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Francisco Lacerda: Perda do contrato de concessão? “Nem de perto, nem de longe”

Francisco Lacerda está sob pressão de dois lados, por um lado do Estado e por outro dos acionistas privados com Manuel Champalimaud à cabeça, com 10,46% através da Gestmin.
21 Dezembro 2017, 07h50

Francisco Lacerda está sob pressão de dois lados, por um lado do Estado e por outro dos acionistas privados com Manuel Champalimaud à cabeça, com 10,46% através da Gestmin.

O contrato de concessão dos Correios pode vir a estar em risco de ser caçado pelo Governo, se considerar que esse contrato de concessão do serviço público não tem sido cumprido.

Perante a pressão dos partidos de esquerda, que no fundo querem nacionalizar os CTT, o Governo veio a público dizer que faz depender o cancelamento do contrato de concessão do serviço público postal da avaliação da ANACOM e do grupo de trabalho que foi criado.

Perante isto, Manuel Champalimaud veio alertar que o fim do contrato de  concessão vai aumentar despedimentos, segundo revela hoje o Público.

Até certo ponto a administração de Francisco Lacerda pode suspirar de alívio porque o Governo põe de parte uma renacionalização dos Correios de Portugal. No entanto, António Costa admite que a concessão de serviço público postal possa ser resgatada depois de a situação ser avaliada pelo grupo de trabalho e pela ANACOM.

O primeiro-ministro no Parlamento reiterou que o Governo criou um grupo de trabalho sobre esta matéria e lembrou que a ANACOM, responsável pela regulação do setor, já identificou uma situação de incumprimento de contrato e aplicou sanções aos CTT. Mas, Francisco Lacerda, numa entrevista à TVI 24, explicou que esse incumprimento tem a ver com um indicador que pesa 3% do índice geral de qualidade de serviço. “Mas nós acatámos essa decisão”, disse.

“Se nós não cumpríssemos as condições do serviço público, se não cumpríssemos de um modo grave isso poderia permitir um resgate da concessão, não estamos aí, nem de perto, nem de longe”, garantiu o presidente dos CTT ao canal de televisão na quarta-feira à noite.

Explicou que os CTT não recebem nada pelo contrato de concessão (que tem a duração até 2020). “O que há é o custo líquido do Serviço Universal”, que é pago pelos CTT.

Francisco Lacerda defende a manutenção do contrato de concessão, mas defende a evolução desse contrato de serviço público em função da “evolução dos tempos e da realidade”.

Mas a pressão sobre a gestão dos CTT não desarma.

Ainda antes do debate quinzenal, os deputados da comissão parlamentar de Trabalho e Segurança Social aprovaram por unanimidade a audição urgente dos representantes dos trabalhadores e da administração dos CTT.

Tudo na sequência da apresentação de um plano de reestruturação para o próximo triénio.

Os CTT apresentaram um plano de transformação operacional que consiste num corte de 25% da remuneração fixa do Presidente do Conselho de Administração e do CEO – presidente executivo e 15% de redução para os restantes membros executivos e não executivos do Conselho de Administração em 2018 (versus os níveis atuais).

Quanto poupa a empresa com o corte nos salários da administração?

Conhece-se os números de 2016 e é possível estimar o corte de custos com esta medida. Francisco de Lacerda passa a ganhar menos 128,4 mil euros, face a um total de 925 mil euros (fixa e variável) recebido em 2016. Os restantes administradores executivos recebem menos 235.641 euros em remuneração fixa e perdem toda a remuneração variável que em 2016 era de 1.373.128,00 euros. Isto é, com esta medida os CTT poupam 1,74 milhões de euros por ano.

Segundo o relatório e contas, Francisco Lacerda ganhou em 2016 em remuneração fixa: 513.734,40 euros e em remuneração variável 411.670,00 euros somando no total 925.404,40 euros. Outro administrador executivo André Gorjão (CFO que acaba de ser substituído) recebeu em termos fixos 409.234,42 euros e em termos variáveis 277.881,00 euros, somando ao todo 687.115,42 euros.

Dionízia Ferreira, também Administradora Executiva, recebeu em termos de remuneração fixa de 387.234,52 euros; variável de 262.859,00 euros e ao todo 650.093,52 euros.
O total da comissão executiva recebeu no ano passado em remuneração fixa 2.084.672,38 euros; em remuneração variável 1.373.128,00 euros  e ao todo 3.457.800,38 euros.
No que respeita à Remuneração Variável Anual (RVA) atribuível aos Administradores executivos, por referência ao seu desempenho em 2016, os CTT registaram a 31 de dezembro de 2016 um gasto com pessoal de 896.362,00 euros.
O total dos Administradores Não Executivos que não integram a Comissão de Auditoria  receberam 160.678,78 euros.

“Não haverá lugar a remuneração variável para a Comissão Executiva referente a 2018 (nem em 2017)”, diz a apresentação dos CTT.

No total os CTT tem hoje 13 administradores, dos quais cinco executivos.

Nesse plano é imposta ainda a “limitação dos aumentos salariais não obrigatórios para os colaboradores em 2018”, diz o documento.

Outra das medidas é a forte redução da remuneração variável dos colaboradores referente a 2017.

O plano prevê um programa de rescisões nos próximos 3 anos (até 2020) que deverá atingir 800 trabalhadores, o encerramento de lojas com pouca procura e o corte de salários na administração.

O objetivo deste plano é gerar poupanças de 45 milhões de euros por ano a partir de 2020.

A grande aposta para o futuro é no Expresso & Encomendas (comércio tradicional) e no Banco CTT para fazer face à quebra do correio tradicional.

Sobre o Banco CTT disse que “está a correr muito bem”, “o numero de contas e clientes está a crescer. “Apresentámos 190 mil contas em um ano e meio, temos 240 mil clientes e mais de 500 milhões de euros em depósitos”.

A companhia diz que o volume do correio endereçado tem estado numa diminuição continua desde 2001, sendo hoje cerca de 50% inferior a esse ano hoje é de 0,7 mil milhões de correio endereçado. E que assiste-se a uma aceleração da queda nos últimos trimestres com uma queda de 6% nos primeiros nove meses de 2017, o que compara com quedas médias de 4% entre 2014 e 2016.

Nas cartas a empresa de correios é o líder e incumbente e detém a concessão do Estado, mas há cerca de um ano, o Governo  anunciou que ia deixar maioritariamente de enviar cartas aos cidadãos, passando o email a ser o meio de comunicação utilizado.

Os CTT dizem no entanto que há um forte potencial de crescimento do mercado do comércio eletrónico, que continua com uma penetração reduzida em Portugal e Espanha.

Porque é que só apresentaram o Plano de Reestruturação do negócio este ano e não antes? Francisco Lacerda justificou com o aceleramento da quebra do correio que está a verificar-se este ano. “Nós, desde 2001 que estamos a metade”. O ritmo dessa queda não foi sempre o mesmo e segundo Lacerda, acelerou este ano, “nos nove meses o correio está a cair 6,1% e no segundo e terceiro trimestre esteve a cair cerca de 7% face ao trimestre homólogo do ano anterior”, explicou à TVI 24 no programa Eco 24.

A quebra no correio aumentou a pressão sobre as receitas e isso levou a apresentar este plano.

Os lucros dos CTT caíram até setembro 57% para 19,5 milhões de euros. Mas acima de tudo, a empresa liderada por Francisco Lacerda anunciou que vai propor um corte dos dividendos que serão distribuídos aos acionistas referente ao actual exercício. O corte é de 11,6%, passando de 48 para 38 cêntimos, com a empresa a justificar a decisão com o desempenho inferior ao esperado dos resultados operacionais.

Programa de rescisões cria ebulição

Francisco Lacerda disse ontem à TVI 24 que este plano é “a reinvenção da atividade dos CTT, que como todas as empresas do mesmo setor noutras partes do mundo, estão numa transformação profunda que é provocada pela alteração das preferências dos consumidores”. O que temos visto é uma redução forte no volume de correio e um aumento das encomendas e das encomendas ligadas ao comércio electrónico. “Esta mudança não se conseguirá nunca fazer de uma forma suave”, disse o presidente dos CTT.

“Quando há uma redução do volume dos correios o preço sobe” dentro de determinadas balizas (a maior parte delas regulatórias), diz Francisco Lacerda, que adianta que “os custos também têm de ser olhados e principalmente o que é preciso ver é se a infraestrutura principal que temos é a mais adequada” ao novo modelo de negócio dos CTT, onde cada vez se distribuem mais encomendas e menos cartas. “70% das encomendas são distribuídas pelos CTT. Vamos desenhar uma infraestrutura diferente adaptada à realidade de hoje e aquela que antecipamos para os próximos dois anos, e isso implica menos 800 pessoas”, disse. Estas saídas serão trabalhadores a contrato a prazo que não serão renovados, algumas rescisões por mútuo acordo, e outras saídas naturais ao longo dos três anos, explicou Lacerda. “Não estamos a falar de um despedimento, ou um despedimento colectivo”, garantiu.

“Temos um processo em curso para os serviços centrais,  de 200 pessoas das quais 140 pessoas já estão concretizadas”, disse o CEO dos CTT.

“Os CTT, no final de 2013, que é a altura da privatização, tinham 12.300/12.400 trabalhadores e têm hoje 12.400 trabalhadores”, esclarece Francisco Lacerda na entrevista ao canal de televisão.

“Se ficássemos apenas no negócio das cartas, todos sabíamos o que é que ia acontecer. Não ia acabar bem. Sendo uma empresa privada não ia acabar bem no mundo privado, e se fosse uma empresa pública não ia acabar bem para o Orçamento de Estado”, disse Francisco Lacerda.

Ontem, em resposta à coordenadora do Bloco de Esquerda, o primeiro-ministro garantiu que o Executivo não recebeu “até agora qualquer proposta ou pedido de reestruturação” dos CTT. Perante as câmaras Francisco Lacerda disse que o que pretende fazer é garantir o cumprimento do serviço universal, garantir o cumprimento dos critérios de qualidade e outros do serviço universal, “mas pensamos que a infraestrutura pode funcionar com menos pessoas, porque haverá menos volumes”.

“Os CTT não têm passivo bancário, só têm dinheiro em caixa, que são os fundos disponíveis que estamos a usar para investir e garantir o futuro da empresa”, explicou o CEO dos Correios para explicar como vai financiar o plano de reestruturação anunciado esta semana. Uma parte será distribuída em dividendos, outra será investida, e outra utilizada para suportar o programa de reestruturação.

O plano de reestruturação fala ainda na redução de gastos (custos) não relacionados com as alavancas de crescimento (Encomendas & Expresso e Banco CTT), tais como TI (tecnologias de informação), rendas, utilities, comunicações e frota. Suportada pela renegociação de contratos e racionalização da utilização de serviços/instalações.

Mas o Caixa BI disse na sua análise que “nesta altura acreditamos que o mercado receberia melhor medidas para melhorar as receitas do que cortes de custos”, refere. “Salientamos também que este plano será difícil de executar e vai enfrentar pressões políticas severas e ainda contestação significativa dos sindicatos”.

O Plano tem o objetivo de redução este ano de cerca de 200 colaboradores equivalentes a tempo inteiro (ETIs), dos quais cerca de 140 ETIs já aceitaram nas últimas semanas, diz a empresa.

Este plano de reestruturação, que inclui a redução das remunerações da administração, estima “uma potencial redução de cerca de 800 ETI [equivalente a tempo inteiro] nas operações ao longo de três anos, em consequência da queda do tráfego do correio, de um total de 6.700 efetivos”, dos quais 6.200 efetivos e perto de 500 contratados a termo, referem os CTT em comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).

O Caixa BI adianta que, no entanto, tendo em conta a cotação atual, o elevado free float do título e o potencial desenvolvimento autónomo de alguns dos segmentos, nomeadamente do Banco CTT e do Expresso & Encomendas, é justo assumir (ou pelo menos não excluir “a probabilidade acrescida de uma alteração significativa na estrutura acionista”).

 Os mais críticos apontam culpas à gestão de Francisco Lacerda, dizendo que os CTT acordaram tarde para a área das encomendas que está entregue a grandes operadores internacionais de grande dimensão e alcance internacional (ex: Amazon).
(atualizada)
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