposta pelo Governo traduzir-se-á numa perda real do poder de compra dos pensionistas, o que é contrário ao princípio subjacente à lei atualmente em vigor, que estabelece como objetivos assegurar a manutenção do poder de compra das pensões e a sustentabilidade financeira do sistema de segurança social.

Atendendo a que os pensionistas não conseguem em muitos casos aceder a fontes de rendimento alternativas que compensem estas perdas reais de poder de compra, é importante assegurar que sejam introduzidos mecanismos que, sem pôr em causa a sustentabilidade do sistema de Segurança Social, salvaguardem o seu orçamento familiar.

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