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Geoff Pearson: “Membros de claques condenados por atos de violência devem ser banidos dos estádios”

Professor de Direito Penal na Universidade de Manchester, especializado em “hooliganismo”, Pearson diz que o caso de Bruno de Carvalho é inédito no futebol mundial, mas não as eventuais acusações de terrorismo. E defende o banimento de adeptos violentos.
13 Novembro 2018, 08h08

Desde há décadas que Geoff Pearson, professor de Direito Penal na Universidade de Manchester, estuda e investiga sobre o fenómeno da violência no futebol europeu, com especial incidência no “hooliganismo”. Publicou vários trabalhos sobre a etnografia dos adeptos ingleses de futebol e o impacto da legislação e estratégias policiais implementadas para erradicar o “hooliganismo”, no Reino Unido e na Europa em geral, entre outros temas relacionados. Apesar de toda essa experiência, Pearson diz que nunca se deparou com um caso similar ao de Bruno de Carvalho, isto é, um ex-presidente de um clube de futebol detido por suspeitas de envolvimento no ataque a jogadores do próprio clube, em pleno centro de treinos, por membros da claque oficial.

Em declarações ao Jornal Económico, Pearson ressalva, porém, que as eventuais acusações de terrorismo não serão inéditas no futebol europeu. “É uma situação rara, mas adeptos envolvidos em violência após a morte de Gabriele Sandri, em Roma, foram acusados de crimes de terrorismo. Em França, também, alguma legislação sobre terrorismo inclui especificamente disposições para serem utilizadas contra aqueles que participam em violência relacionada com o futebol”, afirma.

Em 2007, no decurso de uma rixa entre adeptos da Lazio de Roma e da Juventus de Turim numa estação de serviço perto de Arezzo, Toscânia, a polícia disparou acidentalmente sobre um adepto da Lazio, Gabriele Sandri, com 25 anos de idade, matando-o. Sandri estava no interior de um carro e não participou na rixa. Seguiu-se uma onda de violência contra a polícia, em revolta pela morte de Sandri, incluindo ataques contra esquadras e motins nas ruas de Roma. Quatro adeptos foram detidos e acusados de crimes de terrorismo.

 

“Abordagem multifacetada”

Na perspetiva de Pearson, para prevenir e combater a violência no futebol, “não é necessário” proibir as claques organizadas. “Mas os membros dessas claques que forem condenados por atos de violência devem ser banidos dos estádios”, sublinha. Pearson defende “uma abordagem multifacetada” ao problema, introduzindo mudanças na legislação, no policiamento e nas infra-estruturas dos estádios. “No Reino Unido, a violência relacionada com o futebol foi drasticamente reduzida através de alterações nas leis. Por exemplo, os adeptos envolvidos em violência passaram a ser banidos não apenas dos estádios, proibidos de assistir aos jogos, mas também de se aproximarem da área circundante ao estádio e dos centros das cidades em dias de jogos”, destaca.

“Outras medidas importantes foram a imposição de mudanças nas infra-estruturas dos estádios, tornando-os mais seguros, e a instalação de câmaras de videovigilância, permitindo assim identificar os responsáveis por atos de violência e a subsequente aplicação de banimentos”, prossegue Pearson. “Também foram alteradas as estratégias policiais que passaram a focar-se na identificação e segregação de adeptos que procuram instigar ou participar em atos de violência. Nesse âmbito, recordo-me que a Polícia de Segurança Pública de Portugal também introduziu uma série de mudanças na sua estratégia, por causa do Euro’2004, na altura com grande sucesso”, enaltece.

Quais são as principais causas do “hooliganismo”, o que motiva a atração dessas pessoas (quase exclusivamente homens) pela violência? “As investigações sobre grupos organizados que praticam atos de violência sugerem um conjunto de motivos, desde logo a identidade e um sentimento de pertença a esses grupos, além da excitação inerente às rixas com grupos ou claques rivais. Acresce a reputação social, nos seus bairros ou comunidades, por pertencerem a esses grupos. E os homens estão mais envolvidos porque são fisicamente mais capazes para as rixas, mas também porque são mais facilmente aceites nos grupos. Por exemplo, o código dos ‘ultras’ italianos proíbe expressamente a filiação de mulheres”, responde Pearson.

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