1 O “caso Robles”, levantado pelo Jornal Económico, tem sobretudo a dimensão de uma aula pública sobre ética e responsabilidade política.
Reparo, com agrado, que desta vez toda a gente parece ter percebido.

Até os socialistas, que nunca se questionaram sobre o comportamento de José Sócrates naquilo que é já do conhecimento público e confirmado (para além da matéria criminal, que segue dentro de momentos).

Até os sociais democratas, como Pedro Passos Coelho, que foi capaz de apresentar Dias Loureiro, depois de tudo aquilo que se conhece, como um empresário exemplar.

Até os centristas, que passaram sem expulsões nem demissões em casos como a da Herdade da Vargem Fresca (na qual foram abatidos 2 500 sobreiros, uma árvore protegida), permitida por ministros como Nobre Guedes e Telmo Correia – e, sabe-se lá porquê!, relacionada com misteriosos donativos de um milhão de euros recebido pelo CDS, em dezembro de 2004, entre outros feito pelo célebre cidadão (nunca encontrado) Jacinto Leite Capelo Rego.

Podia continuar, porque os exemplos são muitos. Não o faço porque a sociedade portuguesa é tristemente rica nesta matéria e cada um pode proceder ao seu exercício privado para perceber que, além do trabalho de investigação criminal, existem dimensões pelas quais as pessoas que andam na atividade pública, política ou empresarial, devem ser examinadas. E pelas quais, se for caso disso, devem retirar as devidas consequências. Neste particular, Ricardo Robles tirou-as com alguma rapidez, e nisso revelou o bom senso que lhe faltou quando antes defendia políticas que, enquanto cidadão, não praticou (pelo menos neste caso).

Resumindo: o cidadão Ricardo Robles, pelo menos que se saiba, não fez nada de ilegal nem criminoso; o político Ricardo Robles, provado neste caso como um hipócrita, tinha de abandonar os seus cargos, no partido e na Câmara de Lisboa (três dias depois de ter dito que não o faria…) e, assim, aliviar a pressão sobre o BE.

2 Catarina Martins sai chamuscada deste processo. Sobretudo, porque se comportou como uma chefe de claque, quando é suposto que seja uma líder de uma corrente de pensamento e ação política. E quem está nestes lugares tem a obrigação de saber que a sua principal responsabilidade não é defender irracionalmente amigos, é proteger a integridade da causa comum.

Catarina Martins cometeu todos os erros. Sucessivamente, disse que as notícias eram “falsas”; falou em “campanha de difamação de partidos e comunicação social”; disse que Robles tinha tido um “comportamento exemplar”; que não despejara inquilinos; que não fizera “especulação” nem “nada de errado”; que não estava “diminuído na sua legitimidade”; que tudo isto se devia “a estarem diplomas na Presidência a aguardar promulgação” (que ainda não estavam…); etc., etc.. Chegou mesmo a dizer que não havia especulação porque o prédio não fora vendido, “logo não havia nenhuma mais valia, nenhum lucro”.

Enfim, foram tantos erros e em tão pouco tempo que a boa imagem ganha nos últimos anos, a partir do momento em que tomou o cargo de coordenadora do BE a solo, ficou bastante abalada. Refazer a credibilidade das suas afirmações, seja em que matéria for, vai levar tempo.

3 Este caso também tem sido muito interessante na vertente jornalística e dos correlativos “spin doctors”. É certo e sabido que, quando as notícias são irrefutáveis (e a notícia do JE cumpriu todas as regras deontológicas necessárias), a fase do desespero na era das sedes sociais prossegue com a pergunta: “A quem interessa esta notícia?”. E, assim sendo, descobriu-se, pasme-se com a inteligência, que esta interessava ao PS, sobretudo à sua ala moderada, ao PSD, ao PCP, a todos os outros partidos e, mesmo, aos inimigos do BE. Fantástica descoberta! Quem imaginaria?

A coisa, quando é caso disso, e este foi, continua com a tentativa da adivinhação da fonte, ou fontes, e dos interesses que as alimentam. Percebido isso, acreditam, a notícia deixa de existir.

Ou seja, se um homem agride a mulher e esta grita, a culpa pode ser de um vizinho que ouviu e chamou a polícia; se um condutor embate e foge, a culpa pode ser da testemunha que anotou a matrícula; se um ladrão foi preso, a culpa pode ser de um popular que o deteve arriscando a vida. Se percebermos quem deu a notícia do crime, este, segundo algumas vontades, desaparece.

Esta tese já foi praticada até por jornalistas, contra jornalistas, quando o azar lhes bateu à porta. Por piedade, não volto a histórias antigas, mas dá gosto ver como agora até “esses” percebem a coisa com a independência necessária e a explicam com indignação q.b.. Estamos sempre a aprender.