O regime islâmico xiita do Irão enfrenta desde setembro passado uma agitação social generalizada e sem precedentes desde que Mahsa Amini morreu às mãos da polícia de costumes. A Prémio Nobel da Paz de 2003, a advogada e ex-juíza iraniana Shirin Ebadi, considera, em entrevista à agência “Reuters”, que a contestação criou um “processo revolucionário” de que acabará por resultar o fim do regime dos aiatolas.
A reação aos protestos não podia ser mais dura: as autoridades proferiram dezenas de sentenças de morte e realizaram pelo menos quatro enforcamentos públicos. Mas nada disso tem sido suficiente para calar os protestos, que se alargaram às principais cidades do país depois de terem começado em Teerão, a capital.
Profundamente crítica do regime que governa o Irão desde a revolução islâmica em 1979, Shirin Ebadi tem sido uma das vozes mais audíveis do apoio às manifestações antigovernamentais, que apesar da barbárie que enfrentam continuam comprometidos com a mudança do regime.
Shirin Ebadi acredita que a atual onda de protestos tem sido o desafio mais ousado à legitimidade do establishment desde 1979. “Este processo revolucionário é como um comboio que não vai parar até chegar ao seu destino final”, disse a atual exilada em Londres (desde 2009).
A morte de Amini despoletou anos de raiva instalada entre muitos iranianos sobre questões que vão desde a miséria económica e a discriminação contra minorias étnicas, até ao endurecimento das restrições sociais e políticas.
Evidentemente que os protestos diminuíram consideravelmente desde os enforcamentos públicos e atualmente estão limitados principalmente às regiões onde o sunismo prepondera sobre o xiismo.
Mas, para Shiri Ebadi, o uso de violência mortal pelo Estado aprofundará a raiva sentida pelos iranianos. “Os protestos tomaram uma forma diferente, mas não terminaram”, disse.
E a prémio Nobel não se esqueceu de pedir o que pode ser o contributo externo no apoio aos manifestantes: Ebadi disse que o Ocidente deve tomar “medidas práticas” de apoio, como afrouxar ainda mais os laços políticos e diplomáticos com o Irão, chamando os seus embaixadores em Teerão. E deve evitar também chegar a qualquer acordo com o regime da república islâmica, incluindo o reavivar do Acordo Nuclear de 2015 – que é alvo de negociações (nunca oficialmente suspensas) em Viena, capital da Áustria.
O grupo de direitos humanos HRANA informou entretanto que, até à data, pelos 527 manifestantes foram mortos durante os distúrbios, incluindo 71 menores e pelo menos 70 membros das forças de segurança. O grupo acredita-se que mais de 19 mil manifestantes tenham sido presos.