Há sinais preocupantes no comportamento do Governo e de agentes próximos do Partido Socialista que exigem reflexão. Os casos ainda em análise do procedimento de nomeação do procurador europeu, a atitude de arrogância da ministra da Saúde, a postura repreensível do ministro da Educação em relação ao ensino particular e à obstaculização das aulas online e agora a paupérrima justificação daqueles que tomaram a vacina sem estar em qualquer nível de prioridade, mais do que demonstrar um ato de chico-espertismo, ilustra uma preocupante atitude de prepotência e sobranceria. Em todos os momentos de crítica logo se desmentiu o que as imagens não permitem contrariar.

Os lapsos governamentais começam a dar sinais dos regimes pouco observadores da democracia. Erros acontecem, mas o que temos constatado é uma gritante incapacidade de os admitir, e de os assumir com humildade. Não acontecendo desvia-se a atenção para cenários de conspiração e vitimização.

Algumas situações são temerárias em tempos de profundo escrutínio e imediata denúncia na comunicação social e redes sociais, sendo estas brutais na análise e no apontamento, quantas vezes em exagero, mas na generalidade detalhando com certeira pontaria o erro e a culpa.

As situações já apresentadas e derivadas da toma indevida da vacina ameaçam tornar-se caricatas. Imagina-se que muitas existam ainda por denunciar e que agora alguns tentam desesperadamente esconder. Estas demonstram como as pessoas por vezes não resistem a pensar, egoisticamente, em particular na esfera dos pequenos poderes, como um xerife no faroeste no século XIX. Seguramente que haverá uma justificação plausível para todas as situações, desde aqueles que repentinamente se tornaram voluntários, aos administrativos que lidam com as estatísticas do controlo da doença ou da respetiva distribuição.

A saga que entretanto se desenrola na Assembleia da República tem lugar onde não deveria ocorrer. Na instituição que deve ser exemplar para o país, a polémica entre quem está e não está na lista de vacinação não abona a favor de nenhum dos intervenientes. A pressa, o “entra e sai” da lista, a mudança de posição ou critérios que não parecem ter sido consensualizados – a somar agora aos falsos heróis e ao subir de tom das reações num verdadeiro cenário de confrontação política –, além da imagem negativa, representam o pior serviço público visto desde que se entrou nesta situação pandémica.

O consenso, precioso na primeira fase, é substituído pela guerrilha na construção de uma lista de vacinação, que deveria ter sido considerada e consensualizada desde o início e não construída na praça pública. Há políticos que devem ser vacinados pela função que desempenham. Mas, mais uma vez, a demagogia parece galgar terreno e a falta de decisão inicial atropela agora uma decisão de Estado, porque é disso que se trata.