Contrariando as afirmações mais comuns sobre o que se passa em Angola, Francisco Viana afirma que é agora que vai começar o “el dorado” em Angola. O gestor é presidente da Associação Empresarial de Luanda e presidente da Confederação Empresarial dos PALOP. Entre os projetos pessoais destacam-se o colocar da Parkgest em Luanda, um projeto de 1500 milhões de dólares, distribuído por 100 hectares e que contempla o maior World Trade Center na horizontal em todo o mundo.
O “el dorado” de Angola é uma realidade. A diferença para os tempos mais recentes é que os projetos terão de ser montados com os pés bem assentes no chão e sem o dinheiro do petróleo como tábua de salvação. Quem o afirma é um dos gestores de topo angolanos, Francisco Viana, presidente de uma das associações empresariais mais dinâmicas do país, a Associação Empresarial de Luanda, e ainda dirigente dos PALOP.
Como tem evoluído a Associação Empresarial de Luanda (AEL)?
A atividade da associação empresarial remonta aos primórdios de 1995, quando fundámos o Fórum de Empresários da Língua Portuguesa. Foi fundado em Lisboa por altura da preparação da criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, e do congresso da Lusofonia, onde participou o professor Cavaco Silva, o Dr. Durão Barroso, o presidente Mário Soares e o embaixador Aparecido de Oliveira. Todas essas personalidades de instituições políticas contribuíram para a criação da CPLP. A nível do setor económico e empresarial demos o nosso contributo e fundámos ainda antes da CPLP, o Fórum de Empresários de Língua Portuguesa. Em Angola continuámos a desenvolver atividades na área empresarial e associativa.
As atividades associativas começaram primeiro por uma extensão das atividades do Fórum de Empresários de Língua Portuguesa em Angola e depois, mais recentemente, decidimos avançar para a criação de uma organização autónoma em Angola. Em 2010, ainda foi o Fórum de Empresários de Língua Portuguesa que organizou o Grande Fórum, na Expo de Xangai do Dia de Angola, mas sentiu-se a necessidade de tratar o assunto de Angola à parte, com o tecido empresarial angolano. E, foi assim que nasceu primeiro a Associação Industrial de Viana, porque nós nos situamos em Viana, que é o pulmão do tecido económico de Angola, e após um ano de atividade fomos incentivados a alargar o nosso âmbito de trabalho e passar de associação empresarial do município de Viana, para associação empresarial da província de Luanda. Significa que passámos de uma população de cerca de dois milhões para uma que está quase a atingir os dez milhões.
E o próximo passo…
Consolidar o que temos. Temos de consolidar Luanda, porque dentro de Luanda está praticamente quase metade da população de Angola. Diria 40%.
O que temos neste momento é um grande desafio pela frente e com certeza que iremos colaborar com todas as associações empresariais de Angola e de fora de Angola, mas precisamos de nos focalizar e de criar condições para que todos, a partir da província de Luanda desenvolver os seus negócios em Angola.
E em Portugal?
A partir de Portugal vamos, em setembro, organizar o grande encontro empresarial de CEO África-Europa.
Nessa altura já estará criada aqui a associação empresarial, na Europa ou em Portugal?
Sim, já.
Como se vai chamar?
Por enquanto estamos a aguardar por documentos legais e só depois é que vamos avançar com o nome. A nossa vocação passará por aproximar cada vez mais a Europa de África. E visto que Portugal é o país que está mais próximo de África, torna-se uma plataforma ideal para aproximar a África da Europa.
O projeto para Lisboa é para avançar em março?
Já arrancámos, temos aqui uma equipa de trabalho…
Mas estão a trabalhar com base na Associação Empresarial de Luanda…
Exatamente. Temos aqui delegados, e neste caso o delegado da Associação Empresarial de Luanda é o Dr. João Serafim, que tem feito um belíssimo trabalho a apoiar a internacionalização das empresas, quer as empresas europeias que pretendam instalar-se em África, no caso concreto em Luanda, quer empresários angolanos que queiram internacionalizar-se para a Europa a partir de Portugal.
De que forma é que está a apoiar primeiro os empresários angolanos e os portugueses?
Para os empresários angolanos o que importa, para já, é fluxo de informações sobre algumas oportunidades de compras de empresas em Portugal. A nível de fusões e aquisições já se está a trabalhar. Mas o fluxo que nos parece ser o mais produtivo a curto prazo será aquele que levará empresas europeias, com destaque para as portuguesas, a internacionalizarem para Angola. Enquanto aqui está tudo mais ou menos feito, lá está quase tudo por fazer. As oportunidades de negócio e a concorrência são muito menores e, por isso, Angola é um destino que recomendamos ativamente.
Quais são os setores em falta em Angola?
Precisa de todos os setores tidos como prioritários pelo próprio governo angolano, caso da saúde, da educação, da segurança alimentar, da formação, do agronegócio ou da construção. Neste segmento temos um programa do governo para fazer um milhão de casas e ainda estamos muito longe do objetivo.
E agricultura?
Quando dizemos segurança alimentar, que é um grande projeto do governo, envolve todo o agronegócio e também as infraestruturas necessárias para tal. Estamos a falar em estradas, em energia e estamos a falar em distribuição de água, irrigação, fitossanitários, sementes e formação.
A crise cambial por que Angola está a passar e que deriva dos preços do petróleo e do impacto no orçamento, é uma oportunidade para o empresariado angolano ver que precisa de diversificar a economia?
Eu diria a todos os pessimistas que agora é que começou o “el dorado”, agora é que realmente vai começar o el dourado de Angola com os pés bem assentes no chão, sem o dinheiro do petróleo como tábua de salvação, mas com uma determinação em avançar para a diversificação da economia. Queremos o reforço de todo o setor produtivo, baseado e tendo como estratégia primeira a substituição importações. Verá que daqui a 10 anos, exatamente por causa desta crise, os empresários terão sido obrigados a apostar na produção e não na economia de puro rendimento ou especulação. Daqui por dez anos terá maçãs “made in Angola”, rosas “made in Angola”, e muita coisa que vai ser exportada inclusivamente para Portugal e para o resto da Europa. Diria que esta crise, se a soubermos aproveitar, é uma oportunidade para acordar as mentes e para mudar as mentalidades.
Agora, o que se aplica aos empresários angolanos também se aplica aos empresários portugueses, ou seja, Angola em determinados setores é uma grande oportunidade para os empresários portugueses e europeus, para saírem de um continente que está estagnado, para irem para uma região que está a crescer.
Portugal leva vantagens?
Claro que o português tem grandes habilidades, os gestores têm uma excelente experiência no agronegócio, quer nas pescas, quer na transformação dos produtos alimentares. Têm experiências exatamente nesses negócios que nós precisamos de diversificar, toda a fileira do couro, dos curtumes, dos calçados, toda a fileira do algodão, dos têxteis e da moda e do vidro, a par das ciências, dos computadores e das tecnologias, enfim, há uma imensidão de setores em que Portugal é bom e que pode ser ainda melhor e maior se se aliar aos angolanos e desenvolver um conjunto de negócios em Angola.
Sendo prático. Havendo empresários europeus, nomeadamente portugueses, com interesse em ir para Angola, o que é que a AEL pode fazer por eles? Vai-lhes indicar o local para se instalarem, encontrar um parceiro, se houver necessidade de financiamentos consegue linhas de financiamento?
Estamos neste momento com um gabinete de apoio ao investidor que já está em funcionamento, tem um economista experiente, o Dr. Vítor Cardoso, e toda uma equipa de trabalho que está em condições de desenvolver estudos de internacionalização, estudos de mercado, a avançar com ofertas em termos de instalação. Temos vários parques industriais e empresariais onde podemos instalar os nossos investidores, temos também a figura de parceiro certificado, porque arranjar parceiro é como arranjar uma noiva (ou talvez mais difícil) e nem sempre as empresas têm a mesma mentalidade. Estamos neste momento a identificar os parceiros, e a lançar programas de formação para mudança de mentalidades, de formação dos CEO para que possam ter uma mentalidade e uma atitude mais competitiva. E são esses os parceiros que vamos apresentar às empresas portuguesas.
Estamos também a trabalhar com o banco Millennium, que tem um grande historial de apoio a projetos de investimento, e que neste momento é o operador número um do programa Angola Investe. Operacionalizámos a devida metodologia que começa com a identificação do projeto, desde a elaboração do dossier da candidatura, desde fazer chegar esse dossier ao banco e depois disso fazer o “follow up” com a banca e depois de o nosso associado ter acesso ao financiamento, ainda fazemos o acompanhamento, numa filosofia de coaching ou de mentoring, para que os resultados sejam mais assertivos. Também ajudamos no recrutamento de recursos. Poderá perguntar como uma associação consegue fazer isto tudo sozinha, e respondemos que não estamos a fazer sozinhos. Temos os melhores advogados, que são membros da nossa associação, temos os melhores economistas, temos os melhores contabilistas, as melhores empresas de recursos humanos, e todos são nossos associados. Somos nós que distribuímos o trabalho de maneira a assegurar que havendo algum descontentamento poderá a empresa dirigir-se a nós para o resolvermos.
É correto afirmar-se que a Associação Empresarial de Luanda quer levar as melhores empresas portuguesas para Angola?
Eu diria que se considerarmos que as melhores não são necessariamente as maiores, digamos que sim. Queremos levar as melhores, mas temos vários critérios. A empresa pode ser a melhor mas se não tiver a melhor atitude, pode ser que não se adapte bem a Angola. Para singrar em Angola é preciso também aquela vontade de se aliar aos angolanos. Não se pode pensar que se consegue chegar a Angola sem qualquer tipo de relação, nem parcerias com empresas angolanas, e conquistar sozinho o mercado. Essas empresas normalmente podem encontrar anticorpos, tal qual como se viesse uma empresa estrangeira para Portugal, e quisesse fazer tudo sozinha, não beneficiando nenhum português. Esse espírito de parceria, de interesse mútuo, a questão da função social da empresa, saber que se está a entrar num país em vias de desenvolvimento, e que há que formar os quadros locais, são pontos nucleares. Uma empresa vai para Angola mas ao fim de alguns anos deve orgulhar-se de ter formado quadros angolanos e de ter quadros angolanos em lugares de chefia. Tudo isto fará com que haja uma filosofia de sucesso.
Ainda esta semana o senhor embaixador de Angola em Portugal dizia que o problema cambial em Angola é algo que ficará resolvido nos próximos três meses. É sua convicção que este tema da transferência de fundos é algo passageiro?
Angola é um país que tem liquidez. Entendemos que é um problema conjuntural e não estrutural. O dólar disparou, chegou a atingir os 180 kwanzas, eu próprio tive de parar as vendas e tentar perceber o que estava a acontecer. Ao longo da última semana ele foi descendo, já está nos 135 kwz por dólar e acredito que dentro de 15 dias a 1 mês estará com uma diferença aceitável. Estava a 110, 120, se ficar nos 130 também não morre ninguém. O Governo está a fazer um grande esforço nesse sentido, já injetou muita divisa no mercado, nomeou um excelente governador no Banco de Angola, o Dr. José Pedro Morais, um grande amigo do setor privado. Acredito que temos razões para estarmos otimistas.
De que forma é que a Associação se vai relacionar com a Confederação dos Países de Expressão Portuguesa?
Também sou presidente da Confederação Empresarial dos PALOP e da Associação Empresarial de Luanda. As associações dos países de expressão portuguesa (seis) são membros dessa nossa Confederação, a qual foi criada exatamente porque sentíamos que a nível dos povos africanos tínhamos algumas ambições comuns que advêm da independência tardia, tínhamos também problemas comuns que advêm da mesma razão e de um sistema inicial das nossas políticas económicas centralizadas.
Logos depois das independências os nossos países não optaram pela economia de mercado e só uns dez ou 15 anos mais tarde é que acordaram para essa realidade. Por isso temos todo um espaço para retomar e na altura a CPLP em si, portanto os países de língua portuguesa, que inclui ainda o Brasil, Timor e Portugal, não estava a ser suficiente para dar uma outra dinâmica a estas nossas necessidades.
Enquanto Portugal tem já classe empresarial consolidada, os nossos países tem uma classe empresarial insipiente, pequenos e micro negócios que falta formar, que falta capitalizar, e por isso estávamos – e continuamos – com esse problema. Enquanto que as associações portuguesas receberam verbas da União Europeia para criarem as suas sedes, para capacitar as suas próprias associações, como a Nerlei e outros, nós ainda não temos esse programa de capacitação das nossas associações empresariais. Considerámos que se nos uníssemos seria mais fácil resolver esses problemas que nos são comuns.
E, dando resposta à criação do Fórum PALOP – lançado em boa hora pelos presidentes da República, de chefes de Estado, e primeiros-ministros dos países africanos de língua portuguesa – fundámos a nossa confederação. O objetivo é sermos um braço direito e esquerdo, no fundo um parceiro privilegiado, desses nossos países para o desenvolvimento económico e social.
É esta confederação que vai organizar o grande evento de setembro próximo?
O evento de setembro será organizado por esta confederação em parceria com outras organizações europeias, visto que é um grande encontro que se pretende Europa/África. Não faria sentido estarmos sozinhos com o protagonismo e com a reflexão do programa. Já estamos a trabalhar com os congéneres europeus.
Onde se realizará o evento de setembro?
Terá início no Porto, dia 10, depois em Lisboa dia 13, onde acontecerá o grande encontro dos empresários das diásporas da Lusofonia, e culminará no dia 17 e Milão visto que nessa altura, no pavilhão de Angola, a Expo Milão, comemorar-se-á o “Dia de Angola”. Haverá uma grande delegação empresarial que virá à Europa e a ideia é aproveitar e juntar a delegação de Angola a outras delegações africanas e fazer tudo na Europa. Passamos por Portugal porque queremos sinalizar que estamos perante o parceiro estratégico dos povos africanos na Europa.
Falamos dos PALOP. O tema CPLP é completamente diferente?
Não. Se entendermos que a CPLP tem nove membros e que destes, seis são PALOP, nunca poderemos dizer que PALOP são diferentes de CPLP. Antes pelo contrário. Deveremos dizer que os PALOP são um grupo decisivo para a construção e para o engrandecimento da CPLP. Temos uma grande cordialidade com todos os elementos da CPLP de Portugal, do Brasil e de Timor. Mantemos relações, até de parceria. Aliás, estamos em Portugal a visitar um conjunto de associações, caso da Associação Comercial e Industrial Portuense, os empresários de Famalicão, a Aerlis, a própria AIP e a CIP e outras. São associações com quem temos vindo a trabalhar desde há 20 anos. Só por aí já lhe posso dar a ideia da ligação ao tecido empresarial português.
Vítor Norinha