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Negócio de venda de barragens da EDP: DCIAP confirma buscas por suspeitas de fraude fiscal

O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) confirma que estão a ser realizadas buscas em 11 locais do país, nomeadamente Lisboa, Porto, Amadora e Miranda do Douro. Diligências estão a ser realizadas em instalações de barragens, escritórios de advogados, na Agência Portuguesa do Ambiente (APA), uma sociedade de contabilidade e na EDP. Em causa estão suspeitas de fraude fiscal pelo negócio de venda de seis barragens aos franceses da Engie.
  • 1 – EDP
6 Julho 2021, 12h57

O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) confirma que estão a ser realizadas buscas em 11 locais do país, nomeadamente Lisboa, Porto, Amadora e Miranda do Douro. No âmbito da investigação se encontra a ser efetuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), diligências estão a ser realizadas em instalações de barragens, escritórios de advogados, um organismo do Estado (na APA), uma sociedade de contabilidade e sociedades ligadas ao sector hidroelétrico, nomeadamente na EDP. DCIAP avança que estão em causa suspeitas de fraude fiscal.

“No âmbito de um inquérito dirigido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e cuja investigação se encontra a ser efetuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), realizam-se buscas em 11 locais do país, nomeadamente Lisboa, Porto, Amadora e Miranda do Douro. Estas buscas decorrem em instalações de barragens, escritórios de advogados, um organismo do Estado, uma sociedade de contabilidade e sociedades ligadas ao sector hidroelétrico”, avança o DCIAP.

Segundo o DCIAP, no processo investigam-se factos relacionados com o negócio da transmissão de seis barragens do grupo EDP para o consórcio francês integrado pela Engie, Crédit Agricole Assurances e Mirova (Grupo Natixis).  Em causa estão suspeitas da prática de crime de fraude fiscal.

Na operação desta terça-feira, 6 de julho, intervém na operação 29 Inspetores da Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC​), 37 inspetores da Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais (DSIFAE), incluindo 10 especialistas do Núcleo de Informática Forense, sendo que a operação em curso, para além de elementos da UGC e da DSIFAE, conta ainda com 28 militares da Unidade de Ação Fiscal da GNR, incluindo dois especialistas em informática forense. Nas diligências participam sete magistrados do Ministério Público e cinco magistrados judiciais.

A SIC Notícias noticiou que as autoridades estão a realizar buscas em ministérios das Finanças e do Ambiente, e também na EDP, revela a “SIC Notícias”. A elétrica já confirmou que foi alvo de uma operação por alegada fraude fiscal e que “está a prestar toda a colaboração com as autoridades e mantém-se convicta de que a operação de venda cumpre todos os requisitos legais”. Fonte oficial das Finanças assegurou, por sua vez, que não decorrem buscas naquele ministério: “não há buscas no ministério das Finanças”. Também o Ministério do Ambiente nega que estejam ali a ser realizadas buscas.

As buscas feitas pela AT e Ministério Público estendem-se às instalações da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e estão a ser realizadas no âmbito das investigações ao negócio de venda de seis barragens no rio Douro (Miranda do Douro, Picote, Bem Posta, Foz Tua, Baixo Sabor e Feticeiro) aos franceses da Engie. Uma operação que ascendeu a 2,2 mil milhões de euros, que foi alvo de suspeitas de “borla fiscal” denunciadas pelo PSD e BE, que devia ter-se traduzido, pelo menos, em 110 milhões de euros em impostos, a entregar às regiões abrangidas pelas barragens do Douro.

Em março, o PSD chegou mesmo a entregar na Procuradoria-Geral da República (PGR) um pedido de averiguação da venda pela EDP de seis barragens da bacia do Douro pela EDP, considerando que o Governo favoreceu a empresa e concedeu-lhe uma “borla fiscal”. Na queixa apresentada na PGR, o PSD começa por pôr em causa a alteração legislativa realizada a 31 de março de 2020 e que permitiu que a operação se realizasse “ao abrigo do regime fiscal de reestruturação de empresas sem o pagamento dos impostos devidos”, e elenca depois todos os passos dados pelas empresas envolvidas – EDP e Engie e outras – com vista à venda, incluindo cisões, fusões e a criação de uma empresa específica, a Movhera, com vista à aquisição das barragens – tudo para evitar o pagamento de impostos.

Também o Movimento Cívico da Terra de Miranda (MCTM) levantou várias suspeitas sobre a atuação do Governo, tendo enviado uma carta à PGR no início do ano que levou o DCIAP a analisar a operação. A PGR confirmou apenas que este documento tinha sido remetido ao DCIAP para análise e não clarificou se tinha sido aberta uma investigação criminal.

Na Carta Aberta, enviada para a PGR em 27 de janeiro, o MCTM solicita a Lucília Gago que indague por que motivo “o ministro do Ambiente aceitou autorizar a venda das seis barragens pela EDP sem exigir qualquer contrapartida para o Erário Público”.

O MCTM solicitou ainda que fosse ainda que fosse investigado por que motivo o ministro não impediu que o contrato de venda autorizado “contivesse cláusulas de planeamento fiscal agressivo destinadas a evitar o pagamento do Imposto do Selo, do IMT, do IRC e da Derrama, apesar de estar alertado previamente, pessoalmente e por escrito, para essa possibilidade”

Mais recentemente, o MCTM revelou ter na sua posse “os elementos necessários” que provam que a venda das seis barragens da EDP aos franceses da Engie está sujeito ao Imposto do Selo, IMT e IRC.

As centrais hidroelétricas foram compradas por um consórcio francês formado pela Engie (40%), Crédit Agricole Assurances (35%) e Mirova – Grupo Natixis (25%).

O ministro das Finanças anunciou a 23 de março que a Autoridade Tributária já estava a analisar a operação de venda de seis barragens pela EDP a um consórcio francês liderado pela Engie.

“Acabou de me informar a senhora diretora-geral da Autoridade Tributária que os serviços já estão a trabalhar nesta matéria estando em fase de recolha de elementos preparatórios que possam promover as ações necessárias à eventual liquidação de impostos devidos”, disse João Leão no Parlamento em março.

“O tempo de intervenção em matéria fiscal do lado do Estado começa agora, a Autoridade Tributaria tem total autonomia para agir nesta matéria. O Governo não interfere na atividade inspetiva da AT, como é próprio de um Estado de Direito”, afirmou o ministro.

“O ministério das Finanças não se pode pronunciar por operações em concreto, por imposição legal, mas é importante que fique claro que o sigilo fiscal não é uma desculpa que o Estado utiliza, muito menos o Governo, para não prestar esclarecimentos. O sigilo fiscal não é uma prerrogativa do Governo, é um direito dos contribuintes, legalmente protegido”.

Movimento assegura ter provas de que negócio está sujeito a impostos

O Movimento da Terra de Miranda revelou a 14 de junho ter na sua posse “os elementos necessários” que provam que a venda das seis barragens da EDP aos franceses da Engie está sujeito ao Imposto do Selo, IMT e IRC.

O Movimento transmontano deu conta que “depois de o ter legalmente solicitado, aos elementos necessários e suficientes para poder afirmar a sua conclusão de que todos os impostos que incidem sobre o negócio da venda das barragens são devidos, tanto o Imposto do Selo, como o IMT e o IRC, sendo também devido o IMI.

O MCTM sustenta que esta conclusão assenta em cinco constatações. A primeira, diz, incide no facto de a estrutura jurídica montada pela EDP não corresponder a uma operação de reestruturação enquadrável, nem na letra “nem na finalidade que a lei fiscal estabelece para a aplicação dos benefícios fiscais à reestruturação de empresas”. No segundo ponto constata que “nenhuma lei cria, nem podia criar, benefícios fiscais para a criação de empresas com morte previamente anunciada, pelo seu próprio criador, para alguns meses depois”. Como terceira constatação dá conta de que a criação desta empresa (designada Camirengia) não tem qualquer racionalidade económica, como as partes do negócio escrevem em vários documentos, pelo que parece ter tido como objetivo exclusivo eludir o pagamento de impostos, o que pode constituir crime de fraude fiscal”.

No penúltimo argumento sinaliza que “são abundantes as provas de que as partes sempre acertaram que o negócio consistia na transmissão, da EDP para a Movhera I [a nova concessionária das seis bagagens transmontana], dos estabelecimentos industriais compostos pelas seis barragens. E acaba realçando como quinta constatação que “os edifícios e construções das barragens eram, desde sempre, propriedade da EDP, que os tinha inscritos no seu balanço como sendo deles titular, e como consta dos contratos de concessões e de todas as suas adendas. Esses bens foram transmitidos duas vezes neste negócio primeiro por ela própria para a Camirengia e depois para a Movhera I”.

O MCTM prossegue aqui que se trata de bens do domínio público, pelo que essas transmissões são nulas, porque esses bens são, por natureza, “insuscetíveis de Transmissão”. Frisa também que se a transmissão da sua titularidade é legítima, então estão desde sempre sujeitas ao IMI e a sua transmissão está sujeita ao IMT.

“Todos estes impostos deveriam ter sido acautelados pelo Estado, como condição de autorização para a realização do negócio. Incompreensivelmente não o foram”, acrescenta, considerando que “é também incompreensível” a declaração do ministro do Ambiente, acompanhado do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, no dia 28 de dezembro de 2020,  Miranda do Douro, de que o negócio não estava sujeito ao IMT nem ao Imposto do Selo e que as edificações das barragens não estão sujeitas ao IMI.

“São ainda dificilmente compreensíveis a anulação da liquidação do IMI sobre a~ barragem de Bemposta por uma decisão arbitral erroneamente fundamentada e as variações de entendimento da administração tributária durante a pendência do processo sobre esta e outras matérias relevantes”, realça.

Por estes factos, e por muitos outros, diz o Movimento, é lançado “o apela a todas as instituições do Estado Português competentes na aplicação da lei, de controlo da legalidade e da prossecução do Interesse Público, que intervenham no sentido da realização do Direito neste cas, reafirmando o “seu caráter construtivo e colaborativo na defesa dos interesses legítimos da Terra de Miranda e de Portugal”.

 

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