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O fim do desastre

O PSD precisa de se organizar rapidamente, até porque o líder que se segue pode muito bem não ser de transição como todos achávamos, após o inequívoco aviso de Marcelo na tomada de posse do Governo. Se Costa sair para Presidente do Conselho Europeu a meio de 2024, o governo cai.
7 Abril 2022, 07h15

Quando, no início de janeiro de 2018, Rui Rio assumiu a liderança do PSD, o partido atravessava um momento de indefinição no seu posicionamento político e estratégico. Depois de mais uma missão patriótica, consubstanciada nos mais difíceis quatro anos e três meses da democracia portuguesa (pós período revolucionário), o partido de Sá Carneiro via-se na ingrata posição de, tendo conseguido ganhar as eleições, não obstante as medidas impopulares que teve de tomar, algumas delas em contracorrente com o projeto político que tinha para Portugal (que preconizava menores taxas tributárias, maior base tributária) como o aumento de impostos, viu-se atirado para a oposição como consequência de uma coligação negativa formada por partidos de esquerda, que se odeiam entre si, mas que demonstraram naquele momento ter um ódio ainda superior pelos preceitos e tradições democráticas.

Pior, Passos teve de assistir ao colher por outrem dos frutos que plantou, suportando uma propaganda fandanga alicerçada em pressupostos e justificações macroeconómicas totalmente ultrapassadas, como a de que a aceleração da devolução de rendimentos era a responsável pelo crescimento económico que, aliás, já se iniciara nos dois últimos exercícios do seu mandato (2014 e 2015), e não na revolução Schumpeteriana que o tecido económico português teve de enfrentar durante aquele duro processo.

Passos teve o pecadilho de não perceber que “o que não tem remédio, remediado está”. Esperar pela queda de um Governo cujas variáveis jogavam todas a favor, foi o seu maior erro político, em mais de 30 anos de atividade pública. E, obviamente , ele não era a pessoa indicada para ser o rosto da oposição,  até pelo seu perfil eminentemente mais executivo.

Na ressaca da derrota de 2017, o PSD viu-se a braços com uma crise de sucessão, fazendo lembrar as mudanças dinásticas da idade média e do renascimento portugueses. Ninguém que realmente corporizasse o futuro do centro-direita quis enfrentar um Governo socialista no auge da sua popularidade, tendo-se apresentado a jogo dois sessentões em momento de indefinição da sua carreira política. Acabou por ganhar Rui Rio, um ex-autarca com uma aura de seriedade, que prometeu dar “um banho de ética” à política portuguesa. Uma proclamação que não foi de circunstância, pois já a havia referido em 2015, voltando a sublinha-la no final de 2018.

A verdade é que, tendo-se remetido a um profundo e doloroso silêncio entre janeiro e fevereiro de 2018, logo após a sua eleição, deixando a oposição ao governo socialista totalmente à deriva, Rio mostrou ao que vinha. Tudo aquilo que é a lógica partidária foi subvertida. E quem considerava que isso era necessariamente bom, percebeu imediatamente que a arquitetura e geometria políticas existem como resultado de décadas de práxis, e que há sempre espaço para fazer pior.

Rio somou às anteriores indefinições que encontrou (posicionamento político e estratégico) as de natureza ideológica, orgânica e até de militância. Como resultado surgiram mais dois novos partidos no espaço à direita do PSD, construídos na sua vasta maioria por ex-militantes laranjas, ávidos por ocupar uma área no espectro político que Rio sucessivamente repudiou. Assim como também repudiou quem o criticava, abrindo a porta de saída a todos aqueles que verbalizavam o óbvio: Que a sua liderança iria provocar a fragmentação do centro-direita e da direita políticas, originando a que, no futuro, fosse impossível ao PSD obter sozinho maiorias absolutas e, pior, transformando o então maior partido português, da classe média, dos pequenos empresários, dos profissionais qualificados e liberais, numa oferta eleitoral ruralizada, ultraconservadora, estagnada.

Rio optou por uma liderança centralizada em si próprio, pouco programada, baseada essencialmente em “feelings” pessoais. Eu não sou daqueles que desmerece a argúcia política, marca d’água dos líderes carismáticos. E mesmo esses, aqueles que além de serem carismáticos são também grandes líderes (pois não são forçosamente sinónimos) seguem uma metodologia profissional, programada, estruturada. Mas nada pode ser mais constrangedor e desastroso do que alguém que não tem o “toque churchilliano” achar que o tem, e depositar toda a sua ação política nessa premissa.

Não vos vou maçar com os continuados episódios de desastre político por parte de Rio, de que a perda da deputada pelo círculo da Europa foi a cereja no topo do bolo.

O PSD precisa de se organizar rapidamente, até porque o líder que se segue pode muito bem não ser de transição como todos achávamos, após o inequívoco aviso de Marcelo na tomada de posse do Governo. Se Costa sair para Presidente do Conselho Europeu a meio de 2024, o governo cai.

Pensam os meus amigos “mas Costa não vai deixar cair o seu governo, pois priorizará o interesse do partido e do país à frente da sua carreira política”. Devo relembrar que Costa, fazendo tábua rasa dos preceitos e tradição democrática portuguesas, abrindo uma caixa de pandora que já originou a inclusão do CHEGA no Governo do Açores, e desconfiando nós que o pior ainda pode estar para vir no que concerne a coligações negativas, transformou o seu estatuto de demissionário secretário geral do PS em primeiro Ministro, priorizando exclusivamente o seu interesse pessoal? Os próximos dois anos serão divertidos, felizmente sem Rio.

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