Não. Claro que não. O Reino Unido não resolveu todos os seus problemas no dia 1 de Fevereiro de 2020.

No dia 31 de janeiro de 2020, depois das 23:00 horas (GMT) o Reino Unido (RU) deixou oficialmente de fazer parte da União Europeia (UE).

Na madrugada de 24 de Junho de 2016, quando acordei em Budapeste, dois dias depois daquele jogo empolgante da selecção portuguesa contra a húngara no Europeu de futebol, já o dia anterior tinha levado os britânicos às urnas. Sabia-se que os resultados seriam muito próximos.

Mas quem adormeceu no dia 23 ainda não sabia que os resultados finais seriam 52% a favor de deixar a UE e 48% para permanecer na União. Foi isso que constatei quando acordei por volta das cinco da manhã para me dirigir ao aeroporto. Na altura morava em Londres, mas não estava de regresso. Voei para Bruxelas, mais concretamente para uma conferência da Associação Europeia de Ciência Política.

Imagine-se, não só eu voltava para o centro da UE, como iria passar os dias seguintes com colegas a discutir assuntos políticos. Muitos  destes meus colegas são especialistas em assuntos europeus e britânicos, eu não, pelo que esperava ansiosamente por estes dias.

O Reino Unido tinha-se juntado à Comunidade Económica Europeia em 1973 e foi o primeiro a sair da União. Depois da sua saída ainda muito há para ser tratado. Estes processos não são “um passeio” e, pela novidade que enceta, ainda mais complexidade implicará. Em boa verdade, os termos gerais em que o RU sai da UE estão largamente definidos, mas há muitos detalhes por tratar. E talvez o mais importante seja exactamente como se definirá a relação futura entre o Reino e a União.

Existe um período de transição, cerca de 11 meses, mas pouco se sabe como se desenvolverão as negociações. Áreas como segurança e defesa, pesca, regulação de drogas etc., ainda estão por decidir, mas muitas mais estarão em cima da mesa.

Durante este período, ainda em 2020, o RU continuará a fazer parte do mercado único e haverá ainda livre circulação de pessoas e bens. Isto é, a maioria das coisas ainda se mantêm idênticas, mas alguns direitos políticos serão suspensos: os parlamentares do RU não poderão votar no Parlamento Europeu mas terão que seguir as regras da UE, e o Tribunal Europeu de Justiça continuará a ter jurisdição sobre assuntos legais que envolvam o RU até ao final do processo de transição, pelo menos. Também viagens, passaportes, assuntos de trabalho e comércio se manterão relativamente idênticos, estes últimos sem custos extra, por exemplo.

Naquele dia 24 de Junho de 2016, quando me encontrei com os meus colegas, esperava discussões acesas como as que ouvi ao longo dos meses que antecederam o referendo. Nada mais errado. Confrontei-me, sim, com uma tristeza generalizada, e mais profunda ainda no que toca aqueles que, tendo estudado durante anos estas realidades, acreditavam que a saída do Reino Unido da UE teria sérias e graves consequências.

Podia dizer-lhe que algumas pessoas choravam, mas isso não interessa para nada… Afinal, metade dos britânicos acreditam que hoje e daqui a um ano os seus problemas estarão resolvidos. Já a outra metade e muitos dos que lá vivem e trabalham não pensam assim.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.