Há muitos anos que defendo um sistema de leilões para a atribuição de nova potência para centrais renováveis, como o que está atualmente a ser implementado em Portugal. É o caminho para resolver muitos problemas, entre os quais a descarbonização da economia, o cumprimento dos compromissos internacionais a que nos obrigámos – Acordo de Paris, Protocolo de Quioto, Diretiva das Renováveis, etc. –, além de ajudar a compor a Balança de Pagamentos porque diminui a importação de combustíveis fósseis, e a controlar o valor da fatura mensal da eletricidade.

Quando digo controlar o valor da fatura estou a pensar, em primeiro lugar, em não a deixar aumentar ao sabor dos custos dos combustíveis fósseis usados na produção de eletricidade. Se o valor a que for adjudicada essa nova potência for substancialmente inferior ao valor do mercado, ajuda a reduzir o preço da eletricidade, mas devo de chamar a atenção para o facto dessa redução ser sempre pequena, contrariamente ao que se diz, e levar a que alguns consumidores sonem já que a sua fatura vá ser metade.

Explicando: em Portugal, o custo da produção da eletricidade é cerca de um quarto do valor total da fatura, pelo que qualquer redução percentual no custo da produção de eletricidade vem dividida por quatro na fatura final.

Analisemos um exemplo numérico. Baseando-me num conjunto de pressupostos que elenco, o impacto deste leilão só terá efeito em 2023, o primeiro ano em que toda a potência agora leiloada deverá estar em operação. O leilão está a decorrer, pelo que não se sabe o valor de adjudicação, mas posso considerar o valor médio de adjudicação dos 1.350 MW postos a concurso venha a ser 35€/MWh, para uma produção média anual de 2,4 TWh, isto é 4,3% do consumo no continente nesse ano, que será da ordem de 55 TWh. Também se pode prever que nesse ano o valor médio no MIBEL será de 55€/MWh, semelhante ao que é hoje e que já foi excedido num passado recente.

Ora, esta poupança de 20€/MWh, que é muito, mas como contribuição para o total da produção é pequena, traduz-se numa redução de 0,89€/MWh no preço médio final. Importa perceber como é que esta redução se reflete na fatura mensal do consumidor. Em Portugal cada consumidor doméstico consome por ano 1,2 MWh, e cada agregado familiar tem em média 2,2 pessoas, portanto a poupança na fatura mensal é de 0,19€, ou seja 2,27€/ano, i.e., uma poupança anual de 0,47%.

É um valor pequeno, mas que significa muito. Estas poupanças irão aumentando à medida que a potência atribuída neste tipo de regime também for aumentando, e que as tarifas garantidas forem terminando. Também vai ser importante a redução na fatura pela diminuição da dívida tarifária. Tudo isto vai contribuir para que a nossa fatura não cresça, antes diminua.

Não tenho dúvidas que o caminho a seguir é este, como também não tenho dúvidas que se não tivesse havido por toda a Europa uma política de tarifas feed-in iniciada no final do século passado não seria possível obtermos agora estes benefícios. Aguardemos, pois, o resultado dos leilões, que os 64 inscritos se esforcem por baixar as ofertas sem cometer loucuras, e continuemos a apostar sempre na eletricidade renovável.