Ocorreu de forma tão abrupta quanto esperada, a apresentação da recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa à presidência da República. Esperada, óbvia e na linha de todos os anteriores presidentes em democracia, todos candidatos a segundo mandato e todos reeleitos à primeira volta, desde os 52% de Cavaco aos 70% de Mário Soares.

Se é certo que os presidentes não sofrem do desgaste governativo, nem todos conseguem ser tão populares ou transversais que concitem um apoio tão singular como Soares teve e Marcelo registou. A pandemia e uma relação próxima com António Costa contribuíram para uma redução da popularidade – além do excesso de exposição pública e pouco resguardo, que se manteve durante todo o mandato, que cansou de afetos num primeiro momento e que deu cobertura a mais ao Governo na parte final.

As presidenciais não têm uma leitura partidária, mas ninguém duvida que as análises aos resultados produzirão efeitos colaterais, mais nos extremos do que no centro, com uma incidência particular numa adivinhada viragem à esquerda do PS, inspirada na opção espanhola se esta tiver sucesso. Apesar de se esperar das principais figuras socialistas que venham a apoiar Marcelo, a sombra da coabitação Soares/Cavaco irá estar presente na campanha, introduzida por Ana Gomes, ciosa de penetrar no eleitorado socialista.

Ventura pode não ter o resultado que deseja e menos ainda o proclamado segundo lugar – mas deixará à distância o candidato liberal, demasiado cinzento para se dar por ele. Riscos reais corre a esquerda mais radical, com Marisa a perder terreno, tal como João Ferreira que tenta amarrar o eleitorado do PCP e manter o discurso comunista presente.

A ideologia marcará muito pouco a campanha, que será uma luta feroz contra a abstenção e constituirá um desfilar de provocações ao atual titular, com marcação pessoal na tentativa de chegar à dezena percentual e todos a uma distância estonteante do recandidato presidencial.

A circunstância de todos os presidentes em exercício terem sido reeleitos com facilidade e sempre à primeira volta, constitui o melhor indicador para, na próxima revisão constitucional, alterar a duração do mandato presidencial, evoluindo para um mandato único de 7 anos, mantendo-se a legitimidade eleitoral do titular, mas travando acusações de transfiguração política em segundo mandato. Tal garantiria uma maior independência de Chefe de Estado sem agendas partidárias escondidas ou intenções ocultas.

Marcelo foi exemplar neste mandato, correspondendo às expectativas iniciais, mostrou proximidade, não se envolveu na governação sem permitir desproporcionalidades partidárias, aventuras à esquerda ou desvarios à direita.

Marcelo foi contraponto, porque não tem de ser oposição. Com isso criou anticorpos na sua família política, que não compreendeu o papel de moderador que um PR tem de assumir, principalmente quando a maioria tem uma origem diferente.

Resolvido o tabu, começa a campanha. De ataques de baixo nível, em vez de escrutínio e esclarecimento. Felizmente de curto prazo, para nos dedicarmos a endireitar o país.