O Presidente da República deixou um aviso claro a António Costa durante a tomada de posse do novo Governo, no dia 30 de março. Com uma maioria absoluta, a governação deve durar todo o período dos quatro anos e meio e nem pensar em sair antes de findo o mandato.
Esta posição de Marcelo Rebelo de Sousa confirma que independentemente de o país ter um governo de maioria absoluta, Marcelo não será uma figura de retórica e caso exista a tentação de responder ao desafio da presidência da Comissão Europeia, Costa sabe, de antemão, que o Governo cairá e haverá eleições antecipadas.
Mas Marcelo fez mais. Deixou claro que este é um período sem desculpas para reformas necessárias ao regresso ao crescimento, numa altura em que apenas alguns países da antiga “cortina de ferro” apresentam um PIB médio inferior ao português. O país tem perdido, sistematicamente, posições a nível da capacidade de gerar riqueza na Europa.
Independentemente do contexto geopolítico, Portugal saiu de uma eleição com maioria expressiva para o PS de António Costa, a par de uma oposição que está moribunda e que no caso do maior partido da oposição, o PSD, vive lutas intestinas. Costa começou, por isso, a pensar no futuro e na luta interna, e colocou todos os “ases” no Governo, Fernando Medina, Pedro Nuno Santos, Ana Catarina Mendes e Mariana Vieira da Silva, dando prioridade a esta última.
Na análise de uma eventual saída de Costa para Bruxelas, e que faz parte dos cenários do inner circle do próprio, e que o Presidente da República tem dado a devida importância, o tema está nos equilíbrios em Bruxelas. A saída até pode ser mais cedo do que o esperado, e daí Marcelo querer evitar a hibernação em que o país ficou depois de Durão Barroso ter designado Santana Lopes para lhe suceder e deste, seis meses depois, ter acabado por cair; são então convocadas eleições legislativas e o PS regressa ao poder.
António Costa quer, no entanto, fazer algo diferente. Antes de mais, a noção de quem está próximo do poder diz que Costa se considera um primus inter pares do grupo socialista europeu e da esquerda europeia, até melhor do que o espanhol Sánchez. E o seu trabalho denota que estará a tentar ganhar a família dentro do referido espetro político, de forma a ser ele o candidato à Comissão Europeia.
Isso significaria que em Portugal teria de haver uma solução e o Presidente já deixou claro que não haverá uma solução em caso de saída antecipada, sem eleições. Ora, no PS, o número dois do partido em termos informais é Pedro Nuno Santos, mas o número dois em termos formais é Ana Catarina Mendes. Sabemos, contudo, que em termos emocionais, Costa tem uma dívida para com Medina, o novo ministro das Finanças, e este é, seguramente, o preferido à sucessão.
Todas estas guerras intestinas vão jogar com a realidade nua e crua, i.e. o impacto da guerra na subida de preços, na subida dos juros que afetam famílias e empregos, e no próprio Plano de Recuperação e Resiliência, que poderá sofrer ajustamentos perante a necessidade de Bruxelas canalizar verbas para a recuperação da Ucrânia. E tudo acontece com um Governo que não é de combate para o exterior, mas de combate interno. Em português vernáculo é caso para se dizer que estamos “condenados!”