[weglot_switcher]

Notícias sobre a morte do carvão ainda são exageradas

O uso do carvão para a produção de eletricidade está a acabar em Portugal e em declínio no mundo ocidental, mas vai voltar a aumentar na Ásia.
9 Maio 2021, 11h00

O ano de 2021 vai ficar registado na história do mercado de energia português como aquele em que foi colocado um ponto final na produção de eletricidade a partir do carvão, 36 anos depois de as duas centrais que ainda subsistiam terem iniciado a atividade. A EDP antecipou o encerramento da Central Termoelétrica de Sines para 15 de janeiro e a Central Termoelétrica do Pego será encerrada no final de novembro, aprofundando uma tendência que se verificava, porque o consumo de eletricidade produzida a partir do carvão já tinha caído 58% no ano passado, face a 2019, em Portugal, seguindo a evolução verificada no mundo ocidental.

Em termos globais, o ano passado foi, também, de redução no uso do carvão para a produção de eletricidade, com a descida registada pela Agência de Internacional de Energia (AIE) a atingir 4%, empurrada pelas economias mais desenvolvidas, onde a quebra atingiu os 15%. A menor procura de eletricidade fez com que o carvão perdesse peso no mix energético, em favor das energias renováveis e do gás, que beneficiou de preços baixos. Este ano já será diferente e a AIE refere, no relatório divulgado em abril, a procura por carvão registou já uma forte recuperação, no primeiro trimestre de 2021, “revertendo todas as quebras de 2020”, puxada pelo Oriente, com a China a chamar a si mais de metade do aumento global previsto de 4,5%, enquanto as economias ocidentais deverão recuperar apenas um quarto das perdas verificadas em 2020. Ou seja, dois mundos diferentes, com necessidades e evoluções distintas.

“A transição energética tem de ser considerada como um movimento global, mas temos ainda duas realidades distintas: a dos países desenvolvidos, que a lideram, pois resulta de políticas para o sector de energia, com especial foco no aumento de fontes renováveis para a geração de eletricidade, e a dos países onde o consumo final está ainda muito concentrado em combustíveis fósseis [derivados de petróleo, gás natural e carvão]”, afirma Mónica Carneiro Pacheco, sócia da sociedade de advogados CMS Rui Pena & Arnaut, em declarações ao Jornal Económico (JE).

Ao aumento do consumo verificado na China, junta-se o da Índia, para quem a AIE antevê uma subida da procura de carvão de quase 9%, este ano, ultrapassando em 1,9% os níveis de 2019 e sucedendo a um ano de 2020 que marcou “o ponto mais baixo de consumo de carvão em muitos anos”, fruto do abrandamento económico e das limitações impostas pelo combate à pandemia.

“Embora a China e a Índia contem com uma elevada participação dos combustíveis fósseis na matriz energética e estejam atrasados na integração das renováveis, em comparação com os países mais desenvolvidos, a verdade é que a China tem mostrado um forte compromisso para a redução de emissões e há diversos planos para o aumento de fontes renováveis”, aponta Mónica Carneiro Pacheco. A AIE também reconhece o crescimento da produção de energias renováveis na China. “A China ainda irá aumentar o seu consumo de carvão nos próximos anos [estima-se o pico para 2025, que será também o pico global da procura combustível] e, em simultâneo, é a região do globo em que mais se investe em energias renováveis”, aponta Bruno Morais Marques, associate partner da Deloitte, ao JE.

Pedro Subtil, partner da consultora EY e Energy Segment Leader sustenta que “o continente asiático irá continuar a consumir carvão, devido à sua incapacidade de substituir integralmente as energias com origem fóssil por renováveis, mas irá investir cada vez mais em energias verdes”. Tendo definido um prazo mais alargado para atingir a neutralidade carbónica [a China planeia atingir esta meta em 2060, e a Índia está a considerar antecipar o objetivo, em linha com a União Europeia e EUA para 2050], estes países têm desenvolvido um conjunto de investimentos em diferentes áreas das renováveis”. E exemplifica: “A Índia tem uma capacidade solar instalada de 35 GW, que pretende aumentar para 510 GW em 2030, e que já que já gerou tarifas recorde mínimas em leilões. A China comunicou recentemente que pretende aumentar a capacidade combinada de geração de energia eólica e solar, para pelo menos 1.200 GW, o que irá reforçar a sua liderança global em ambas as energias”.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.