Sempre tive um enorme apreço pela figura pública de Cristiano Ronaldo. Sem alguma vez o ter conhecido pessoalmente, sempre lhe admirei as virtudes como profissional de futebol e a capacidade, como homem, de se construir a si próprio. Refiro-me às suas qualidades como profissional de futebol, as naturais são para mim as menos importantes. Nasce-se com o talento mas, o restante, depende de nós, do nosso carácter e força de vontade.

E Cristiano sempre demonstrou qualidades excecionais, hoje tão raras na nossa sociedade. A capacidade de liderança, em particular nos momento difíceis ou nos momentos de mudança, a ética de trabalho, o foco e concentração absoluta no esforço de se melhorar e de melhorar os que com ele trabalham, a estratégia que delineou para a sua carreira e a forma como se mantém orientado por um conjunto de eixos dessa estratégia e, sobretudo, a capacidade de fazer tudo isso em simultâneo com a criação da sua própria família, da gestão de uma persona pública de enorme sucesso comunicacional e fazer tudo mantendo-se íntegro e uno com a sua personalidade.

Cristiano é, em todos os aspetos da sua vida, um Alfa. Um líder, no que isso tem de assunção de responsabilidades, individuais e coletivas, de exemplo para os restantes que com ele trabalham e coabitam. Ao longo da sua longa carreira assistimos, por diversas vezes, a episódios de coragem em que deu a cara por terceiros, colegas e família, protegendo e cuidando dos seus.

Claro que as virtudes não são o único lado da moeda. Os defeitos ou características menos positivas devem estar presentes. Contudo, o que sempre testemunhei foi que os seus principais defeitos correspondem ao excesso de alguma das suas virtudes.

O gosto pelo luxo, por alguns brinquedos caros, uma certa vaidade na sua apresentação e um estilo de vida algo vistoso nunca lhe retiraram o foco do que tinha de fazer. E isto tudo num homem jovem, de origens muito humildes, e verdadeiramente sem grandes mentores. Não são, no entanto, os seus pecadilhos que o tornam invejado alvo da intriga e da má-língua. São as suas virtudes que causam esse efeito.

Numa sociedade caracterizada pelo triunfo do acessório, do momentâneo, do especulativo, em que a inveja e a mediocridade grassam, é fácil perceber a razão de algumas e tão acintosas críticas.

Acresce que este não é o tempo social para os Alfas. Ser homem, confiante, assertivo e de pensamento e voz independentes, numa sociedade dominada comunicacionalmente por um discurso em tudo contrário, não é hoje em dia fácil. Mas o Cristiano, está neste momento a enfrentar um momento particular na sua carreira e na sua vida. Um momento de mudança.

Essa mudança ocorre pelo decurso da própria vida, em particular da sua vida profissional que desliza para o ocaso. Como esperava, também aqui Cristiano revela as suas qualidades demonstrando toda a sua resiliência e foco na prossecução do seu objetivo de ser o melhor profissional possível.

A gestão da mudança é dos principais desafios que enfrentamos na vida, seja ela exógena ou endógena, pois embora seja uma constante na vida, existem momentos de aceleração que exigem o máximo das nossas qualidades. Esses processos acelerados exigem conhecimento do espaço onde  nos movemos, noção das nossas vulnerabilidades, perceção e avaliação das ameaças, capacidade de pensar estrategicamente e não ceder a impulsos de natureza tática, e ainda características sólidas de liderança.

Cristiano Ronaldo é um homem que já demonstrou ter essas qualidades na quantidade necessária. No entanto, não pode, nem deve esquecer-se dos padrões negativos da sociedade que o envolve, do peso da mediocridade e da inveja.

Não pode esquecer-se que, nesta sociedade informacional que privilegia o momentâneo e o acessório, que privilegia o parecer sobre o ser, que confunde e deturpa valores – o espírito protetor é normalmente confundido com controlo, a assertividade com vaidade, a liderança e a capacidade de decisão com autoritarismo ou com vontade de protagonismo – não terá quaisquer facilidades ou proteção relativamente a eventuais erros ou insucessos.

Esse é também o preço de ser um Alfa numa sociedade em que, infelizmente, pululam os Ómegas e na qual o que foi feito ou que se construiu ao longo da vida, no caso do Cristiano uma extraordinária carreira individual e coletiva, pode ser facilmente colocado em causa por aspetos menores.

O tempo fará com que Cristiano seja reconhecido claramente como um dos maiores de sempre e valorizará as incomparáveis estatísticas de carreira, mas o presente, no que diz respeito ao final, que pessoalmente espero longo, da sua vida de futebolista, temo que seja conturbado e sem tréguas. Seja como for, Cristiano é um Alfa capaz de enfrentar tudo isso e mais.