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MP arquiva inquérito sobre falsificação do currículo de Feliciano Barreiras Duarte

Em causa estava o estatuto de “visiting scholar” da Universidade de Berkeley, usado pelo ex-deputado do PSD. Reagindo ao despacho, que o iliba do crime de falsificação ou contrafação de documento, Barreiras Duarte diz que nada apaga o facto de o seu nome “ter sido arrastado na lama de forma apressada e torpe”.
  • Cristina Bernardo
6 Abril 2021, 18h00

O Ministério Público arquivou o inquérito por falsificação ou contrafação de documento que incidia sobre o ex-secretário de Estado e ex-deputado social-democrata Feliciano Barreiras Duarte por este apresentar no currículo o estatuto de visiting scholar da Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos, alegando-se que daí retirou vantagem. No despacho de arquivamento, a que o Jornal Económico teve acesso, o Departamento de Investigação e Ação de Penal de Lisboa considera “forçoso concluir que é inviável o exercício de ação penal”.

Isto porque o Ministério Público considera que, apesar do testemunho da professora da Universidade de Berkeley, Deolinda Adão, de que não redigiu um documento assinado por si em que referia que Feliciano Barreiras Duarte estava inscrito na instituição de ensino norte-americana enquanto visiting scholar – algo que a mesma declarou ser impossível, pois o político não tinha qualificações para tal, vsto que não era doutorado -, não existem “indícios de que o documento em apreço seja material ou intelectualmente falso e de que o arguido quando invocou a qualidade de visiting scholar agia sabendo que tal não era verdade”.

Reagindo ao arquivamento do inquérito, o antigo deputado, secretário-geral do PSD e secretário de Estado Adjunto de Miguel Relvas – quando este era ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares do Governo de Passos Coelho -, afirmou que, “como sempre disse, não cometi qualquer crime, nem falsifiquei documentos ou o meu currículo, como agora conclui o Ministério Público, após dois anos de investigação”.

“Acreditei na Justiça e tinha motivos para isso, pois fez-se justiça. Mas nada apaga o facto de o meu nome ter sido arrastado na lama de forma apressada e torpe, com penosas consequências para mim e para a minha família”, acrescentou Barreiras Duarte, numa declaração escrita, acrescentando que a investigação de que foi alvo “deve ser pretexto de séria reflexão para todos os agentes políticos, jornalistas e comentadores”.

O despacho do Ministério Público descreve os procedimentos iniciados com um artigo publicado no semanário “Sol”, onde era dito que o social-democrata se apresentava em livros por si publicados e na plataforma eletrónica de currículos académicos DeGóis como visiting scholar de Berkeley, sendo que essa última alegação não foi confirmada.

No âmbito da investigação foi recolhida informação da Universidade Autónoma de Lisboa (UAL) relativa à tese de doutoramento de Feliciano Barreiras Duarte sobre “Políticas Públicas e Direito de Imigração”, em parceria com a universidade norte-americana. Cita-se uma ata de reunião da Comissão Científica da UAL na qual foi deliberada a constituição de um grupo de análise de todo o processo de doutoramento, lendo-se que “o facto de o candidato ter invocado ostentar o estatuto de visiting scholar da Universidade de Berkeley (na qualidade de doutorando, investigador e conferencista) não só não passou despercebido à Comissão Científica do Departamento de Direito, nem ao Conselho Cientifíco, como foi determinante na avaliação da candidatura para a admissão ao terceiro ciclo de estudos da UAL com vista à obtenção do grau de doutor em Direito”.

Também se lê no despacho que Feliciano Barreiras Duarte apresentou um documento com data de 30 de janeiro de 2009 atestando que se encontrava inscrito na Universidade de Berkeley com o estatuto de visiting scholar, no âmbito do doutoramento em Ciência Política com a tese “Políticas Públicas e Direito da Imigração”, apresentando como orientadora Deolinda Adão, a quem fora apresentado em 2008, tendo esta assumido o compromisso de o admitir enquanto junior visiting scholar, num documento que “apenas pode ser entendido como uma carta convite que tem como objetivos obter visto para a estadia nos Estados Unidos e iniciar o processo no departamento inicial da Universidade”. Mas a mesma professora acrescentou que o ex-deputado nunca esteve em Berkeley nem lhe apresentou qualquer projeto de doutoramento.

Barreiras Duarte reiterou em interrogatório que lhe foi sugerido pelo professor Pinto de Abreu que o doutoramento iniciado em 2007 fosse realizado em parceria com Berkeley, apresentando o projeto a Deolinda Adão, “que o valorou positivamente” e enviou “documentação referente às diligências a efetuar para obter o estatuto em causa”, tendo ficado “convencido de que tinha diligenciado com sucesso”. E acrescentou que, apesar de não ter ido a Berkeley, realizou um conjunto de trabalhos sobre imigração e nacionalidade nos Estados Unidos.

Também apresentadas por Barreiras Duarte, entre outros documentos, foram trocas de mensagens com Deolinda Adão e um parecer da Assembleia da República, datado de 9 de julho de 2008, “nos termos do qual não existe qualquer incompatibilidade ou impedimento” ao exercício cumulativo do mandato de deputado com a frequência de doutoramento numa universidade pública estrangeira de bolsas de investigação da Universidade de Berkeley e da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD).

Testemunhas indicadas por Feliciano Barreiras Duarte, incluindo a atual deputada socialista e ex-ministra da Administração Interna Constança Urbano de Sousa, defenderam que a qualidade de visiting scholar de Berkeley “não era muito relevante, já que este tinha currículo que justificava a sua admissão ao doutoramento da UAL com dispensa de frequência escolar”. Algo que também foi tido em conta pelo Ministério Público para a decisão de arquivaamento.

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