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IRS: contribuintes da categoria B com contabilidade organizada vão ter de devolver reembolsos devido a erro do fisco

Foram liquidadas com erros as declarações de IRS de contribuintes com rendimentos empresariais e profissionais que estão no regime de tributação com contabilidade organizada. AT diz que suspendeu a liquidação destas declarações após ter sido detetado erro de leitura do sistema informático do Fisco que levou a reembolsos superiores aos devidos. E garante que vai proceder à correção oficiosa das perto de mil liquidações que saíram erradas com reembolsos que agora terão de ser devolvidos pelos contribuintes.
19 Maio 2021, 18h00

Foram liquidadas com erros as declarações de IRS de contribuintes com rendimentos empresariais e profissionais da categoria B que estão no regime de tributação com contabilidade organizada. O alerta é da Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC), depois de ter chegado a esta entidade o reporte de problemas na liquidação do IRS. A Autoridade Tributária (AT) garante que após conhecimento do erro informático, no final da semana passada, que resultou em reembolsos que não eram devidos o mesmo de imediato resolvido e estão a ser retomadas as liquidações das declarações que contêm o anexo C. E garante que será comunicado aos contribuintes, via e-mail, informando do sucedido e de que as liquidações efetuadas com erro serão corrigidas oficiosamente pela AT.

“A liquidação de declarações com erros em causa já não se verifica desde o dia 13 de maio, data em que foi detetado o erro. O alerta da OCC ocorre depois de a AT ter detetado o erro e suspendido de imediato as liquidações de declarações com anexo C, disso tendo dado conhecimento à OCC, em 14 de maio, num procedimento transparente e de boas práticas entre a Administração Tributária e os contribuintes/agentes económicos”, avançou ao Jornal Económico fonte oficial do Ministério das Finanças, lembrando que está-se perante declarações de contribuintes com contabilidade organizada, tendo tido como efeito, nomeadamente, a emissão do referido alerta.

De acordo com o esclarecimento da AT, foram identificadas “911 declarações que foram liquidadas com o erro em causa e notificadas aos contribuintes”, não se esclarecendo se após ter sido detetado o erro na passada quinta-feira, o número de liquidações com erro poderá ser superior.

“Após conhecimento do erro e sua análise foi o mesmo de imediato resolvido e estão a ser retomadas as liquidações das declarações que contêm o anexo C”, realçou a mesma fonte, dando conta de que “a suspensão das liquidações foi imediata após o conhecimento do erro (13/05)”.

À OCC chegaram casos de contribuintes que receberam um reembolso muito superior ao constava nas simulações como o de uma contribuinte de valor superior a 14 mil euros apesar de a simulação evidenciar um valor de rendimentos da categoria B e com contabilidade organizada, que na liquidação do sistema da AT era apenas algumas dezenas de euros. Há ainda outros casos de contribuintes que teriam de pagar imposto de 14 mil euros e acabaram por receber reembolsos de três mil euros, por não contemplar o valor correto de lucro tributável correspondente ao anexo C, da contabilidade organizada.

O JE questionou as Finanças sobre o montante de reembolso a receber que foi registado nas liquidações com erros e que deverá ser objeto de correção, tendo fonte oficial avançado que “considerando que não há liquidação apenas do anexo C, mas sim da declaração da modelo 3 com todos os seus anexos e com os rendimentos e informação de todos os titulares que compõem o agregado familiar, não está disponível o valor de reembolso indevidamente emitido associado ao erro de leitura do anexo C, sendo que para o efeito é necessário a obtenção de ‘queries’ específicas”.

Em causa estão contribuintes com rendimentos empresariais e profissionais (categoria B)  no regime de tributação de contabilidade organizada (Anexo C). Por exemplo, profissionais liberais, sendo que o regime de contabilidade organizada é obrigatório para quem fatura mais de 200 mil euros por ano e opcional para quem fatura abaixo deste valor, mas não quer ficar no regime simplificado – em que o fisco assume como despesa da atividade uma determinada percentagem do rendimento declarado. Ao contrário do que sucede no regime simplificado, na contabilidade organizada, os contribuintes podem apresentar despesas de atividade e deduzir o IVA suportado.

São incluídas nos rendimentos da categoria B as atividades agrícolas, comerciais, industriais, pecuárias ou silvícolas e, ainda, as atividades por conta própria, os trabalhadores independentes (recibos-verdes). Este tipo de rendimentos deve ser declarado no anexo B (para quem opta pelo regime simplificado, como é o caso de quem passa atos isolados) ou no anexo C (para rendimentos profissionais e empresariais em regime de contabilidade organizada).

Na sequência de alertas que chegaram à OCC através de vários contabilistas certificados, reportando problemas na liquidação do IRS de pessoas singulares com atividade na categoria B, enquadradas no regime de tributação com base na contabilidade, que submeteram Anexos C, a Ordem informou a AT que, entretanto, suspendeu a liquidação dessas declarações até o problema estar resolvido.

Contribuintes notificados até final de maio para devolver reembolsos

As declarações de IRS que foram liquidadas com erros, serão agora objeto de correção oficiosa pela AT, sendo acertadas as respetivas liquidações.

Sobre quando é que a AT vai efetuar a respetiva notificação para devolução ao Estado dos valores reembolsados a mais, a mesma fonte esclarece que “estão os trabalhos em curso, estimando-se que ainda hoje [ontem] ou amanhã [hoje] será comunicado aos contribuintes, via e-mail, informando do sucedido e de que as liquidações efetuadas com erro serão corrigidas oficiosamente pela AT”. De seguida, diz, serão efetuadas as liquidações corretas, cuja competente notificação ocorrerá até ao final do corrente mês.

A OCC sugeriu aos profissionais que submeteram declarações de IRS com Anexo C que verifiquem a possível existência de erros nas liquidações já efetuadas, devendo alertar os clientes de eventuais correções que irão ser efetuadas oficiosamente pela AT.

Esta Ordem alertou que  este erro determinou a existência de reembolsos de montantes superiores àqueles que seriam devidos, pelo que os valores reembolsados a mais deverão ser devolvidos ao Estado, quando a AT efetuar a respetiva notificação.

“É uma irresponsabilidade. É um erro grave”, diz ANACO

“É uma irresponsabilidade. É um erro grave. Não pode sair uma cobrança de impostos diferente daquela que a lei impõe. É muito grave ter reembolsos, que não têm lugar, e mais à frente pedir a retificação e a devolução aos contribuintes. Primeiro, porque prejudica a todos nós contribuintes e depois porque vai criar problemas sérios às pessoas que têm de devolver os reembolsos num ambiente de pandemia em que as pessoas precisam de dinheiro, existindo por isso o risco de gerirem a sua vida financeira com base em reembolsos que afinal não têm direito”, afirmou ao presidente da direção da Associação Nacional Contabilistas (ANACO), Vítor Vicente.

Este responsável realça que “existe um princípio de confiança que está a ser abalado”. “Se a AT envia nora de reembolso é porque foram bem feitas as contas, o que não aconteceu, pelo que está posto em causa o princípio de confiança na AT em emitir estas liquidações na forma certa e que os contribuintes confiem nelas”, defende, acrescentando que “não se percebe por que é que todos os anos há grandes alterações do ponto de vista informático com programações novas que arranjam problemas” e que “não se prendem só com alterações legislativas impostas todos os anos, mas com a forma como entendem internamente que o sistema informático deve evoluir”. Realça aqui que face a este caso, “a reprogramação informática foi feita em cima do joelho”.

O presidente da ANACO sugere à AT que “ponha funcionários a contactar telefonicamente os contribuintes que tiveram liquidações com erros para não ficarem à espera do email, dado que podemos estar na presença de valores significativos numa altura de pandemia em que pequenos empresários, com estruturas de funcionamento que incluem empregados, se não forem avisados a tempo podem tomar decisões de aplicar os montantes de reembolso que depois não têm forma de repor”.

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