A corrida pela liderança dos conservadores no Reino Unido ficou reduzida a dois candidatos, mas é quase certo que será Boris, o PM-in-waiting, a vencê-la. As apostas dão-no como vitorioso com probabilidades de 89,2% (Betfair), 85,7% (Bet 365) e valores semelhantes para os restantes; Ladbrokes é a mais favorável para Hunt, a 4 para 1 (20%). As sondagens apontam para uma vitória com cerca de 60% mas o resultado só é apurado a 22. Boris perdeu apoio recentemente por recusar-se a participar em debates – foi acusado de cobardia por Hunt – e a esclarecer a sua desavença com a namorada, mas isto não parece pôr a vitória em causa.

Boris prometeu que o Reino Unido deixará a União Europeia a 31 de outubro, “vai ou racha”. Ninguém sabe exatamente o que é o “racha”, mas para Boris, campeão de vendas de banha da cobra, vai desde riscar o backstop com a Irlanda a poupar 39 mil milhões de libras de pagamento à União, a sua alavanca para fazer pressão. Boris sustenta que o no-deal não é grave, pois o artigo 24º do GATT obriga a UE a continuar sem impor tarifas até um novo acordo comercial, o que é falso – como diz James Blitz no Financial Times, o que ele tem dito sobre o Brexit é ou ambíguo ou errado. Mas ele é assim e os britânicos já o conhecem, ele apenas está a ser igual a si próprio. E para muitos súbditos de Sua Majestade, um ataque a Boris é um ataque ao Brexit, o que o torna o principal ativo para resistir a Farage. Voar alto nas sondagens é voar alto no partido.

Boris vai então fazer um duplo bluff: primeiro com a União, dizendo que se o acordo obtido por May não for alterado, o Reino Unido sai sem acordo (que alterações está disposto a negociar nem ele sabe mas deve ser o conjunto vazio); depois com o Parlamento britânico, que se opõe a uma saída sem acordo, mas não terá coragem para mandar o seu governo abaixo, particularmente, se ele derrotar Hunt com boa vantagem. Os ímpetos dos deputados conservadores serão seguramente limitados pois mandar Boris para casa implica eleições e uma derrota expressiva dos Tories, entalados entre o Partido do Brexit, os Liberais, campeões do Remain, e o Labour a favor de qualquer coisa que Corbyn não sabe ainda o que é.

Assim, vamos ver Boris mudar-se para o n.º 10 de Downing Street, para felicidade dos seus atuais vizinhos, e uma saída do Reino Unido sem acordo. Isto a menos que a União ceda, o que também não é inimaginável: como pode a UE pôr-se de acordo na resposta ao bluff de Boris se mal se entende na escolha das cabeças das instituições? Para mais, quando a República da Irlanda é o refém, pois o que aconteceria é impor uma fronteira física entre as duas Irlandas ou entre a Irlanda e o resto da União – a Boris o que interessa é não deixar entrar emigrantes no Reino, e estes não se podem esconder nas malas; Boris vai, portanto, lavar as mãos deste problema, que não é com ele, e haverá na Europa quem faça de même.