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Lehman Brothers: “BES foi um efeito retardado”, realça Teixeira dos Santos

Tal como nos EUA, a banca sucumbiu, por toda a Europa, ao contágio da queda da histórica instituição. Em Portugal, o BPN foi uma vítima direta e o BES, indireta, segundo Fernando Teixeira dos Santos, então ministro das Finanças.
  • Cristina Bernardo
15 Setembro 2018, 13h30

O que aconteceu depois de os governos saberem da falência?

Houve uma série de conversações, até a nível europeu. Logo no início de outubro, foi decidido entre os Estados-membros o lançamento do sistema de apoio ao sistema bancário, que consistia, por um lado, na concessão de garantias do Estados ao financiamento dos bancos para que tivessem fundos para poder emprestar, que não tinham. Dar recursos para poderem fazer essas operações de financiamento com garantia do Estado. Por outro lado, o Estado disponibilizar-se para entrar com capital nos bancos, através de processos de recapitalização, caso necessitassem desse apoio dos bancos. Aliás, à semelhança do que ficou depois acordado no memorando de entendimento com a troika. Isso foi em 2011, mas logo no final de 2008 foram aprovadas pela Assembleia da República, por proposta do governo, essas duas medidas.

 

As ações de resposta estiveram à altura do que foi a falência do Lehman Brothers?

Penso que, na altura, sim, muito embora não tenha sido suficiente para prevenir a falência de vários bancos. Na Europa faliram vários bancos, à semelhança do que aconteceu nos EUA. Em Portugal, também sabemos que o primeiro caso foi o Banco Português de Negócios (BPN), mas mais tarde também o caso, que é o mais exemplar, do Banco Espírito Santo (BES). Foi um efeito retardado desta crise porque o BES não é propriamente vítima imediata da crise de 2008. Mas é, em parte e além das decisões de gestão do BES, também uma vítima da conjuntura económica da própria recessão, com muitas empresas em dificuldade, que se repercutiu nos bancos em geral e também no BES, com as consequências que sabemos.

 

Considera que a falência contribuiu para a crise portuguesa e, posteriormente, para o pedido de ajuda financeira à troika?

A falência do Lehman Brothers veio agudizar muito o receio dos financiadores nos mercados. Quando, em 2010, os mercados se confrontam com uma situação de endividamento elevado de Estados-membros da área do euro, tiveram uma atitude de pouco apetite ao risco e mudaram o seu comportamento. Quando o euro foi lançado, Bélgica, Grécia, Itália tinham dívidas superiores a 100%, e os mercados, na altura, não revelaram receio de financiar esses Estados.

Há, claramente, uma mudança de atitude dos mercados na sequência da crise e, claro, após a falência do Lehman Brothers, da recessão e do impacto que a crise teve no sistema financeiro. Acima de tudo, os mercados passaram a ter receio não só daquilo que era a situação das finanças públicas (défices e dívidas elevadas), mas também do risco que representava a situação dos bancos nos países em termos de finanças públicas. Isto é, a debilidade que a crise causou no sistema bancário – os bancos ficaram de facto fragilizados – e a probabilidade elevada de os Estados terem que intervir no resgate de bancos, fazia com que, além da dívida existente, houvesse receio que os problemas dos bancos piorassem ainda mais as finanças públicas. Portanto, essa perceção de risco foi bastante agravada pelas consequências que a crise teve no sistema bancário.

 

Ainda há cicatrizes desta crise?

Ainda há um legado importante da crise. Não só da crise propriamente dita de 2008 e 2009, mas também do que se seguiu. Basta olhar ainda para o nível de crédito malparado nos bancos, o baixo nível de rendibilidade que a banca continua a apresentar… São ainda sequelas da crise. Mas é preciso dizer que a banca portuguesa está hoje muito melhor do que estava há seis, sete ou oito anos, quando tivemos a intervenção da troika. Está melhor, mas sem dúvida que ainda não ultrapassou inteiramente as sequelas da crise.

 

O sistema financeiro está hoje mais preparado para prevenir e reagir a uma situação como a do Lehman Brothers?

Penso que sim, que hoje estamos melhor apetrechados para enfrentar situações de crise. É evidente que, num mundo global, com economias abertas, estamos sujeitos a choques que podem vir do exterior e que nos poderão afetar. Não estamos livres disso, mas penso que hoje estamos mais bem preparados para enfrentar essas situações do que estávamos há dez anos.

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