Desatado o nó no Conselho Europeu extraordinário, Portugal espera vir a receber um envelope financeiro de quase 60 mil milhões de euros para alavancar a recuperação económica do país. A grandeza dos números, bem como o momento particularmente delicado que vive a economia portuguesa, aumentam a nossa responsabilidade de aplicar bem o novo pacote comunitário.

É fundamental não só evitar os erros do passado (falta de estratégia, deficiente planeamento, pouca capacidade de execução, burocracia no acesso aos fundos, desperdício de recursos, etc.), como reinventar o nosso modelo de desenvolvimento a partir das premissas definidas pela UE: transformação digital, reindustrialização, transição energética e qualificação humana.

As empresas têm necessariamente de estar no centro deste processo de reinvenção do modelo de desenvolvimento, enquanto “motor real do crescimento e da criação de riqueza”, como é dito no Plano de Recuperação Económica e Social 2020-2030 gizado por António Costa Silva. Acontece, porém, que as PME, que representam mais de 95% do tecido empresarial português e mais de 75% do emprego nacional, são pouco eficientes na aplicação dos fundos estruturais da UE, como conclui um estudo recente da Coimbra Business School.

O estudo diz que o país precisa de ser mais célere a investir os fundos, deve aumentar o número de startups apoiadas e as empresas têm de criar mais postos de trabalhos.

De resto, o país executa anualmente dois a três mil milhões de euros de fundos europeus e agora, com o novo pacote financeiro, terá de investir mais de 6.000 milhões de ajudas comunitárias por ano. Por aqui se percebe a magnitude do desafio que Portugal tem pela frente, sendo certo que, após a pandemia de Covid-19, o nosso tecido económico e social estará mais enfraquecido e, por isso, menos capaz para investir e reformar.

Justifica-se, pois, um “pacto Estado/empresas” como defende António Costa Silva, de forma a garantir que o tecido empresarial, que será o principal catalisador da recuperação económica do país, tenha capacidade de executar de forma eficiente os fundos europeus que vão estar ao seu dispor. Parece-me curial que, no âmbito deste pacto, o Estado condicione o apoio às empresas ao cumprimento de determinados pressupostos (melhor gestão, produtos mais rentáveis, criação de emprego, digitalização, sustentabilidade, etc.), desde que haja reais contrapartidas para quem investe.

Ou seja, o Estado deve, também ele, fazer um esforço para ser mais eficiente na gestão dos fundos dirigidos às empresas (menos burocracia e mais celeridade, transparência e equidade na máquina administrativa) e para criar um melhor ambiente de negócios (baixa fiscalidade, menores custos de contexto, boas infraestruturas, formação profissional, simplificação administrativa, apoios à inovação, etc.).

Entendo o “pacto Estado/empresas” numa perspetiva alargada, em que sejam também incluídas as universidades, os centros de I&D, as associações empresariais e os demais parceiros sociais. Temos de criar massa crítica para executar com eficiência, rapidez e qualidade as verbas provenientes do Fundo de Recuperação europeu e do novo Quadro Financeiro Plurianual.

Mas, para mobilizar as forças mais dinâmicas e inovadoras do país, é necessária uma estratégia de desenvolvimento que gere consenso social e convergência política. O plano de António Costa Silva é um bom começo, importa agora trazê-lo à discussão pública e complementá-lo com propostas dos vários sectores da sociedade.