Flexibilidade contratual Vs. segurança de um contrato

Entre muitas alterações que os anos de crise nos trouxeram, uma delas foi a flexibilidade dos contratos de utilização nos centros comerciais. O paradigma dos contratos de 6 anos em que as partes apenas se encontravam após longos períodos de tempo para tratarem das formalidades de celebrar um novo contrato terá provavelmente terminado. Estes últimos […]

Entre muitas alterações que os anos de crise nos trouxeram, uma delas foi a flexibilidade dos contratos de utilização nos centros comerciais. O paradigma dos contratos de 6 anos em que as partes apenas se encontravam após longos períodos de tempo para tratarem das formalidades de celebrar um novo contrato terá provavelmente terminado.
Estes últimos anos trouxeram-nos de facto muitas novidades a nível contratual: taxas de esforço garantidas, introdução de break-clauses anuais, descontos progressivos seguidos de break-clauses, limitação no aumento anual das remunerações mínimas e até nas despesas comuns (caps), mecanismos automáticos de ajuste em função da performance das vendas, consolidações anuais, atividades permitidas mais abrangentes, entre muitas outras. As consequências para os vários intervenientes do mercado foram muitas. Para os retalhistas as consequências de um contrato mais flexível são óbvias: menor risco e sobretudo maior poder negocial. Para os gestores de centros comerciais as consequências foram enormes uma vez que esta fle-xibilidade obrigou a um esforço muito maior de negociação quer com os retalhistas quer com os proprietários dos centros comerciais. A redação das cláusulas contratuais para espelhar esta flexibilidade tornou-se igualmente muito mais complexa. O esforço para gerir estes novos contratos aumentou também consideravelmente, obrigando as entidades gestoras a investirem na adaptação dos sistemas informáticos que suportam a gestão patrimonial dos contratos. Do lado da propriedade, esta maior flexibilidade veio colocar bastante pressão sobre os valores dos ativos e por esta via sobre os asset managers que neste período tentaram a todo o custo proteger o valor dos ativos sob sua gestão.
Mas, num cenário em que os contratos se tornam cada vez mais flexíveis, como se pode caracterizar um contrato “seguro”? Leia-se segurança como medida de risco e portanto no sentido da capacidade deste gerar um determinado cash-flow positivo no futuro, o qual capitalizado a uma determinada yield determina o valor dos ativos. Acontece que neste cenário de maior flexibilidade, a avaliação do risco de um contrato reside menos na sua letra e portanto nos seus termos (duração, remuneração, forma de atualização, etc.), mas mais em outros fatores, designadamente três: a qualidade intrínseca do ativo, a qualidade do retalhista e a qualidade de quem gere esse ativo. Poder-se-ia ainda acrescentar um quarto fator e este seria a qualidade do proprietário enquanto elemento que acrescenta valor à gestão e ao próprio ativo por via da sua capacidade em investir no mesmo. Ou seja, num bom ativo, com uma boa gestão e com um bom retalhista em que qualidade destes elementos é denominador comum, mesmo com um contrato muito flexível estão criadas as condições para que este contrato continue a gerar rendimento seguro no futuro.
Contudo, julgo que em alguns casos talvez se tenha deixado a flexibilidade ir longe demais, tornando o negócio imobiliário (da propriedade) demasiado interligado com o negócio do retalho (do lojista). Conceitos como a taxa de esforço garantida são perigosos no sentido em que mistura dois negócios que na sua base são muito diferentes. O negócio imobiliário fica assim sujeito aos riscos endógenos da própria gestão de um negócio de retalho e não apenas aos seus riscos exógenos (de mercado) que eram aqueles que provavelmente estiveram na base da criação do conceito das taxas de esforço garantidas.

Luis Teodoro
Diretor de Gestão de Ativos Imobiliários da CBRE

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