A vitória expressiva de Isabel Días Ayuso nas eleições para a Comunidad de Madrid prenuncia uma mudança de ciclo político no governo de Espanha, como se deduz de uma recente sondagem publicada pelo diário El Mundo, que atribui ao PP 30% dos votos, à frente do PSOE, ao qual conquista cerca de meio milhão de votos.

Os populares parecem ter chegado ao termo da travessia do deserto a que foram condenados pelo envolvimento de membros seus em escândalos de corrupção e de financiamento ilegal do partido, decisivos para o seu afastamento do poder. As perdas eleitorais dos populares foram, aliás, um perfeito exemplo dos efeitos corrosivos da corrupção na democracia, pois a Espanha viu-se por alguns anos privada de uma alternativa de centro-direita, tanto mais necessária quando no poder se instalou uma frente esquerdista.

Ao triunfo popular em Madrid correspondeu uma derrota histórica dos socialistas e a frustração dos intentos do Podemos, que jogou nestas eleições a sua cartada mais alta, não logrando um resultado que viabilizasse uma maioria de esquerda bloqueadora do governo de Díaz Ayuso, o que a tentaria a procurar apoio no Vox, contra a posição de princípio de Pablo Casado, que recusa uma aproximação à direita radical, criando uma previsível cizânia no PP.

A derrota da esquerda explica-se, em parte, pelo ambiente de crise gerado pela pandemia, agravado pela má gestão da resposta à doença. Porém, não menos importante será o cansaço causado por uma política de confrontação ideológica em que o actual Governo se empenhou, dividindo os espanhóis, o que desagradou inclusivamente muitos socialistas que, confiados no compromisso do seu secretário-geral de não se coligar com a extrema-esquerda, se viram enganados.

Com empenho revolucionário, o Governo esquerdista atingiu a Monarquia, tornando-se na única democracia a condenar ao exílio um antigo chefe de Estado sobre o qual não impende qualquer acusação, a Igreja Católica, afectada pelo ataque ao ensino concertado, modelo misto de iniciativa privada com apoios públicos, e a unidade nacional, negociando com os partidos nacionalistas com assento parlamentar, fazendo uso da Lei de Memória Histórica não para uma reflexão serena sobre o passado, mas para um ajuste de contas, retirando ao espanhol a sua condição de língua oficial do Estado ou mostrando tibieza face aos separatismos.

Os espanhóis revelam cansaço desta batalha ideologicamente motivada, cujo fim é enterrar os compromissos da transição democrática, que não apenas distrai o país dos muitos problemas que enfrenta, mas também enfraquece a coesão necessária para os superar. No fundo, o que os nossos vizinhos pretendem é o retorno à normalidade, à Espanha das décadas de 80 e 90: democrática, plural, em crescimento e reconciliada consigo mesma. Já perceberam que não o conseguirão pela mão de Pedro Sánchez.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.