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Ex-coronel foi à televisão russa dizer (algo raro) a verdade e deixou aviso: “a situação vai piorar” para o exército de Putin na Ucrânia

Mikhail Khodarenok já tinha chamado a atenção para os riscos da guerra, ainda antes da invasão começar. Agora, aconselhou o Kremlin em direto perante milhões de russos a não apontar misseis à Suécia e à Finlândia e disse o óbvio: Moscovo está isolado internacionalmente.
18 Maio 2022, 09h07

Na televisão russa, o entusiamo pela guerra tem estado em alta nos últimos meses. Desde tsunamis atómicas no Reino Unido ao bombardeamento nuclear de Nova Iorque, o mundo tem assistido com horror à propaganda pró-Kremlin nos canais russos.

Mas esta semana os russos puderam ouvir uma análise imparcial, para variar. Mikhail Khodarenok é um coronel do exército russo na reserva e analista militar e foi à televisão russa dizer algo que é raro hoje em dia por aquelas bandas: a verdade ao povo russo.

“Não devemos tomar sedativos informativos. Por vezes, ouvimos sobre uma quebra de moral nas forças ucranianas, mas isto não é verdade. É preciso olhar para o cenário mais alargado. O exército ucraniano pode armar um milhão de pessoas; isto pode ser uma realidade no futuro próximo.  A situação para nós vai piorar claramente”, disse o especialista no programa ’60 minutos’ do Rússia 1, o principal canal da televisão estatal do país.

Sobre a adesão da Suécia e Finlândia à NATO, disse que o importante é continuar “realista” e “não acenar com mísseis na direção da Suécia e Finlândia. Isso é uma comédia”, afirmou, perante o olhar impávido dos restantes convidados, num vídeo publicado nas redes sociais pelo jornalista da “BBC” Steve Rosenberg.

“O maior problema é que estamos em isolamento geopolítico total. Todo o mundo está contra nós, mesmo que não queiramos admitir. O apoio da China e da India não é incondicional”, acrescentou.

“A situação não pode ser considerada normal. Existe uma coligação de 42 países, e os nossos recursos militares, políticos e técnicos são limitados. Temos de resolver isto”.

O militar também destacou que um exército de reservistas “pode ser muito profissional” e que a motivação das forças ucranianas está em alta.

“O nível de profissionalismo de qualquer exército é dado pelo nível de treino, moral e motivação para derramar sangue pela pátria”: “É o desejo de defender a pátria”, reforçou, destacando os estudos dos teóricos soviéticos apontando neste sentido: “nisto tinham razão”.

A intervenção de seis minutos do especialista militar foi selada por umas notas da apresentadora Olga Skabeyeva, considerada uma propagandista do Kremlin, mantendo-se fiel ao seu registo.

“Fomos obrigados a fazer isto [Rússia a invadir a Ucrânia]. A nossa existência está em risco. A rendição não é possível. E não é possível encontrar uma linguagem comum com quem nos quer fazer desaparecer. O nosso grande país vai vencer. Temos de ir até ao fim”, afirmou, numa intervenção propagandística digna de um membro do Governo de Vladimir Putin.

Mas Mikhail Khodarenok também manteve-se fiel ao seu estilo. Em fevereiro, antes da invasão russa, chamou a atenção dos “falcões entusiastas e os cucos apressados” por dizerem que uma guerra contra a Ucrânia podia ser vencida facilmente.

“Um conflito armado com a Ucrânia não é do interesse nacional da Rússia”, escreveu na altura numa revista militar russa, citado pela “BBC”.

Na sua análise, a “BBC” estranha esta lufada de ar fresco num programa tão próximo da visão do Kremlin como este e admite o cenário de que o Governo de Vladimir Putin pode estar a preparar-se para divulgar aos russos notícias negativas sobre a “operação militar especial” em curso na Ucrânia.

 

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