“Caiu o Carmo e a Trindade” sobre a empresária Isabel dos Santos. As operações no Dubai divulgadas pelo Consórcio de Jornalistas internacionais, e em Portugal pelo Expresso e SIC, foram a “gota de água” para várias entidades desencadearem inspeções. Seguem-se os danos colaterais com entidades portuguesas expostas.

Por aquilo que é público, a consultora PwC cessou todas a relações contratuais com o grupo de Isabel dos Santos e marido, e um dos seus partners demitiu-se do cargo, enquanto entidades como o EuroBic anunciaram cessar todas as atividades comerciais com a sua acionista. Nas telecomunicações há preocupação por parte do grupo Sonae. Mas isto é apenas a ponta do icebergue.

E aqui surgem as perguntas que por ora não têm respostas. As suspeições não são de agora, nem sequer de novembro de 2017. Ressoavam nos corredores do poder, dos bancos e do mundo jornalístico. Ninguém se atreveu a dar o primeiro passo até à destituição de Isabel dos Santos da gestão da Sonangol pelo presidente João Lourenço. Mas, por enquanto, são tudo suposições. A PGR angolana avançou com o processo civil e encontrou matéria-crime para o processo judicial.

Coloca-se a questão de perceber a abrangência de todo o movimento. Que impacto terá em empresas portuguesas e no PIB nacional? Na banca, Isabel dos Santos reagiu à pressão e quer vender o EuroBic. Entretanto, o BdP criou um gabinete de crise para acompanhar o processo, a pergunta é: porque não o fez quando teve de analisar os movimentos financeiros de alguém politicamente exposto? Como foi possível uma transação de dezenas de milhões de euros de Lisboa para o Dubai em horas fora do expediente e depois de demitida da Sonangol? Será que transferir esse volume de dinheiro não obriga ao conhecimento da administração do banco e do próprio regulador? E investigou-se a proveniência dos recursos de todas as outras compras? Ou será que a importância da empresária e o facto de ser filha de quem é impedia o cumprimento dos regulamentos?

Teixeira dos Santos como CEO do EuroBic fica mal na fotografia. Tem a seu favor o facto de ter sido o ministro que enfrentou Sócrates no momento da verdade perante a troika, mas sai mal pois foi no seu governo que foi tratado o tema BPN, posteriormente adquirido pelo BIC, que depois assumiu a gestão do banco comprador. Carlos Tavares, ex-presidente da CMVM não fica melhor perante investidores de empresas cotadas. E não nos esqueçamos do “irritante” tema de Manuel Vicente enquanto presidente da Sonangol. Passou pelos “pingos da chuva” no consulado do presidente Dos Santos e agora está com o presidente Lourenço.

Questiona-se até que ponto a Sonangol não foi usada para tentar destruir a economia portuguesa com o caso BCP. Com efeito, a Sonangol queria mandar no BCP através de Manuel Vicente e Carlos Silva. Recordemos apenas o episódio do BCP no consulado de Paulo Teixeira Pinto e o acordo com a Sonangol e o Atlântico, tentado à revelia da administração do banco. Afinal, onde esteve a compliance no BCP, no BPI e, mais recentemente, no EuroBic? Será que clientes relevantes não tiveram de dar explicações aos bancos? E o que vai fazer o BdP quanto a idoneidades?

Isto para não falar dos governantes portugueses e dos gestores que aproveitaram o momento. Caso exista algum tipo de crime serão cúmplices? E as empresas portuguesas com participações sociais suspeitas entrarão em dificuldades? O Estado e os reguladores têm de manter vivas as empresas que interessam ao país.