Este texto foi publicado originalmente no suplemento “Quem é Quem no Setor Financeiro”, que integrou o Jornal Económico de 26 de fevereiro de 2021.

 

Para se retirarem conclusões sobre as moratórias é indispensável ter uma correta perceção dos pressupostos e objetivos que lhes prevaleceram.

Perante uma crise sanitária global, de consequências transversais e avassaladoras nas economias, os Estados e as Instituições reagiram com apoios massivos que visaram atenuar o impacto imediato sobre famílias e empresas, protegendo empregos e preservando a capacidade produtiva existente para evitar uma espiral negativa destruidora de valor e aniquiladora de potencial de recuperação. Atente-se e sobretudo reflita-se, antes de opinar intempestivamente, sobre alguns exemplos das diferentes opções dos países, que resultam da capacidade ou dos riscos que decidiram assumir para apoiar a economia:

  • Apoios públicos à economia em percentagem do respetivo PIB: Portugal 11,2%; Alemanha 39%; Espanha 19%.
  • Apoios privados (moratórias) em percentagem do PIB: Portugal 22,5%; Alemanha 0,2%; Espanha 7%.

Alguém acredita que os Bancos não preferissem, no abstrato, ter muito maior percentagem de apoios do Estado e menos moratórias? Só que na vida real, as opções exequíveis, não se formulam no abstrato quando está em causa o bem-estar das pessoas, não apenas no dia de hoje mas também no futuro.

Os portugueses sabem que o nível de dívida pública está num patamar muito elevado e que caso se perdesse a confiança dos mercados haveria consequências muito pesadas (temos memória fresca e ainda algumas feridas graves por sarar resultantes da última vez que tal sucedeu).

As soluções adotadas refletem a realidade concreta de cada país, os quais apoiam a respetiva economia em função das suas condicionantes e especificidades, visando suprir uma falha de mercado que subitamente reduziu receitas na generalidade dos setores de atividade, ou praticamente suprimindo-as em alguns setores de atividade.

No essencial, a resposta à crise em Portugal suportou-se em dois vetores de atuação: apoios diretos à tesouraria, sob várias formas de injeção de liquidez, e reagendamento de obrigações financeiras existentes.

Em Portugal, a solução adotada, e correta em meu entender, conduziu a um nível expressivo de moratórias nos créditos tanto das famílias como das empresas, atenuando assim a pressão sobre a dívida pública que decorreria de um maior nível de apoios diretos à tesouraria.

O consumo retraiu-se durante esta crise, foi comprimido por força de confinamentos e múltiplas restrições, mas o seu levantamento, com a resolução da crise sanitária, proporcionará uma retoma económica em ritmo acelerado, ainda que diferenciado entre setores, desde que o país disponha de capacidade para corresponder à procura que tem estado retraída.

Enquanto a pandemia não estiver controlada, é fundamental não se retirarem prematuramente os apoios às empresas que têm modelos de negócio viáveis e que apresentam potencial para criar prosperidade com o início da recuperação económica.

Defendemos por isso a prorrogação das moratórias enquanto as empresas estão impossibilitadas de retomar receitas, sobretudo nos setores que permanecem mais afetados. A questão da interrupção das moratórias não se reduz às consequências para o sistema financeiro, deve ser analisada em primeira linha pelas repercussões que teria na economia e no bem-estar da sociedade portuguesa.

Ao contrário da anterior esta não é uma crise financeira. De forma genérica o sistema financeiro encontra-se numa posição que é incomparavelmente melhor do que a que tinha perante a anterior crise, tanto de robustez de capital como de abundância de liquidez.

Esta posição tem permitido que os bancos correspondam, sempre com rigor e adequada prudência, positivamente no apoio a famílias e empresas, contribuindo ativamente para que resistam e superem um período de elevada adversidade. O desempenho do sistema financeiro não se pode dissociar da realidade económica em que está inserido. Os bancos refletem nos seus balanços a generalidade da economia portuguesa. Há uma relação de grande proximidade e dependência dos Bancos que estão sediados em Portugal e que têm na sua missão servir a economia Portuguesa.

Essa relação é útil e virtuosa para a sociedade portuguesa, naturalmente no pressuposto de que se pretende prosseguir um modelo de desenvolvimento económico sustentável e que os Bancos dispõem de modelos de governo sólidos e incentivos alinhados com uma cultura de rigor e de sustentabilidade na gestão dos riscos.

Em termos sanitários estamos a viver o período mais difícil, mas alguns indicadores recentes evidenciam que em termos económicos já ultrapassámos a fase mais aguda da crise.

Estamos por isso confiantes que existem condições para que possamos contribuir e beneficiar de uma retoma económica a bom ritmo a partir do início do primeiro semestre de 2021. Façamos por isso, cumprindo com rigor as orientações de saúde publica e protegendo e preservando a capacidade empresarial.