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Eutanásia: Inviolabilidade do direito à vida não é obstáculo mas quatro juízes do TC discordam

Embora a maioria dos juízes do Palácio Ratton tenha concordado que a inviolabilidade do direito à vida não é um obstáculo à lei, houve quatro juízes conselheiros que discordaram da posição maioritária e deixaram críticas a que não tenham sido levantadas objeções à despenalização da eutanásia por “violação do direito à vida”. 
16 Março 2021, 12h53

A descriminalização da eutanásia foi chumbada esta segunda-feira pelo Tribunal Constitucional, ainda que a maioria dos juízes do Palácio Ratton tenha concordado que a inviolabilidade do direito à vida não é um obstáculo à lei. Mas houve quatro juízes conselheiros que discordaram da posição maioritária e deixaram críticas a que não tenham sido levantadas objeções ao diploma por “violação do direito à vida”.

Numa declaração de voto conjunta, os conselheiros Maria José Rangel de Mesquita, Maria de Fátima Mata-Mouros, Lino Rodrigues Ribeiro e José Teles Pereira afastam-se dos restantes juízes que consideraram que “o direito a viver não pode transfigurar-se num dever de viver em quaisquer circunstâncias”, depois de o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter pedido a fiscalização preventiva do diploma.

Apesar de a inviolabilidade do direito à vida não ter sido uma questão levantada por Marcelo Rebelo de Sousa para justificar o pedido de fiscalização, os quatro juízes conselheiros considera que a admissão da eutanásia conduz “inelutavelmente” a “um novo paradigma de ‘convivência’ com o princípio da inviolabilidade da vida humana”.

Segundo esses juízes, a despenalização da eutanásia nos termos propostos no diploma pressupõe que “o direito à vida inclui o direito de não ser morto”, o direito à “opção de viver e a opção de morrer, com as quais (no caso da segunda opção, nas condições fixadas pelo Estado) os outros não podem legitimamente interferir”, e que, se alguém decide morrer, “está a renunciar, no quadro das suas opções válidas, ao direito à vida”.

“Ao renunciar a esse seu direito – este é o problema central criado pelo decreto (…) –, está a libertar outros (especificamente está a libertar o Estado) do dever de não o matar. E o Estado está a afastar a proibição/a punibilidade de matar nesse caso”, sustentam.

Os subscritores da declaração de voto defendem, por isso, que a despenalização da eutanásia é um assunto que está “fora do alcance de maiorias”, por chocar com o direito à vida, consagrado na Constituição da República. Maria José Rangel de Mesquita, Maria de Fátima Mata-Mouros, Lino Rodrigues Ribeiro e José Teles Pereira, que acompanharam o acórdão final do Tribunal Constitucional, discordam assim que a lei da eutanásia não tenha sido declarada inconstitucional por “violação do direito à vida”.

Recusa ao “dever de viver em quaisquer circunstâncias”

No acórdão do Tribunal Constitucional, os juízes defendem que “da circunstância de um direito fundamental como o direito à vida constituir uma conditio sine qua non de todos os demais direitos, não decorre de forma necessária a sua permanente superioridade axiológica sobre os restantes direitos”. Ou seja, no entender dos juízes do Palácio Ratton, o direito à vida não deve sobrepor-se a outros direitos e liberdades fundamentais.

Mas o Tribunal Constitucional deu razão ao Presidente da República no que respeita à “insuficiente densidade normativa” do conceito de “lesão definitiva de gravidade extrema de acordo com o consenso científico”. A falta de “densidade normativa” viola “o princípio da determinabilidade da lei corolário dos princípios do Estado de direito democrático e da reserva de lei parlamentar”. Isto porque a lei não permite “delimitar com o indispensável rigor” as circunstâncias em que a eutanásia pode ser praticada.

A despenalização da eutanásia foi chumbado com sete votos contra dos juízes e cinco a favor. Votaram a favor do acórdão o vice-presidente do Tribunal Constitucional Pedro Machete, e os juízes Lino Ribeiro, Fátima Mata-Mouros, José Teles Pereira, Joana Costa e Maria José Rangel Mesquita. Já os juízes Mariana Canotilho, José João Abrantes, Maria da Assunção Raimundo, Gonçalo de Almeida Ribeiro e Fernando Vaz Ventura votaram contra.

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