As eleições legislativas têm o mérito de sugerir e escrutinar políticas económicas e a sua operacionalidade. Uma das propostas mais debatidas da campanha recente, ainda que pouco original, foi substituir os atuais escalões de impostos sobre o rendimento por uma taxa única (flat tax).

A proposta repesca do baú dos anos de 1980 a ideia dos economistas supply-side de que a redução de impostos conduz ao aumento da eficiência económica e assim da produção e do rendimento. A refutação empírica destas ideias é extensa, mas esta parte não veio a debate.

É certo que a visão consensual, da esquerda à direita, de que os impostos sobre o rendimento dos portugueses são excessivos, abre espaço para defender a sua redução. A flat tax, no entanto, reduziria sobretudo os impostos que incidem sobre as classes de maiores rendimentos, que no regime atual pagam taxas progressivamente maiores com o rendimento.

Não se explicando como é possível reduzir impostos e manter um orçamento equilibrado – sugere-se ao mesmo tempo o financiamento público da oferta privada em domínios como a educação e a saúde – a medida põe em causa qualquer solidariedade económica e social, negando à política fiscal o seu papel de redução da desigualdade, ampliada com a crise pandémica.

Recorde-se que as experiências mais próximas de taxas flat ocorreram nos países do Leste Europeu onde, um passado de gestão centralizada os tornou sociedades menos desiguais, podendo estas taxas ser menos disruptivas.

No extremo oposto situam-se as economias do norte europeu, reconhecidas pelos seus níveis de vida, o sucesso do seu Estado Providência e o valor elevado das suas receitas fiscais em relação ao PIB. Em 2020, em valores percentuais, os impostos correspondiam na Dinamarca, Suécia e Finlândia a respetivamente 46,5, 42,6 e 41,9% do PIB, em contraste com os 34,8% portugueses (OCDE).

As taxas de imposto são progressivas nestas economias, também elas menos desiguais do que a média europeia (vide, por exemplo, os índices de Gini para o rendimento disponível publicados pelo Banco Mundial).

E, – pasme-se! – nas comparações internacionais, as populações destes países revelam-se as mais felizes. O Relatório Mundial da Felicidade para 2021, coloca a Finlândia em primeiro lugar nesta dimensão, a Dinamarca e a Suécia surgem entre os dez primeiros classificados e Portugal em 58º lugar. O retorno social que o Estado garante à população como contrapartida pelos impostos cobrados é referida no relatório como uma vertente decisiva para estes resultados.

Defender taxas de imposto iguais para todos como solução para os problemas da economia portuguesa foi só mais uma ideia populista de mais uma campanha eleitoral. Não é uma medida justa do ponto de vista social, não é exequível do ponto de vista do equilíbrio orçamental e não tem condições para assegurar o crescimento económico. Pior, serve para desviar as atenções daquelas que devem ser as principais discussões em torno desta matéria: a evasão fiscal que sobrecarrega quem não pode fugir a declarar rendimentos; e, a eficiência das políticas públicas que são a contrapartida destes impostos.

O bem-estar e a felicidade dos mais desenvolvidos são o resultado de um projeto social coletivo. Não se alcançam a chorar lágrimas de crocodilo por soluções insustentáveis.