O ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Sergey Lavrov, voltou esta quarta-feira a abordar a questão do suposto fortalecimento dos laços estratégicos entre a Rússia e a China: para além de ter referido como evidência desses laços os exercícios militares conjuntos realizados no ano passado, acusou o Ocidente de tentar encontrar formas de aumentar a tensão com a China, nomeadamente através das questões de Taiwan e do Tibete.
Para Lavrov, que falava em conferência de imprensa em Moscovo, a China é já poderosa demais para os Estados Unidos a enfrentarem por conta própria, pelo que então Washington está a “mobilizar” o Ocidente para apoiar a sua agenda anti-Pequim.
Esta parte das invetivas de Lavrov parece evidente, mas o que o ministro não disse foi que Pequim segue mantendo uma grande cautela em relação à Rússia. Para além de ser claro para todos que os exercícios militares conjuntos se esgotam em si próprios – a China recusa qualquer apoio militar à invasão da Ucrânia – Lavrov não quis recordar que, no último encontro (não presencial) entre Xi Jinping e o seu homólogo russo Vladimir Putin, o presidente chinês não aceitou a proposta de visitar oficialmente Moscovo.
É certo que à medida que a guerra na Ucrânia avança, a China e a Rússia deixaram de lado décadas de desconfiança mútua e intensificaram relações bilaterais – nomeadamente em termos de compra de petróleo russo por parte de Pequim. Mas os exercícios militares faziam parte da política externa dos dois países anterior à guerra e o seu cancelamento seria um sinal que a China não quis dar ao Ocidente.
Lavrov recordou ainda que os dois países assinaram uma parceria “sem limites” em fevereiro passado, dias antes de Moscovo iniciar a invasão e durante a abertura dos Jogos Olímpicos de Inverno – mas esses limites foram de imediato estabelecidos a partir de 24 desse mês, data em que a invasão teve início.
O próprio Vladimir Putin reconheceu publicamente que o seu homólogo chinês tem “preocupações” com as ações da Rússia na Ucrânia. Mas Lavrov alertou para que que o confronto da Rússia com o Ocidente sobre a Ucrânia faz parte de uma mudança política global que evoluirá por um longo período. “O processo de formação de uma ordem mundial multipolar será longo; vai demorar uma década. E estamos no meio desse processo”, afirmou.
Enquanto o referido Ocidente está mais uma vez reunido em Davos, Suíça, Lavrov citou os esforços ocidentais para dificultar a ampliação da cooperação entre a Rússia e a China, afirmando que não teriam sucesso. As relações da Rússia com o Ocidente “nunca mais serão as mesmas”, afirmou, ao acusar o Ocidente de não cumprir os acordos assinados com Moscovo. “Nunca mais haverá situações em que se assinam documentos e depois se recusa o seu cumprimento”, disse.
No mês passado, as marinhas chinesa e russa realizaram exercícios conjuntos no Mar da China Oriental. De acordo com o Comando Oriental da China do Exército Popular de Libertação, os exercícios foram planeados para demonstrar “a determinação e a capacidade dos dois países para responder conjuntamente às ameaças à segurança marítima”.
Em junho, a NATO assumiu a China como o seu mais importante desafio estratégico, dizendo que as ambições e “as políticas coercitivas” de Pequim minavam os “interesses, segurança e valores” do bloco militar ocidental.