Este não é um conto para crianças, no qual, depois de algumas peripécias, a princesa casa com o príncipe e todos vivem felizes para sempre.

Bem pelo contrário. É uma estória de adultos, bastante deprimente e da qual ninguém vai sair feliz. Nem a princesa, nem o seu vasto séquito de cortesãos, nem sequer aqueles que se limitaram a ver o cortejo passar.

A mente humana é muito complexa e prega-nos constantemente grandes partidas.

Em particular, dá-nos a capacidade de não ver o que está à vista de toda a gente. Depois, quando algo de mau acontece, parece-nos evidente que esse evento era inevitável. “Estava-se mesmo a ver”, dizemos nós. E estava mesmo, simplesmente nós não queríamos ver.

A esta partida que a nossa mente nos prega – em rigor, trata-se de um enviesamento cognitivo – chama-se “I-new-it-all-along effect”. Ou seja, a tendência que todos nós temos para percecionar eventos que já ocorreram como bastante mais previsíveis do que na realidade eram, senão mesmo como inevitáveis.

“Os sinais estavam todos lá”, diz-se com frequência. A verdade, porém, é que basta faltar uma ou duas peças para ser muito difícil montar o puzzle. Sobretudo se a nossa atenção estiver dirigida para outro lado.

Enfim, uma vez montado esse puzzle, a natureza humana volta a entrar em ação e presenteia-nos com outro enviesamento, agora denominado “bandwagon effect”, o que traduzido em bom português – mas não seguramente à letra – significa “Maria vai com as outras”.

É bem mais fácil deixar-se ir no sentido da corrente do que remar contra ela. Remar contra a maré implica ser inconveniente, dizer coisas desagradáveis e, em geral, não é uma boa forma de fazer amigos.

É isto que explica que muitos dos cortesãos que antes elogiavam a inteligência da princesa – e mesmo daqueles que, despreocupados, se limitavam a ver o cortejo passar – venham agora salientar a improbabilidade de ela ter feito os primeiros milhões a vender ovos à frente do palácio real.

Nem vale a pena dizer que, desta vez, aprendemos a lição. Não aprendemos rigorosamente nada, porque não nos podemos libertar da nossa própria natureza.

Basta pensar na semelhança que existe entre este conto da princesa Isabel e a narrativa do infante José. As bandeiras vermelhas iam surgindo uma após outra, mas havia sempre uma saída qualquer, um atalho por estreito que fosse. Até que um dia o infante quis viver num palácio em Paris e o vento virou.