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Offshores: Adiadas audições a Paulo Núncio e Paulo Ralha

Audições a ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos estavam marcadas para esta sexta-feira, 7 de abril. Mas foram desmarcadas depois de adiamento da audição da ex-ministra das Finanças prevista para esta terça-feira.
5 Abril 2017, 18h25

O ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF), Paulo Núncio, e o presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos (STI), Paulo Ralha, já não vão ser ouvidos a 7 de abril no Parlamento sobre novos factos no âmbito das transferências, sem análise pelo Fisco, de 10 mil milhões de euros para offshores entre 2011 e 2014. Paula Ralha confirmou ao Jornal Económico que já foi informado da  “desmarcação da audição” e que “não está agendada nova data”.

A desmarcação das audições a Núncio e Ralha, avançadas ao Jornal Económico por fonte parlamentar, surge depois de Maria Luís Albuquerque ter alegado “motivos pessoais” para adiar a audição que estava marcada para esta terça-feira obre o caso das transferências para offshores. Não está marcada nova data para a ida da ex-governante à comissão parlamentar de Orçamento e Finanças, após o requerimento do PS aprovado no início de março para que os ex-ministros das Finanças Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque fossem ouvidos com urgência a propósito das transferências ocultas ara paraísos fiscais. Recorde-se que na altura, o PSD propôs que as audições fossem realizadas após a divulgação do relatório da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) sobre o caso – o que só deverá acontecer em meados de abril, tendo os socialistas recusado a proposta.

Antes de ouvir o ex-SEAF e o presidente do STI, o PS pretende que seja realizado primeiro a audição de Maria Luís que esteve marcada e confirmada para 4 de abril às 16h, onde também seria abordado o tema relacionado com o ex-Banco Espírito Santo.

Na base desta audições, requeridas com “carácter de urgência” pelo PS,  estão suspeitas de “mão humana” na falha informática por parte de Paulo Ralha e ligações profissionais de Paulo Núncio enquanto advogado à petrolífera venezuelana, antes se assumir funções governativas, reveladas em primeira mão pelo Jornal Económico a 10 de março.

Na mesma edição, o Jornal Económico revelou também que a Petróleos de Venezuela é uma das empresas apontadas como responsável de parte significativa dos 7,8 mil milhões de euros que foram enviados, a partir do BES, para paraísos fiscais, entre 2012 e 2014.

O pedido, assinado por nove deputados socialistas, entre os quais João Galamba, João Paulo Correia e Eurico Brilhante Dias, surge após o Jornal Económico ter divulgado, a 10 de março, que o ex-SEAF é autor de um parecer à PDV Europe, quando trabalhava na sociedade de advogados Garrigues, entre 2008 e 2010, antes  de integrar o Governo de Pedro Passos Coelho (em junho de 2011).

Ligações profissionais à PDVSA e criação de empresas na Madeira

O parecer fiscal à Petróleos De Venezuela é relativo a pagamento de imposto do selo na domiciliação de um empréstimo de uma empresa na Madeira, sabe o Jornal Económico.

O ex-governante, especialista em Direito Fiscal, tornou-se, em 2008, sócio da sociedade de advogados Garrigues, uma das maiores sociedades de advogados da Europa continental. Confrontado com a existência deste parecer, Paulo Núncio não prestou declarações.

Já fonte oficial da Garrigues confirmou que, no período em que a PDV Europe foi cliente do escritório, “os serviços foram prestados por uma equipa na qual também estava integrado o Dr. Paulo Núncio”. O que ocorreu “desde 2008 até dezembro de 2010”, sendo que a partir desta data a relação que manteve com aquela entidade “cessou totalmente, não tendo conhecimento de qualquer operação realizada pela referida entidade”. A PDVSA contratou então outro escritório.

Já a 12 de março, o jornal Público avançou com novas ligações de Paulo Núncio a  paraísos fiscais, dando conta que Paulo Núncio foi, entre 1997 e 2007, advogado fiscalista da MLGTS Madeira Management & Investment SA, uma empresa do universo da sociedade de advogados Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, que continua a operar no Funchal e que prestava serviços de assessoria jurídica às empresas sediadas no Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM).

Segundo o Público, nessa época, era o responsável pelo escritório local da MLGTS e esteve ligado ao registo de cerca de 120 novas sociedades, numa altura em que zona franca madeirense funcionava também como praça financeira. Quando tutelou a AT, Núncio não deu ordem para que fossem publicados os dados referentes às transferências para offshores, mas nesses dados estavam também os benefícios fiscais concedidos a empresas do CINM. A existências de dúvidas relativas aos dados relativos à região autónoma  foi a única justificação formal dada pelo ex-SEAF ao ex-director do fisco Azevedo Pereira para não publicar os dados.

Na primeira audição, a 1 de março, Núncio indicou que a não publicação dos dados no Portal das Finanças se deveu ao facto de “ter dúvidas na altura se as devia publicar ou não”, tendo apontando que “a publicação de estatísticas não decorre de uma obrigação legal”.

O ex-governante justificou as dúvidas porque achou “que a publicação podia dar algum tipo de vantagem ao infrator”. Ou seja,  servir-lhes de “alerta relativamente ao nível e quantidade de informação que a administração fiscal dispunha sobre as transferências para paraísos fiscais e prejudicar o combate à fraude e evasão fiscal”.

Como segundo motivo, Paulo Núncio sinalizou a “segmentação da informação”, explicando que os dados estavam em bruto e “não distinguiam os vários tipos de operação”.  O ex-governante assumiu a responsabilidade política, tendo ilibado os ministros Vítor Gaspar e Maria Luís Albuquerque e insistiu no facto de a não divulgação das estatísticas não significar que os impostos devidos não tivessem sido cobrados.

Suspeitas de “mão humana” do presidente do STI

O presidente do STI defendeu, recentemente numa entrevista ao “i”, que a polémica das offshores partiu de mãos humanas, com ou sem dolo, e não de um erro informático.

Paulo Ralha afirmou que “nas transferências para offshores, os impostos já foram pagos, o problema é a origem do dinheiro”. E defendeu a existência que as transferências polémicas para paraísos fiscais não terão partido de um “erro informático” mas, sim, para um “erro humano, doloso ou não”.

“O que parece é que há um erro grosseiro, e esse erro grosseiro, pelas experiências existentes, não me parece que se deva apenas a um programa informático”, afirma Paulo Ralha, que diz que “a omissão destes dados começa a ser grave depois da tomada de posse de Brigas Afonso”, que esteve na direção da Autoridade Tributária entre 1 de julho de 2014 e 23 de março de 2015.

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