A Ordem dos Médicos (OM) está a realizar eleições para o triénio 2023-2025, que decorrem entre 10 e 19 de janeiro, sendo eleitos o bastonário, os membros da Assembleia de Representantes e Conselho Superior, assim como os órgãos regionais (Norte, Centro e Sul) e sub-regionais.
São seis os candidatos a bastonário e são 61.134 os médicos inscritos nos cadernos eleitorais para eleger o sucessor de Miguel Guimarães, que cumpriu dois mandatos como bastonário da Ordem dos Médicos.
O Semanário “Novo” fez cinco perguntas a cada um dos seis candidatos a bastonário sobre temas relevantes para a classe e para o sector da Saúde em Portugal.
Estas são as respostas de Fausto Pinto, cardiologista, professor catedrático da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e diretor do Instituto de Cardiologia de Lisboa.
Qual o mais importante desafio que a classe enfrenta? Porquê?
Há múltiplos desafios, não tanto e apenas para a classe médica, mas para a Saúde em Portugal, onde os médicos têm e terão sempre (ou deveriam ter) o papel central. Nunca haverá Saúde sem médicos! Por isso, no momento atual em Portugal, o principal desafio é garantir que as boas práticas médicas sejam devidamente implementadas, e para isso é fundamental ter uma Ordem dos Médicos forte, dignificada, respeitada. É, no fundo, o garante e zelador do bem mais precioso que a Humanidade tem, ou seja, a sua Saúde.
Para isso é fundamental dignificar, respeitar e valorizar devidamente a profissão médica. Esse é o grande desafio.
Há falta de médicos em Portugal ou temos um problema de gestão na saúde?
Portugal ocupa a terceira posição no rácio médico/população da OCDE. No último concurso de acesso à especialidade houve 438 médicos que decidiram não escolher nenhuma vaga e sobraram 161 vagas! Isto é claramente demonstrativo que por mais médicos que se formem em Portugal, neste momento, o sistema não é suficientemente atrativo para os incluir a todos. Portanto, o problema não é a dita “falta de médicos”, em termos absolutos, mas a incapacidade que a tutela tem tido de criar condições de atractabilidade que permitam atrair e reter os médicos nas instituições de saúde. Enquanto este problema não for encarado de forma séria e concreta, podem-se formar mais milhares de médicos, mas continuarão a “faltar” médicos onde, possivelmente, são mais necessários, como seja nas zonas mais periféricas do país.
Concorda com a criação da especialidade de urgência? E da de medicina paliativa? Porquê?
A criação da especialidade de Medicina de Urgência tem vindo a ser discutida há algum tempo, à semelhança do que acontece noutros países e penso vir a ser inevitável. Contudo, a questão que me parece mais pertinente é o timing certo e a forma como o fazer. Não me parece adequado fazê-lo à força, sem que haja um consenso alargado, que envolva os colegas de várias áreas envolvidas. Penso, também, que talvez seja mais sensato uma fase intermédia com a criação da competência em medicina de urgência. É uma oportunidade de ouro para repensar, em conjunto, o funcionamento de algumas áreas, como seja a própria medicina interna, medicina geral e familiar e outras. Promoverei um processo que permita uma discussão alargada com definição de objetivos e timings razoáveis e consensuais.
Em relação à medicina paliativa, aí parece-me que há consenso em relação à sua criação, pelo que penso estar na altura de o fazer.
Está de acordo com o princípio da morte medicamente assistida? E concorda com a legislação aprovada?
A minha posição em relação à eutanásia é bem conhecida: sou absolutamente contra a legalização da eutanásia em Portugal. Entendo que não é, seguramente, uma prioridade de saúde em Portugal. Acho muito mais importante o reforço para a criação, expansão e reforço das unidades de cuidados paliativos e continuados, do que estar a colocar recursos ao serviço de algo com que intrinsecamente discordo. É uma decisão baseada em critérios 100% políticos, que nada têm a ver com uma análise séria das necessidades em saúde em Portugal. Sou, isso sim, a favor da criação da especialidade de Medicina Paliativa em Portugal.
Naturalmente que as leis são para serem cumpridas, mas também tem de ser respeitada e precavida a objecção de consciência. Nesse sentido, defenderei sempre a objecção de consciência como um imperativo básico que deverá ser sempre respeitado.
Também procederei à nomeação duma personalidade médica para a comissão de acompanhamento, que corresponda à minha visão sobre este tema e de reconhecida competência.
Como se diferencia a sua proposta para a Ordem dos Médicos?
A minha candidatura a bastonário da Ordem dos Médicos visa o reforço do prestígio da classe médica, ao serviço da população portuguesa, num momento muito difícil para o país e o mundo. Trata-se duma eleição individual, pelo que a principal decisão que cada médico terá de tomar é de escolher a pessoa que acha que melhor está preparada para liderar a OM e, como tal, representar os médicos na defesa da Saúde em Portugal. A minha independência do poder político ou qualquer outro garante a independência necessária e fundamental para um bastonário, cuja ação nunca poderá ser vista como a agenda de qualquer organização, estando sempre ao serviço da medicina e da população.
Tenho a experiência acumulada ao longo de 38 anos de exercício médico, incluindo, a Direção do Departamento de Coração e Vasos do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, um dos maiores departamentos do SNS. Fui diretor da maior escola médica, a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, de 2015 a 2022, bem como tenho exercido vários cargos internacionais de grande prestígio, tais como o de presidente da World Heart Federation, até final de 2022, presidente da European Society of Cardiology, etc. Tendo sempre por fundo a minha Imparcialidade e independência, terei como missão essencial consolidar o prestígio da classe médica, através de uma Ordem de rigor e exigência, mais respeitada mais prestigiada e mais inclusiva. Faço-o com espírito de missão sem qualquer outro interesse.