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Medina: Estado “devolveu integralmente” excedente da receita fiscal

O ministro das Finanças diz que mais de 8.800 milhões de euros foram devolvidos aos portugueses. Sobre o real impacto da descida do IVA no cabaz de bens alimentares essenciais, Fernando Medina lembra que nem mesmo o Governo pode impedir a quebra do poder de compra num contexto inflacionário e que só não foram dados mais apoios porque não se dá o que não se tem para dar.
30 Março 2023, 00h52

O ministro das Finanças garante que o Estado “devolveu integralmente” o excedente de receita fiscal que obteve através do IVA, IRS, IRC e outras contribuições. Sobre o real impacto da descida do IVA no cabaz de bens alimentares essenciais, Fernando Medina lembra que nem mesmo o Governo pode impedir a quebra do poder de compra num contexto inflacionário e que só não foram dados mais apoios porque não se dá o que não se tem para dar.

Numa entrevista dada esta noite à RTP, o responsável pela pasta das Finanças começou por ser questionado sobre a reviravolta na questão do IVA. Recorde-se que o Governo rejeitou aplicar a isenção do imposto durante quase um ano, perante fortes críticas da oposição. A espera, afinal, fazia parte da estratégia, diz Medina.

Aplicar só agora uma redução do IVA “muda tudo”, sublinha. “Porque no caso de Espanha, quando fizeram a descida do IVA, sem um acordo à estabilização de preços, o risco de os distribuidores poderem manter os preços era uma consequência e um risco real”, explica, aproveitando a deixa para elogiar o acordo celebrado tanto com o sector da produção como com o sector da distribuição, com quem se verificou “uma vontade genuína de chegar a acordo e isso foi importante”, reforça o ministro.

Ainda assim, reconhece o responsável pela tutela, “não quer dizer que não vá haver alguma flutuação” dos preços praticados. “O objetivo é a estabilidade dos preços ao longo de seis meses”, diz ainda, recordando que essa parte do acordo cabe à distribuição manter.

“Não houve condições para um entendimento [antes]. Percebe-se bem a diferença das medidas com e sem acordo”, esclarece o ministro, apontando os casos dos vizinhos espanhóis e franceses como um exemplo do que não se queria atingir. “Aprendemos com as duas experiências, o que nos dá a confinança de que a diminuição [do IVA] chega diretamente aos bolsos dos portugueses”, sublinha Fernando Medina.

“Não se trata só de diminuir os preços, mas sim de procurar uma estabilização no mercado”.

Se, do ponto de vista do consumidor, o problema começa e acaba nos corredores dos supermercados, para a tutela, o acordo tinha que chegar à produção – um pacote que o próprio ministro admite custar entre 160 a 200 milhões de euros; valor que tem “um significado importante”.

Porém, a diminuição do imposto, através do acordo anunciado esta semana, não salvaguarda flutuações nos preços decorrentes de outros custos de contexto, nomeadamente do transporte, reconhece Medina.

“Não é uma fortuna, é mais um contributo”

Questionado sobre o baixo impacto da descida do IVA na fatura final, e se a medida não passa de mais uma “estratégia de marketing político”, nas palavras do entrevistador, o ministro é categórico na defesa da ideia de que cada cêntimo conta: “Nenhuma família gasta 10 euros por mês no supermercado. Num cabaz de 200 euros por mês, há uma poupança de 12 euros”, diz.

“O IVA é hoje considerado um imposto que penaliza mais as famílias de mais baixos rendimentos”.

“Não aprensentámos só esta medida. Temos vindo a apresentar medidas desde o agravamento da inflação”, lembra, enumerando desde logo a intervenção no sector dos combustíveis, onde ainda vigora a bonificação do ISP, e as medidas criadas para o aumento da eletricidade e do gás.

Já no mais recente pacote, garante o ministro, “a medida mais importante, de impacto financeiro, é o apoio de 30 euros por mês dirigido às famílias mais vulneráveis”. O apoio, esclarece Fernando Medina, terá um custo de 700 milhões de euros aos cofres do Estado.

Ainda sobre o aumento do custo de vida, em particular nos preços dos bens alimentares, o ministro reconhece a velha máxima da economia: o que hoje custa 2x dificilmente volta a custar x. “Haverá produtos que não regressarão [a valores de há dois anos]. O que estamos a assistir é a uma diminuição dos preços, que são custos de fazer chegar os produtos ao sistema de distribuição”, diz.

Quanto às propostas de alguns partidos da oposição de tabelar os preços, está fora de questão. “O tabelamento dos preços levaria ao possível desaparecimento de alguns bens da cadeia de distribuição”, alerta Medina.

“Chama-se equilíbrio”

O ministro das Finanças esclareceu ainda que os aumentos dos salários das administrações públicas concretizado a 1% resulta da diferença face aos indicadores nominais de 2022. “O aumento que apontámos em outubro, que resultou num acordo com os sindicatos entre 2% a 8%, tinha um valor de referência de 5,4%”, ao longo de quatro anos. O que aconteceu, explica, é que foi feita “a correção relativamente à realidade do ano passado”, mantendo ainda assim o acordo.

A decisão de aumentar os funcionários públicos em 1% “é transversal a todos os trabalhadores da função pública”, reforça.

Existiam dois problemas, recorda: por um lado, o subsídio de alimentação na função pública “era inferior ao decretado pelo Governo como mínimo” para o sector privado, o que levou o Executivo de António Costa a entender “que este era o momento para fazer essa correção”. Por outro lado, “houve uma correção dos indicadores relativamente ao cenário que tínhamos”. “Foi uma relação de justiça relativamente ao acordo” celebrado com os sindicatos, defende.

Ainda assim, Medina diz que os aumentos dos salários não são uma resposta válida para a inflação.

“O aumento dos salários, como o aumento dos lucros, o aumento da procura… Numa economia em inflação, tem que ser sempre controlado, para não piorar o próprio processo de inflação”, explica. “Quero ser muito claro: não podemos ter, num momento sensível relativamente ao controlo da inflação”.

A inflação core, como lhe chama, despida das componentes flutuantes, “está bastante acima dos valores que queremos”. “Temos de ter uma abordagem prudente e ponderada. Chama-se equilíbrio”, garante.

“Em 2023, seguimos uma política de rendimentos e salários – quer na Administração Pública, quer no privado – diferente daquela desenvolvida em 2022, ano em que tivemos eleições, longos meses até à posse, um Orçamento em abril… Havia um discurso muito claro do Banco Central Europeu (BCE) de que estávamos num fenómeno transitório. Essa análise do BCE começa a virar a partir de setembro e nós imediatamente fizemos uma adaptação da nossa política”, garante o ministro.

Contudo, nem descida de IVA nem aumento dos salários podem assegurar uma recuperação do poder de compra: “Ninguém pode assegurar – eu não posso assegurar – o poder de compra. Não seria verdadeiro dizer que numa crise inflacionária ninguém teria perda do poder de compra”, argumenta.

“O que podemos dizer é que temos de ter uma condução equilibrada, fina e exigente para atender à manutenção dos rendimentos e manter esse nível, inequivocamente”.

Não ir “além dos objetivos de redução da dívida e do défice”

Sobre o impacto de algumas das medidas previstas em sede de IRS, nomeadamente com a atualização dos escalões, o ministro explica por que é que muitas famílias de mais baixos rendimentos não verão uma diferença nas deduções: “O IRS em Portugal tem uma abrangência que não chega aos 50% dos portugueses com menor rendimento”.

Quer isto dizer que “metade dos portugueses não declara IRS e, por isso, essa redução não chegaria a estas famílias”, acrescenta, repetindo que “o Estado devolveu integralmente todo o excesso da receita fiscal, que recebeu em impostos”, no total de 8.800 milhões de euros.

Sobre a política orientada em torno da redução da dívida pública e do défice, Medina garante que esses dois objetivos primários se mantêm intocados e que o Governo não procurará ir além dos mesmos num momento em que sobem os juros e que, por isso, aumenta a exposição da dívida do Estado.

“Vamos ter de pagar em 2023 mais 1.400 milhões de euros em juros face ao pagámos em 2022. O valor da dívida ainda não pode deixar-nos tranquilos”.

Sobre o “brilharete orçamental”, que prometeu no início do mandato não tentar fazer, Medina garante que a diferença entre o défice previsto, de 1,9%, e o défice registado de 0,4% não se deve “a forretice do Estado”.

“Ao longo de 2022 assumimos publicamente duas coisas: que não íamos procurar ter brilharetes orçamentais e que devolveríamos aos portugueses tudo aquilo que viesse de receita adicional”, desde logo pelo contexto inflacionário, recorda o responsável.

“Com este último pacote de medidas com um valor de 1.600 milhões, que somam aos 900 milhões anteriores, a conta [do défice] bate certo. Nós distribuímos aos portugueses tudo o que o Estado recebeu a mais e fomos mais longe”, garante, “devolvemos o acréscimo do IRS, IRC e outras contribuições”.

“Tudo o que resultou da força da economia”, esclarece, permitiu que se tenha distribuído mais do que prometido, ainda que isso signifique um estagnar do investimento em serviços do Estado, nomeadamente no SNS, na Edução ou na Defesa. Quanto ao SNS, Medina retraí-se e defende que foi paga toda a dívida vencida do mesmo – o que não se traduz em investimento novo.

Quanto à demora na aplicação de medidas como as que foram conhecidas, o ministro explica que “só distribuímos depois de termos a certeza que tínhamos as receitas”. “Não distribuímos aquilo que não temos”, salvaguarda.

“Isto é um equilíbrio”, refere novamente na entrevista dada à estação pública: “O país tem uma dívida muito elevada num momento de grande instabilidade externa. Temos de cuidar de ter uma dívida mais baixa, mas ao mesmo tempo o que eu responderia aos partidos da oposição é: demonstrem que nós não distribuímos tudo aquilo de receita que o Estado teve e, já agora, demonstrem que Portugal não foi o quarto país que mais apoios distribuiu”, de entre os 27 Estados-membro.

 

Notícia atualizada às 01h01

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