1. O caso Francisco Ramos explica como ‘isto’ funciona.

O homem chamado à enorme responsabilidade de dirigir a task force da vacinação portuguesa anti-Covid ainda tinha tempo para ser presidente da comissão executiva do Hospital da Cruz Vermelha.

Como responsável deste hospital mostrou que os ‘erros’ (assim se diz agora…) que estão a ser cometidos pelo país fora são um padrão. Os abusos e a incompetência (continuo a gostar mais das palavras antigas) da vacinação rebentaram-lhe à ilharga – e ele, muito admiravelmente, decidiu: mantém-se na Cruz Vermelha, onde está a causa próxima da demissão, e livra-se do escrutínio mais permanente que implicava a missão nacional! Perante isto, o sistema derrete-se em elogios ao caráter e ao desapego do velho operacional. É mais um belo instantâneo de como funciona a rede dos partidos na proteção dos seus.

2. Convém dizer que as irregularidades anteriores em todo o sistema já eram bem comprovativas da forma como Francisco Ramos vogou sobre a missão.

Ele viu vacinar o pessoal de uma pastelaria porque sobravam (?) doses e os responsáveis não sabiam (?) o que fazer. Ele viu caciques a entrarem na fila e a fazerem tábua-rasa das prioridades nacionais.

Na sequência, ele teve o desplante de ir a um canal de televisão e, travestido de educador político, identificar a normal indignação das pessoas como sinónimo de terem votado no Chega. E, depois disto tudo, que já seria suficiente para entrar no mais rigoroso confinamento, ainda conseguiu sair oficialmente pelo próprio pé e decidir onde ficar.

É extraordinário.

3. Este caso encerra a lição de que o Governo português, seja ele qual for mas o PS tem elevado os requintes da arte, continua imperturbável na mesma lógica. Há uma vaga? Chama-se ‘um dos nossos’. O que é natural no campo político, tornou-se regra para tudo, até para as missões técnicas.

Entre o capaz e o capataz, venha o partido e escolha. E assim se passam os dias, de miséria em miséria, sempre à espera de uma mudança que não chega.

4. Não conheço Francisco Ramos e não quero ser injusto para além da apreciação que faço, dura, deste caso. O cidadão tem uma comenda, é Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique , exerceu vários cargos, esteve em governos socialistas e exerceu consultorias pelo mundo. Terá as suas competências na gestão hospitalar e da saúde. Dizem-me que deixou bom serviço em algumas entidades.

O problema está, neste caso concreto, nos contornos da situação, boa fotocópia de uma realidade já bem documentada.

Francisco Ramos falhou mas o que fez o Governo está à vista: nomeou por confiança político-partidária, perante as evidências retira o fardo, mantém o emprego (na Cruz Vermelha). O militante também poderia ter saído deste e entrado noutro já a seguir. Seria uma alternativa.

E é o sistema.

Quanto à solução, é a habitual por cá: na emergência, avançam os militares. Boa sorte Almirante Gouveia e Melo.