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Guerra trava aumento do PIB acima do previsto

Portugal (e o mundo) foi surpreendido pelo fator de incerteza à economia global. Efeitos do conflito militar da Ucrânia poderão conduzir a um menor crescimento económico da zona euro.
6 Março 2022, 08h00

Na semana passada, o economista-chefe do Banco Central Europeu (BCE), Philip Lane, deixou o aviso: o conflito na Ucrânia pode reduzir o crescimento do PIB da zona do euro entre 0,3% e 0,4% neste ano. Este foi o “cenário intermédio” apresentado por Lane em reunião do Conselho do BCE, em Paris a 24 de fevereiro, horas depois de a Rússia ter invadido a Ucrânia. Já no cenário mais severo, no limite, essa queda pode ir até 1% do PIB da zona euro que, antes do conflito, esperava crescer 4% este ano. Já para o vice-presidente da Comissão Europeia, Valdis Dombrovskis, “é demasiado cedo para estimar impactos quantitativos”, mas sinalizou a 25 de fevereiro que “algumas avaliações preliminares apontam para a possibilidade de poder pesar no crescimento”.

Os impactos do conflito entre a Rússia e Ucrânia no crescimento económico – que em Portugal economistas fazem depender da extensão e duração desta guerra – surgem depois do ministro das Finanças, João Leão, ter sinalizado no final do ano passado, que a recuperação económica em Portugal “tem sido tão forte” (em 2021, o PIB cresceu 4,9%, contra os 4,8% previstos) que o PIB poderá crescer em 2022 acima das próprias expectativas do Governo, de 5,5%. E em que a OCDE colocou Portugal a crescer 5,8% no próximo ano, acima das expectativas nacionais.

Na altura, e face à crise pandémica, João Leão ressalvou, no entanto, que se vive “um contexto de incerteza”, pelo que há que “ter a humildade de perceber que a pandemia pode surpreender” e “levar a impactos mais significativos sobretudo na Europa e que acabem por afetar Portugal”. Dois meses após esta ressalva do governante, Portugal e o mundo foram surpreendidos pelo fator de incerteza à economia global: um conflito militar de grandes dimensões que tem como efeitos esperados o aumento da inflação – que já estava a ser pressionada pelo aumento dos custos energéticos e logísticos-, abrandamento do consumo e investimento e instabilidade dos mercados financeiros.

Não é de estranhar por isso que o Governador do Banco de Portugal tenha admitido no início desta semana que a economia da Zona Euro poderá entrar numa situação de estagnação e de altas taxas de inflação, na sequência do ataque militar da Rússia na Ucrânia. Segundo Mário Centeno, não se pode pôr de lado o risco de estagflação na zona euro, onde a economia estagnaria e observaria, ao mesmo tempo, altas taxas de inflação, que em fevereiro registou, em Portugal, a mais alta taxa desde outubro de 2011 ao atingir os 4,2%, segundo o INE e os 4,4%, de acordo com os dados do Eurostat divulgados esta semana para a Zona Euro, cujo bloco atingiu os 5,8%.

Em entrevista à agência Bloomberg, divulgada a 28 de fevereiro, Centeno afirmou: “estou convencido de que prevalecerá a tração de crescimento que a economia vinha seguindo”, acrescentando que ainda assim “um cenário próximo da estagflação não está fora das possibilidades que podemos enfrentar. Então, precisamos de ajustar nossas políticas a isso”.

BCE sob pressão
O governador do BdP e membro do conselho de governadores do Banco Central Europeu (BCE), em entrevista à agência Bloomberg defendeu ser favorável à “normalização” da política monetária que vários responsáveis do BCE já sinalizaram nas últimas semanas, mas reconhece que o impacto da guerra na Ucrânia cria enorme incerteza em relação às próximas decisões do banco central, que se reúne já no próximo dia 10 de março.

Um dado é certo. Face à maior persistência da inflação na zona euro, o BCE poderá ter de adotar, a prazo, uma política monetária mais restritiva para travar a escalada dos preços na região da moeda única, que regista uma inflação de mais de 5%, em máximo histórico.

Mas as novas incertezas criadas pelo conflito militar, aumentam agora as dúvidas nos próximos passos do BCE que se preparava para a retirada das políticas de apoio à economia, confirmando o fim do programa de compras de dívida lançado durante a pandemia, definindo uma data para o fim do programa de compra de dívida que já existia antes da pandemia, abrindo caminho para a subida das taxas de juro ainda este ano.

O ataque russo complica agora a tarefa do BCE, pois vai ter de levar em conta o risco de retoma da economia europeia abrandar ou até ficar adiada, levando o banco central a reavaliar a rapidez da retirada das ajudas às economias com as suas taxas de juro nulas e as suas compras de dívida pública.

Reavaliado regresso de regras orçamentais da UE
No contexto do conflito militar, o vice-presidente da CE assegurou esta semana que Bruxelas estará disponível para ajustar a sua política se for necessário, numa altura em que as regras orçamentais deviam regressar em 2023 – a pandemia suspendeu a necessidade de cumprir o limite de 3% do PIB para o défice orçamental e de 60% para a dívida. A decisão de retomar estas regras será tomada na Primavera.

Os desenvolvimentos económicos, e o ritmo da recuperação, serão, pois, peças-chave para guiar os líderes políticos na retirada progressiva dos estímulos, quer monetários quer orçamentais. Reconhecendo o impacto negativo da guerra provocada pela invasão russa da Ucrânia, Bruxelas mantém a tónica na flexibilidade ainda que recomende aos Estados-membros com dívida elevada o caminho da redução redução gradual da dívida, procurando um ajustamento orçamental em 2023.

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