A partir de 25 de outubro, o spread das obrigações do Tesouro a dez anos face ao Bund alemão para a mesma maturidade começou a alargar. Embora partindo de níveis historicamente muito baixos, nos quais de resto permanece, a evolução desta medida de “risco país” coincidiu com o fracasso das negociações e respetiva rejeição parlamentar do Orçamento do Estado (OE) de 2022, pelo que seria tentador estabelecer uma relação de causa-efeito.

Dito de outra forma, a subida dos juros da dívida e do spread face à Alemanha resultariam da crise política em torno do OE 2022. Porém, isso não corresponde à realidade.

A evolução dos títulos soberanos de outros países, como Itália e Espanha, foi em tudo semelhante à da dívida portuguesa e isso explica-se porque a perceção de maior risco dos países periféricos está associada à subida dos juros em sim mesma. Ou seja, sendo países mais endividados, uma subida dos juros em mercado secundário tem um efeito que se autoalimenta: juros mais altos significam maior dificuldade em assegurar o serviço da dívida, o que faz aumentar o risco e, consequentemente, os juros.

A subida da inflação e, sobretudo, a expectativa de que o Banco Central Europeu (BCE) poderá começar a reduzir as compras de ativos traduzem-se em juros mais altos que, esses sim, fazem aumentar o risco país.

É claro que a crise política nacional é relevante e é nesse contexto que temos de interpretar as palavras de João Leão na quarta-feira, que referia não esperar um corte de rating pelas agências. Uma crise política duradoura poderá dificultar o acesso de Portugal aos novos fundos comunitários e implementação de projetos, prejudicando o crescimento económico e a sustentabilidade orçamental.

Para já, os investidores ainda não estão a ter isso em consideração e trata-se de um mercado onde a presença do BCE continua a ser o principal fator.