Um. Os portugueses não se importam de dar maiorias absolutas. Só não dão a quem as pede. Por isso, o PS alterou a sua estratégia dizendo que voltava a estar disponível para dialogar com todos (excepto o Chega) e assim se afastou esse fantasma.

Dois. O PS nacional precisava de estar imune a surpresas. Não queria que se repetisse aquilo que aconteceu nas autárquicas e tomou a vacina de Lisboa.

O que era esta vacina? Todos estão lembrados que as sondagens davam uma vitória confortável a Fernando Medina frente a Carlos Moedas e que, no debate, o incumbente cilindrou o challenger. Com isso criou-se a percepção que a vitória do PS era certa e a desmobilização e abstenção juntas deram a tal surpresa que ninguém estava à espera, a começar pelo novo presidente de câmara.

E assim o PS, ajudado pelas sondagens, conseguiu manter a incerteza que assustou a esquerda e com isso a esmagou, metendo-a no bolso.

Três. David Ogilvy, um dos maiores mestres da publicidade, dizia: “quando anunciares extintores começa com o fogo”. O extintor era António Costa e o fogo era o pretenso entendimento entre o PSD e o Chega, que assustava o eleitorado moderado e de centro, para lá da esquerda.

Os erros de Rio e dos seus homens nos últimos dias enredaram o PSD nesta confusão, que foi útil para se trilhar o caminho até à maioria absoluta, como antevi no meu podcast com o Jornal Económico, “Maquiavel para Principiantes”, e na CNN, há exactamente uma semana.

Quatro. Seis anos de governo, muita contestação a ministros como Eduardo Cabrita, e António Costa repete o anterior feito de José Sócrates. Parece estranho mas não é. Giullio Andreotti dizia que o “poder só desgasta quem o não tem”. E ele foi dos homens que melhor conheceu o poder.

Cinco. O PSD teve uma derrota abismal. Perdeu todos os distritos do continente, até Leiria. Perdeu as forças dinâmicas da sociedade civil e da juventude. Perdeu identidade e tem quase de se refundar. Para além disso, tem o Chega e a Iniciativa Liberal (IL) a galgar-lhe terreno.

Rui Rio ainda não se demitiu e isso é bizarro. A culpa é toda dele e não do Zé Albino. Rio não cativou os portugueses. Ponto. Já perdeu autárquicas e duas legislativas, sendo a de domingo uma catástrofe. Mas continua ali, à espera não se sabe bem de quê.

Seis. Bloco de Esquerda e PCP perderam juntos 21 deputados e ambos, também juntos, têm menos deputados que o Chega. Catarina Martins está esgotada e Jerónimo de Sousa, um enorme batalhador, já merece descanso. É tempo de novas lideranças.

Sete. André Ventura e João Cotrim de Figueiredo têm lideranças consolidadas, partidos reforçados e margem para crescimento. Ambos realizaram trabalho notável. O Chega é a terceira maior força política em dois anos e em todo o território nacional. A IL tem marcas de água em Lisboa, Porto e Braga. Estão ambos para ficar.

Oito. Parabéns ao Rui Tavares, mas uma enorme mágoa por ver o CDS sem representação parlamentar. Entrou na Liga dos Últimos e está nas lonas de dinheiro e de identidade. Será muito difícil ressuscitar.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.